Por Albert Caballé Marimón |
Nos últimos dias foi noticiado que a US Navy está planejando seu próximo caça, e que o desenvolverá sem a colaboração da USAF. Como já é habitual, alguns setores da mídia que explora o assunto defesa alfinetaram o F-35, dando a entender que a US Navy vai substitui-lo por conta dos custos e problemas enfrentados pelo seu projeto.
O fato é que as forças armadas americanas começam a planejar suas próximas gerações de armamentos com muita antecedência – com muita antecedência mesmo –, e, tanto a USAF como a US Navy já estariam planejando a sua próxima geração de caças mesmo que o F-35 não existisse.
O que está sendo trabalhado, na verdade, é o planejamento de requisitos para um caça de sexta geração. Ao contrário do que certos veículos dão a entender, a decisão do próximo caça da US Navy não foi tomada agora, mas é um processo que teve início há vários anos atrás. Na realidade, US Navy publicou requerimentos para sua aeronave de 6ª geração pela primeira vez em junho de 2008, portanto há quase onze anos.
Mas o trabalho de planejar e definir os requisitos de uma nova geração de caças para a US Navy vai muito além da aeronave em si. Na realidade, não é simplesmente uma questão de definir qual será o próximo equipamento, mas de estudar quais serão as potenciais futuras ameaças, analisar cenários, avaliar tecnologias e revisar doutrinas.
Há vários anos a US Navy vem apoiando as guerras no Oriente Médio utilizando o poderio de sua frota para, basicamente, bombardear adversários que não contam com armamento de alta tecnologia. Neste cenário, há uma inquietação sobre se a sua capacidade de combater uma guerra de alto nível no mar e no ar poderia estar se deteriorando.
A US Navy vem se preocupando com o conceito de A2/AD (Anti-access/Area Denial, Anti-acesso/Negação de Área, em tradução livre), que, embora longe de ser algo novo, ganhou notoriedade na imprensa americana nos últimos anos por traduzir as iniciativas da China no Mar da China Meridional. A2/AD é a concepção moderna das antigas estratégias de negação de acesso de um território a adversários. Com o passar dos séculos, as táticas baseadas em fossos, muralhas e paliçadas evoluíram para armas guiadas que mantém inimigos à distância.
A US Navy, uma marinha de águas azuis com capacidade de projetar poder em qualquer parte do planeta, entendeu que precisa desenvolver estratégias para combater iniciativas A2/AD que possam representar uma ameaça à sua hegemonia. E para tanto considera que redes de comunicação são tão importantes quanto armamento avançado.
Consequentemente vem, há alguns anos, trabalhando no NIFC-CA, Naval Integrated Fire Control-Counter Air (Controle de Fogo Naval Integrado-Contra-ar, em tradução livre). As ideias centrais por trás do NIFC-CA são baseadas na consciência situacional e no compartilhamento de objetivos/alvos em rede com grande alcance.
Nesse conceito, cada vetor de um grupo de ataque (strike group) – seja aéreo, de superfície ou submerso – é conectado através de datalinks de forma que o comandante do grupo tenha a visão mais clara possível do teatro de operações.
O NIFC-CA força os planejadores a pensar tanto sobre as capacidades dos vetores individuais da ala aérea do porta-aviões quanto do grupo de ataque como um todo. Sob a ótica do NIFC-CA, o poder de fogo de um grupo de ataque deve ser considerado em seu conjunto.
Por exemplo, um alvo detectado a centenas de quilômetros de distância por um sensor – como por exemplo o F-35C ou o E-2D Hawkeye, – poderiam ser engajados cooperativamente por qualquer número de atacantes: um F-35C, um Super Hornet, um futuro caça ou futuros veículos não tripulados, todos disponíveis para o grupo de ataque a grandes distâncias. A aeronave atacante pode cooperar com embarcações de superfície e submarinos trabalhando em conjunto – via datalinks – coordenados pelo NIFC-CA. Compartilhar informações aumenta a eficácia de cada componente da rede, possibilitando que cada um enxergue e atue mais longe.
Como é óbvio, um caça de nova geração para a US Navy deve ser pensado e planejado com esse conceito em mente. Em maio de 2016, iniciou-se o processo de AOA (Analysis of Alternatives, Análise de Alternativas) para o caça – também conhecido como NGAD (Next Generation Air Dominance, Dominação Aérea de Próxima Geração, em tradução livre), que irá substituir o Super Hornet que será aposentado na década de 2030.
O estudo, inicialmente previsto para durar 18 meses, iria analisar aeronaves tripuladas, não tripuladas e opcionalmente tripuladas, tecnologias avançadas de propulsão, características de furtividade, armas avançadas, sensores e redes.
Em abril último, o Contra-Almirante Scott Conn, Diretor de Guerra Aérea da US Navy, informou numa audiência do subcomitê de forças aéreas e terrestres do congresso americano que a AOA será concluída em dois meses, ou seja, em junho próximo.
Conn afirmou que o estudo “informará as escolhas refletidas nos ciclos orçamentários futuros em termos do que temos que fazer para obter a letalidade que precisamos a um custo que podemos pagar”.
O novo caça, na verdade, não irá substituir o F-35, mas o Super-Hornet. É também óbvio que os requerimentos da US Navy são diferentes dos requerimentos da USAF; mas isso não significa que USAF e USN não irão compartilhar sistemas. Segundo informado por Angie Knappenberger (vice-diretora de guerra aérea da US Navy) na Navy League Sea-Air-Space Conference em abril passado, serão compartilhados sistemas de guerra eletrônica, radar, redes e sistemas de armas. Ela informou ainda que o novo caça da US Navy também deverá compartilhar sistemas com o F-35B e o F-35C.
Como se vê, o novo caça da US Navy não irá substituir o F-35, e muito menos será uma espécie de revival do F-14 Tomcat, conforme alguns parecem acreditar.
Assista ao vídeo 622 do CANAL ARTE DA GUERRA: Revelando o Jato F-35, Última Parte, com Ricardo Barbosa
*Imagem de capa: Lockheed-Martin F-35C Lightning II da US Navy sobrevoa a Baía de Chesapeake em em 11 de fevereiro de 2011 (Foto: US Navy/Lockheed Martin/Getty Images)
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Caro Albert! A integração de sistemas entre Equipamentos e FFAAs é crucial na guerra moderna seja ela simétrica ou assimétrica, a informação (e desinformação) é, acredito, o item mais importante para estratégias de guerra e combate, considerando que já exista uma forte “joint” entre as FFAAs. Digamos que com relação aos UAVs, ou VANTs, não seria frágil a centralização dos comandos/controladores humanos? A maioria dos drones tem programação de autonomia na missão de ataque em caso de repentina ausência de controladores humanos? Quais as alternativas?!? Automaticamente poderia o controle dos mesmos passar a ser do controlador de armas de uma aeronave/belonave envolvida nas operações?
Grande abraço.
Olá Jayme. Acredito que a tecnologia existente permita todas as opções que você apontou, resta saber quais serão os requisitos de fato da US Navy.Aguardemos o resultado do estudo, deve sair em junho. Obrigado pelo comentário!
Aguardemos, com a tecnologia Datalink já está disseminada, inclusive nas FFAAs Brasileiras, e no nosso caso espera-se integração entre as FFAAs. O caso norte-americano servirá de demonstrador. Aguardemos.
Com a tecnologia Datalink já está disseminada, inclusive nas FFAAs Brasileiras, e no nosso caso espera-se integração entre as FFAAs. O caso norte-americano servirá de demonstrador. Aguardemos.
Ótimo artigo!!!
Muito obrigado!
Republicou isso em OSROC7 – Segurança & Defesa.
Interessante que o céu é o limite com a convergência das tecnologias e seus empregos. Diria que o espaço agora é realmente o limite.
Os russos, mesmo que tardiamente em áreas como eletrônica, talvez por recursos, ou doutrina, já que conhecimento eles parecem não ter dificuldade, haja vista, dominam várias áreas e querendo ou não enviam satélites próprios, entre outras coisas. O S70 – Hunter é talvez o melhor exemplo.
Realmente o céu é o limite! Realmente os russos detém muita pesquisa e conhecimento. Os empecilhos são, a meu ver, apenas financeiros. Obrigado por comentar!