23 meses de guerra na Ucrânia

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Soldados ucranianos operam perto de Ugledar, Donetsk, em abril de 2023 (Muhammed Enes Yildirim/Agência Anadolu via Getty Images).

Soldados ucranianos operam perto de Ugledar, Donetsk, em abril de 2023 (Muhammed Enes Yildirim/Agência Anadolu via Getty Images).

Embora o impasse no campo de batalha favoreça Moscou e 2024 provavelmente venha a ser positivo para a Rússia em termos militares e políticos, o ano será complexo, com desafios e dificuldades para ambos os lados.


Introdução

Iniciada em 24 de fevereiro de 2022 após uma operação de ataque preventivo com invasão de vários eixos do território ucraniano por forças russas, a Guerra da Ucrânia se aproxima dos dois anos sem perspectiva de resolução diplomática ou acordo de paz que interrompa ou ao menos congele as hostilidades vigentes.

Após o fracasso tático e estratégico da ofensiva ucraniana deflagrada em 4 de junho de 2023, diante da degradação e deterioração de muitas unidades de combate e perdas substanciais de equipamentos, as forças ucranianas apoiadas diretamente pela OTAN se viram em um impasse operacional, perdendo iniciativa e passando a uma estratégia defensiva e de desgaste às forças russas, que retomaram a iniciativa operacional ofensiva em vários eixos, com sucessos táticos variáveis e pontuais.

As necessidades das forças ucranianas por recursos humanos e sistemas de armas e munições são crescentes, levando à mobilização geral de vários segmentos da sociedade, dentre as quais mulheres, homens até 65 anos de idade e deficientes físicos e mentais de classificação 2 e 3 conforme legislação recentemente aprovada no parlamento ucraniano (Rada).

A Rússia ainda prioriza uma estratégia de guerra de desgaste e de atrito avançado, com economia de forças (em torno de 462 mil combatentes no teatro de operações de acordo com a inteligência ucraniana), ao passo que a Ucrânia detém cerca de 836 mil pessoas em armas, muitas delas recrutadas compulsoriamente e com problemas de treinamento e capacitação para o combate.

Apesar da situação estrategicamente favorável à Federação Russa, problemas operacionais persistem, notadamente de comando e coordenação de forças, abastecimento de sistemas de guerra eletrônica em alguns setores e táticas mal executadas que levaram a perdas significativas.

Este ensaio fará avaliações por tópicos de desenvolvimentos do teatro de operações, com análise dos aspectos tático-operacionais em relevantes setores do perímetro operacional, tendências estratégicas e desafios específicos de cada força beligerante.

Para este estudo foram utilizadas fontes abertas na internet mediante técnica de filtros de open source research, informações colhidas pelo autor diretamente de fontes humanas envolvidas direta e indiretamente no teatro de operações e análises de think tanks com informações críveis pela historicidade de análise, ressaltando-se que é impossível uma precisão factual absoluta diante da complexidade do conflito, vieses informacionais inerentes às operações de guerra psicológica, bem como opacidade de detalhes próprios de um conflito de alta intensidade.

Uso maciço de drones FPV pelas forças beligerantes

Ambas as forças beligerantes estão usando maciçamente em todo teatro de operações drones do tipo FPV (first person vision), que dá a um único operador a dimensão da trajetória, controle de orientação e visão de ataque.

Tais táticas improvisadas a partir de drones comerciais e baratos que lançam granadas de mão ou antitanque de 3-5 kg têm infligido consideráveis danos a grupos táticos de assalto de ambas as forças em conflito.

Especificamente nas margens direita e esquerda do Dnieper, são bastante comuns o emprego dos drones FPV, com derrotas de pelotões inteiros sendo documentadas em vídeos, impedindo progressão eficaz no terreno e consolidação de posições tanto por forças russas quanto ucranianas.

Diante das dificuldades relatadas, canais militares russos têm reclamado sobre a necessidade de maior eficiência e fluxo de abastecimento de sistemas antidrones com contramedidas específicas que neutralizam o voo destes vetores.

No âmbito das forças ucranianas, em decorrência das perdas sucessivas e acentuadas de sistemas de artilharia, há cada vez mais evidências de um aumento acentuado de casos de uso de drones kamikaze pelas Forças Armadas da Ucrânia (FAU), com vídeos aparecendo regularmente.

Talvez a principal razão para o uso muito mais frequente pelas forças ucranianas de drones FPV seja a redução nas capacidades de obuses e sistemas de lançamento múltiplo de foguetes (MLRS) em função da destruição por fogo de contra bateria russo e ataques de aviação. Para as unidades das forças ucranianas que operam na área de Kherson, por exemplo, os drones FPV são quase o único meio operativo de neutralização de forças inimigas no terreno.

No entanto, esses sistemas têm suas limitações. Por exemplo, utilizá-los muito constantemente aumenta o risco de perdas para operadores treinados que operam próximos da linha de frente e são usualmente detectados por sistemas de reconhecimento e de inteligência de sinais, sendo que tais operadores, não são reproduzidos rapidamente e não nos volumes exigidos pelo esforço de guerra.

Por sua vez, utilizá-los a partir da margem direita do Rio Dnieper aumenta a distância até a linha de frente e, consequentemente, reduz o alcance de voo e a massa da carga útil do drone. Além disso, por causa do Rio Dnieper, é mais difícil organizar um ataque contínuo ou pelo menos regular, razão pela qual o valor de combate de cada voo cai significativamente. Algumas áreas povoadas na margem esquerda estão realmente dentro da área de cobertura dos UAV na modalidade kamikaze. No entanto, eles chegam no alvo quase no limite do alcance de voo (tanto em termos de carga da bateria quanto de estabilidade do sinal), o que afeta a controlabilidade e dá uma margem de segurança e eficácia muito estreita para o uso do drone. Simplificando, se o operador não encontrou o alvo imediatamente, não terá tempo de procurar um alvo sobressalente.

Fontes militares russas e ucranianas tem alertado o uso mais intensificado e eficaz de drones por ambas as forças beligerantes por toda a frente de Zaporozhye e em outras frentes no teatro de operações. Neste contexto, vale ressaltar que a progressão ponto a ponto de grupos táticos de assalto de infantaria das forças russas tem sido afetada pelo uso de drones kamikaze e FPV ucranianos que são normalmente empregados em pares, em que enquanto um ataca imediatamente, o outro registra a derrota e ataca o soldado que corre para ajudar a vítima.

Durante interrogatórios, os prisioneiros militares ucranianos dizem que, em muitas das suas formações e unidades de combate, os níveis de especialização de pessoal foram alterados e agora quase todos os pelotões de infantaria têm seções de operadores de drones.

Ambas as forças em conflito os têm em abundância.

A rotação de posições para forças russas e ucranianas torna-se um desafio, para dizer o mínimo. A principal resposta de contraponto tático tem sido:

  • Uso de bloqueadores de drones inclusive para proteger colunas em movimento, embora haja níveis insuficientes de tais sistemas para ambos os exércitos em conflito;
  • Os próprios drones kamikaze e FPV são necessários como um enorme item consumível e inerentemente passível de aceitação de perdas diárias em alta intensidade. Para produzi-los em quantidades que atendam às novas necessidades da frente, a Rússia e a Ucrânia tem se deparado com desafios diversos, tais como restrições de fornecimento, atrasos burocráticos e sobrecarga de produtores domésticos.

Além disso, o uso maciço de drones FPV como arma principal é limitado e depende de todo um conjunto de fatores – desde o clima e o treinamento do operador até a operação de sistemas de guerra eletrônica pelo inimigo.

Tal como no início do advento dos drones FPV, devido às suas características de desempenho, um UAV comercial adaptado para ataque não é capaz de substituir uma bateria de artilharia completa. Tendo em conta que a progressão e controle de área na guerra na Ucrânia é marcadamente lenta pelas características do terreno, limitações e poderio bélico das forças em conflito e emprego destacado de sistemas ISR que permitem uma consciência situacional favorável à neutralização de ataques do adversário, o êxito de um ataque depende da conjugação de armas combinadas e integradas, além do máximo de destruição de fortificações e de unidades de combate do inimigo, o que não se consegue somente com drones kamikaze ou FPV.

Em relação às declarações sobre “enxames” e “centenas de milhares” de drones que têm circulado na internet, é necessário cautela na assimilação de tais informações como críveis. Para o uso de milhares de drones como se narra nas notícias de algumas mídias, deve-se levar em consideração que cada drone requer um operador, de modo que a utilização simultânea de pelo menos cem drones FPV exigirá pelo menos cem operadores e suporte para entrada de posições e de lançamento, sem contar o emprego integrado de operadores de drones de reconhecimento e UAVs de retransmissão.

Portanto, as Forças Armadas da Ucrânia não têm operadores suficientes treinados para tais operações.

É digno de nota que, sob as mesmas condições, os UAVs russos ZALA, “Orlan” e “Lancet” tornaram-se bastante utilizados pelas forças russas em complemento ao uso sistemático e maciço de artilharia. Com a ajuda destes drones, os alvos são regularmente detectados e atingidos após um ataque preparatório de artilharia, de modo que o uso isolado de drones para ataques de saturação de área não é suficiente para a geração de danos que criem um contexto de derrota tática.

Portanto, embora inovador e uma tendência crescente, o uso de drones FPV é um recurso tático com limitações que não deve ser considerado como um ponto de virada estratégico.

A complexidade da situação das forças ucranianas em Avdeevka

A estabilidade da defesa de qualquer área fortificada das Forças Armadas ucranianas depende dos abastecimentos regulares de suas forças e da eficiência do fluxo logístico, ambos dependentes estruturalmente da OTAN.

A situação mais relevante está na defesa do setor de Avdeevka, onde ocorre uma ofensiva russa em vários eixos que criou uma temerária saliência para as forças ucranianas cada vê mais cercadas a principal rota de abastecimento de suas unidades de combate segue ao longo da rodovia que passa por Orlovka, a menos de quatro quilômetros a oeste da coqueria industrial de Avdeevka, onde as forças russas estão empreendendo ataques diários e tentativas de controle total. Na verdade, esta é a única rota de abastecimento de todo o grupo ucraniano neste setor – tanto a rota através da coqueria industrial quanto Orlovka estão localizadas entre a cobertura norte e sul (cuja distância é de apenas sete quilômetros), onde avançam unidades das Forças Armadas russas em manobra de duplo flanqueamento.

Uma alternativa à rodovia que passa por Orlovka, que há muito está sob controle de fogo das Forças Armadas da Federação Russa, podem ser estradas de terra paralelas ao norte e ao sul, mas todas estas rotas passam mais perto das posições russas, razão pela qual os riscos de destruição de equipamentos aumentam exponencialmente. Ao mesmo tempo, Orlovka está essencialmente imprensada entre as posições das forças russas e sob vigilância constante de drones ISR. A movimentação segura em trânsito por tais rotas remanescentes e a colocação de reservas ou cargas dentro dos limites administrativos da aldeia não são mais possíveis. O transporte de mercadorias é provavelmente realizado em pequenos grupos (e em alguns casos até por veículos individuais), no escuro ou em condições de visibilidade reduzida – sob chuva, nevoeiro etc.

Atualmente, para reforçar unidades entrincheiradas em Avdeevka, as Forças Armadas da Ucrânia percorrem três rotas principais. O primeiro é pelo norte, através de Berdychi. Esta rota é extremamente insegura e após o avanço das Forças Armadas russas em Stepovoy, bem como o avanço ao longo da ferrovia em direção a Ocheretino, deixou de ser minimamente segura.

Como alternativa à rodovia que passa por Berdychi, podem servir parcialmente estradas rurais ao longo das plantações florestais, com todos os problemas decorrentes: capacidade limitada e estradas de qualidade insuficiente. A segunda rota é ocidental – através de Novoselovka. Por enquanto, esta é a rota mais segura para o transporte de munições e reservas para Avdeevka. A terceira rota é ao sul, passando por Umanskoye, Karlovka e Netaylovo. O problema é que estas áreas também estão sob vigilância das Forças Armadas russas e ao alcance de suas armas.

Se as Forças Armadas da Ucrânia não contiverem o avanço das Forças Armadas russas nesta linha, será mais difícil para elas ganharem uma posição a oeste de Berdychi. Se as Forças Armadas da Federação Russa alcançarem um terreno elevado em a caminho de Novopokrovskiy, então as tropas russas terão realmente a oportunidade de observar os movimentos do adversário e interromperão todo o abastecimento das forças ucranianas na área de Avdeevka. Percebendo isso, o comando das Forças Armadas da Ucrânia provavelmente definirá (ou já definiu) a tarefa de se firmar na área de Berdychi, apesar de as posições ali não serem ideais. Principalmente se assumirmos que as tropas ucranianas têm agora de equipar uma linha de defesa no inverno em posições visíveis, além do fato de que praticamente não sobra tempo para colocar bunkers de concreto, se não forem equipados com antecedência. Até o momento, todos os sinais indicam que as Forças Armadas da Ucrânia poderão transferir reforços para esta área vindos de outras direções, uma vez que o atual número de tropas poderá em breve não ser suficiente diante do crescente ataque das forças russas.

Por um lado, as Forças Armadas da Ucrânia não têm claramente pressa em deixar Avdeevka, embora já estejam se configurando os pré-requisitos para o surgimento de grandes problemas. As reservas são transferidas periodicamente para a área da operação Avdeevka, mas todas atuam mais como brigadas de fogo, obstruindo fugas em diversas áreas. Por outro lado, para as Forças Armadas russas não é tão importante avançar mais profundamente no território ocupado pelas Forças Armadas da Ucrânia. Ao mesmo tempo, o movimento das Forças Armadas russas continua ao longo da ferrovia até Ocheretino.

Qualquer movimento para Avdeevka é realizado através de uma série de gargalos – entroncamentos e interseções rodoviários sujeitos a bombardeios maciços. Ressalte-se também que o percurso sul depende em grande parte do funcionamento da travessia pelas eclusas da Barragem “Charles”. Se esta estiver desativada, a utilização desta rota será difícil. Se as forças ucranianas usarem estradas de terra, embora seja possível esta opção, acarreta muitos riscos. Em primeiro lugar, tais corredores impõem restrições à capacidade de carga e aumentam os requisitos para a manobrabilidade do equipamento. Os veículos comerciais na estrada de terra inevitavelmente terão lentidão e mais cedo ou mais tarde serão detectados por sistemas de reconhecimento.

Em segundo lugar, as estradas de terra que ainda permitem uso por forças ucranianas limitam seriamente o uso de porta-tanques, grandes vans, caminhões-tanque etc. Vale lembrar que as unidades ucranianas em Avdeevka ainda possuem equipamentos pesados ​​​​que requerem manutenção, combustível, lubrificantes e munições em volumes de dezenas de toneladas (é extremamente difícil fornecer tal quantidade utilizando logística ponto-a-ponto).

Estes fatores se vinculam ao cenário improvável com a retirada da guarnição ucraniana de Avdeevka, atualmente estimada em 30-35 mil combatentes. Para recuar em massa de Avdeevka, de forma organizada e preservando equipamentos pesados, as Forças Armadas da Ucrânia terão que percorrer as mesmas rotas, sujeitando-se a serem detectadas e bombardeadas. Uma decisão neste momento que leve à retirada das Forças Armadas da Ucrânia ao longo de estradas de terra também estaria repleta de problemas: as forças ucranianas correm o risco de perder a maior parte do seu equipamento utilizável e todos os suprimentos, equipamentos defeituosos e outras cargas de grandes dimensões terão de permanecer em Avdeevka para a retirada o mais rápido possível. Portanto um retraimento de forças ucranianas se faz urgente para preservação do máximo de equipamentos e de pessoal perante as rotas ainda utilizáveis.

No dia 19 de janeiro, de acordo com relatório do canal militar Rybar, apesar de não ter sido possível cercar Avdeevka antes do início do ano de 2024, os combates continuam intensos no setor.

A principal atenção é dada aos maciços ataques russos às localizações das unidades ucranianas, através da aviação e artilharia. Mas apesar do controle de fogo sobre as rotas de avanço das formações ucranianas, unidades das forças ucranianas ainda mantêm a possibilidade de realizar rotação de posições. Dessa forma, há alguns dias, grupos do 110º Regimento de Infantaria das Forças Armadas ucranianas foram transferidos para Avdeevka para reforçar posições a serem defendidas.

Na periferia nordeste de Stepovoy, os confrontos ainda continuam, a aldeia está na zona cinzenta, ou seja, não controlada por nenhuma força.

As Forças Armadas da Federação Russa estão focadas na expansão da zona de controle a leste da coqueria industrial de Avdeevka. Ainda não há ataque à central de tratamento de água, mas as forças russas avançam ao longo das bacias de sedimentação a sudeste das instalações de tratamento e nos campos em direção à pedreira.

Com base novamente no reporte do canal Rybar, reforços russos foram mobilizados a partir de Kamenka para fortalecer o ataque, permitindo que em 18 de janeiro, conseguiram chegar aos arredores das ruas Kolosov e Levanevsky.

Os combates continuam a oeste da estação de filtragem de água de Donetsk e da zona industrial do Parque Dukhovnost. Já do lado da lagoa Novo Avdeevsky, as Forças Armadas russas avançam ao longo da periferia nordeste de Pervomaysky.

Já ao norte de Opytny, as forças russas não abandonam as tentativas de ocupar a zona cinzenta sob o micro distrito de Khimik.

Aparentemente, o comando do grupo de tropas russo decidiu concentrar seus principais esforços na limpeza do setor dacha ao redor de Avdeevka e no isolamento das forças ucranianas nas zonas cinzentas.

O comando das Forças Armadas da Ucrânia espera conter o ataque das Forças Armadas russas e estabilizar a linha de defesa ao longo do canal Seversky Donets – Donbass, a fim de ganhar tempo e concluir os trabalhos de engenharia e fortificação.

Por que a artilharia das Forças Armadas da Ucrânia está perdendo eficácia

A escassez de munições e as dificuldades com a manutenção e uso de artilharia de origem estrangeira se tornaram mais proeminentes a partir de setembro, conforme declarações na mídia de militares ucranianos.  No entanto, este problema agravou-se devido a uma série de outros fatores.

Atualmente, as Forças Armadas da Ucrânia enfrentam uma escassez aguda de munições de 122 e 152 mm, usadas para sistemas de artilharia e MLRS de origem soviética ainda em número razoável, diante da enorme quantidade disponível em estoques distribuídos no país. É óbvio que, ao contrário das previsões de alguns especialistas e das declarações de representantes da Ukroboronprom (responsável pela indústria de defesa da Ucrânia), não foi possível estabelecer a produção em massa de munições destes calibres ao longo do ano passado. A escassez de projéteis de 122 e 152 mm também foi confirmada pelo comandante do grupo Tavriya das Forças Armadas, Alexander Tarnavsky.

Como resultado, os sistemas de artilharia de calibres 105 e 155 mm fabricados no Ocidente tornaram-se os principais sistemas de artilharia das Forças Armadas da Ucrânia. Os cartuchos para armas de artilharia destes calibres têm sido fornecidos quase desde os primeiros pacotes de ajuda militar, mas rapidamente se tornou óbvio que o consumo de munições de artilharia nas Forças Armadas da Ucrânia é significativamente superior aos parâmetros calculados (a Ucrânia dispara de dois a quatro mil projéteis diários em toda linha de frente).


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• Rodolfo Laterza e Ricardo Cabral (Autores)
Pedro Silva Drummond (Editor)
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Há algum tempo é reportado na mídia sobre o problema da diminuição da disponibilidade de projéteis de sistemas de artilharia rebocada e autopropelida de origem ocidental. Devido à escassez de projéteis de longo alcance de 155 mm, obuses autopropulsados como o francês CAESAR, o alemão PzH 2000, o americano M109A6, o polonês AHS Krab e o britânico AS-90 começaram a se aproximar mais da linha de frente, onde se tornaram alvos não apenas dos drones kamikaze Lancet, mas também de sistemas de artilharia russos em disparos de contra bateria.

Em comparação com o inventário pré-guerra de sistemas de artilharia do tipo soviético, as Forças Armadas da Ucrânia têm à sua disposição significativamente menos sistemas de artilharia de calibres 105 e 155 mm. Ao mesmo tempo, obuseiros de calibres estrangeiros não são produzidos na Ucrânia, razão pela qual só é possível compensar as perdas de contra bateria com a ajuda de suprimentos ocidentais.

Durante 2023, surgiram duas tendências que se cruzam. Primeiramente, deve-se frisar que o número de sistemas de artilharia ocidentais está diminuindo; revelou-se impossível reabastecê-los no mesmo ritmo e no mesmo nível.

Consequentemente, o número de missões de fogo para os sistemas de artilharia ocidentais das forças ucranianas que permanecem em serviço está crescendo, gerando desgaste e risco contínuo de depreciação ou destruição.

Na grande maioria dos casos, cargas completas de pólvora são usadas para disparos em sequência e seu uso contínuo, por sua vez, aumenta várias vezes o desgaste do cano. De acordo com os padrões americanos, os canos dos obuses dos sistemas de artilharia modernos, como o M777 (que hoje é o principal sistema de 155 mm em serviço nas Forças Armadas ucranianas), devem ser substituídos após 2.500 tiros. À medida que este limiar se aproxima, iniciam-se processos de degradação que afetam a precisão e podem levar à ruptura do cano, o que tem sido observado nos batalhões de artilharia das Forças Armadas da Ucrânia. Assim, disparando 30 tiros por dia (e este é um número extremamente baixo para operações de combate de alta intensidade), é possível esgotar completamente a vida útil do cano em pouco menos de três meses. Ao mesmo tempo, é importante compreender que o fornecimento de novos sistemas de artilharia de 155 mm à Ucrânia não foi anunciado recentemente e muitos dos obuses que permanecem nas forças ucranianas já ultrapassaram há muito a marca dos 2.500 tiros.

Como resultado, as Forças Armadas da Ucrânia enfrentam um dilema: fornecer apoio de fogo ou correr riscos e exceder o limite de desgaste permitido, o que pode levar ao fracasso na disponibilidade futura dos obuses, dos quais já existem poucas unidades. Ambas as opções levam a pelo menos uma diminuição na densidade e na qualidade do apoio de fogo, o que com alto grau de probabilidade se refletirá em breve no campo de batalha.

Paralelamente a estes problemas, a atividade da artilharia e da aviação das Forças Armadas da Federação Russa e a eficácia das ações de contrabateria aumentaram significativamente, ainda que ocorram perdas de aeronaves de combate pelas forças russas devido à utilização de sistemas de defesa aérea avançados pelas forças ucranianas cedidos pelos países da OTAN. Por estas razões, os artilheiros ucranianos, em casos raros (como, por exemplo, em Avdeevka ou em Tyaginka, na margem direita do Dnieper), usam artilharia perto do LBS e são forçados a disparar com sistemas de artilharia a uma distância de sete a 10 quilômetros da linha de contato, sujeitando-se a derrotas por fogo de contrabateria.

Avanços táticos russos e realinhamento defensivo das forças ucranianas

As forças russas a partir do início de dezembro, aproveitando a rotação de pessoal e realocação de novas unidades recentemente mobilizadas e treinadas, iniciaram uma série de ofensivas pontuais em vários eixos do perímetro operacional, para ocupar e consolidar áreas taticamente favoráveis e desgastar as unidades de combate ucranianas com capacidade operacional ainda relevante.

No eixo de Bakhmut, os ataques são variados no alcance da progressão.

Pelo nordeste, a partir do sul do reservatório de Berkhovsky, avançaram bem substancialmente e já estão na aldeia de Bogdanovika e acessando a estrada que liga a Chasov Yar. A queda de Khromovo foi surpreendente e um facilitador.

A sudoeste foi muito mais restrito em Kleshcheevka, tendo reocupado a parte norte do assentamento e afastado as forças ucranianas da linha férrea. Isso decorre por haver muitas colinas nessa área, várias pequenas represas e áreas florestais. Ocupar esses segmentos é taticamente ruim e pode levar a muitas perdas – vide a estupidez tática das forças ucranianas que desde outubro se meteram em uma kill zone neste setor.

Os combates nas direções Kupyansky e Seversky estão atualmente ganhando ritmo.

Apesar de derrotas táticas decorrentes que levaram a desagradáveis perdas devido principalmente ao mau planejamento operacional (principalmente com emprego de unidades de infantaria em assaltos frontais sem a devida preparação de artilharia), as forças russas estão pressionando as unidades de combate ucranianas na área de Sinkovka. As unidades das Forças Armadas da Ucrânia estacionadas na margem esquerda de Kupyansk estão sofrendo interrupções no reabastecimento de reservas e munições, e os combatentes (em sua maioria mobilizados) em grupos recusam-se cada vez mais a cumprir as ordens do comando. Nos últimos dias, a artilharia russa supostamente realizou uma série de ataques bem-sucedidos em áreas onde as forças ucranianas estavam concentradas em áreas florestais ao sul de Kupyansk-Uzlovoy, incluindo onde estão entrincheiradas posições de tiro de artilharia. Fontes ucranianas no Telegram sinalizam uma situação crítica. Segundo alguns relatos, na tentativa de estabilizar a situação, o comandante das Forças Terrestres das Forças Armadas ucranianas, general Oleksandr Syrskyi, chegou a Kupyansk. As batalhas ainda estão predominantemente em caráter posicional, embora haja ímpeto ofensivo russo.

As ações ofensivas das formações das Forças Armadas russas continuam na direção de Seversky, com sucessos táticos tangíveis recentes. Após o avanço russo bem sucedido ao longo da linha férrea, a norte das povoações de Belogorovka e Nagornoye, conseguiram ocupar alturas dominantes no flanco esquerdo das posições ucranianas em Vesele, cujo controle total foi estabelecido em 18 de janeiro após retirada de forças ucranianas que corriam risco de serem cercadas, notadamente unidades da 10ª Brigada de Assalto de Montanha separada.  Apesar da queda de Vesele, mais à noroeste as forças russas terão que derrubar uma grande fortaleza ucraniana que cobre o flanco esquerdo de Razdolovka (na estrada para Seversky).

Posteriormente, movendo-se para o norte ao longo da linha férrea em direção à estação de Vyemki, forças russas sofrerão resistência ucraniana na faixa de 6 quilômetros entre Vyemki-Ivano-Darovka-Spory.

Nas últimas semanas, as forças russas avançaram bem para sudeste de Rabotino, bem como para oeste de Verbovoye, continuando a limpar a saliência de Rabotino- Verbovoye. No atual ritmo de avanço, a questão das batalhas diretas por Rabotino se tornará realidade até o final do mês. As forças ucranianas estão se preparando para isso fortalecendo as defesas na base da saliência de Rabotinsky e ao sul de Orekhov.

Apesar de sucessos táticos variáveis pelas forças russas, é fundamental reiterar que ocupação de terreno ou área não é determinante para avaliação de êxito estratégico ou mesmo tático em um conflito.

Alguns analistas ocidentais se fixaram em uma temerária linha de avaliação de contextos operacionais e estratégicos em guerras: avaliação com ênfase principal por mapa dissociado de fatores como controle de área (diferente de ocupação; sustentabilidade da posição; logística; qualidade da linha defensiva; manobras de retraimento; defesa móvel e elástica por cessão deliberada de área para infligir dano ao inimigo com maior e melhor êxito; diminuição e redução da linha de defesa e de atrito para justamente consolidar áreas de interesse e preservar efetivo; retirada pela desvantagem geográfica em detrimento do pouco valor tático ou estratégico do local). O desprezo a estes componentes tático-operacionais inerentes à história militar e a milênios de estudos produz absurdos como a insistência em jogar tropas de fuzileiros navais ucranianos para o povoado cercado de Krinky; insistir em ataques sem finalidade na linha de Rabotino-Verbovoye, tal como o próprio ataque russo desastroso a Vuhledar em fevereiro de 2023; ataques frontais mal sucedidos em Sinkovka pelas forças russas, dentre outras de decisões taticamente questionáveis.

Aumento de ataques de longo alcance à retaguarda

Recentemente a Ucrânia aumentou consideravelmente atividade dos seus ataques aéreos à significativa distância da linha de frente com emprego de mísseis de cruzeiro fornecidos pelo Ocidente, como os sistemas britânico Storm Shadow (cerca de 200 fornecidos) e francês SCALP. Além disso, tal como já observado aqui, ataques de drones kamikaze ucranianos, várias dezenas de cada vez, com o início do outono tornaram-se quase comuns, inclusive misturados com alvos falsos.  Talvez não seja exagero dizer que as forças aerospaciais remanescentes do regime de Kiev tornaram-se mais ativas, assim como o uso maciço de drones.

Muitos dos ataques ucranianos através de drones e mísseis de cruzeiro de longo alcance são deflagrados após amplo reconhecimento e monitoramento realizado por plataformas de países da OTAN, que usualmente sobrevoam o Mar Negro, além de imagens e sinais detectados pela enorme constelação de satélites dos EUA e países europeus que permitem uma vantagem qualitativa na consciência situacional, permitindo localização de alvos estacionários e móveis, detecção de pontos vulneráveis nas camadas de defesa aérea russa e uso concentrado de drones em determinado ponto de concentração de força para sobrecarregar a defesa aérea russa.

Estes ataques exigem bastante planejamento e causam estragos por vezes consideráveis a meios operacionais russos e a infraestrutura crítica. A defesa aérea russa de ponto e de área tem se adaptado, melhorando os índices de êxito de interceptação.

Quanto à Rússia, além do uso concentrado de drones Geran-2 para sobrecarregar a defesa aérea da Ucrânia fornecida e provida pela OTAN, os militares russos estão entregando mísseis com sistema de controle analógico e sistema de comando de televisão e rádio, além de mísseis dotados de sistemas de navegação e posicionamento global de guiagem por satélites. Estas munições demonstraram boa eficácia contra alvos militares na Ucrânia.

Vários mísseis P-35B de produção soviética dos complexos Utes e Redut foram usados ​​para atacar as posições dos sistemas de mísseis antiaéreos ucranianos na área de Odessa, servindo como alvos e iscas para a defesa aérea ucraniana. O P-35 é um míssil antinavio supersônico soviético que pesa mais de quatro toneladas e tem um alcance de tiro de até 400 km. A munição foi testada em 1959, em 1964 foi colocada em serviço em navios de superfície, e posteriormente sua última modificação, P-35B, foi utilizada pelos sistemas de mísseis costeiros estacionários e móveis “Utes” e “Redut”.

O principal objetivo dos invasores ao atacar a Ucrânia não é esgotar o sistema de defesa aérea, mas atacar um “alvo” específico, por exemplo, uma instalação de infraestrutura crítica ou um complexo de defesa aérea.

Cada míssil e drone das forças russas tem a sua própria missão específica perante um destino pré-determinado e voa para os alvos correspondentes. Ataques maciços da Rússia dispersam a atenção de toda a defesa aérea ucraniana para que o maior número possível de armas atinja o alvo.

Um sistema de defesa aérea ucraniano típico consiste em muitas partes e elementos, funcionando como um sistema integrado, na seguinte forma:

  • Avião de combate;
  • Unidades de mísseis antiaéreos;
  • Unidades especializadas de rádio que detectam alvos;
  • Defesa aérea como parte das Forças Terrestres e outras Forças de Defesa;
  • Grupos de fogo móveis.

A defesa aérea ucraniana está focada na defesa local das cidades com armazenamentos de sistemas e recursos mais sensíveis para o esforço de guerra, bem como defesa de instalações críticas relacionadas.

Pode-se presumir que um dos problemas mais graves do sistema de defesa aérea ucraniano é a falta de munições. Reabastecer as suas reservas para sistemas de defesa aérea de fabricação soviética será problemático, uma vez que os Estados Unidos e os países ocidentais provavelmente já retiraram quase tudo o que puderam das suas próprias reservas e das reservas de outros países. Ou seja, por exemplo, as Forças Armadas da Ucrânia manterão algumas unidades do sistema de defesa aérea S-300, mas sofrerão escassez severa de munições.

Para superar este complexo defensivo, as forças estratégicas russas impulsionam uma carga ofensiva muito grande ao mesmo tempo. Primeiro, os drones atingem alvos como infraestrutura energética e postos de comando, com reconhecimento em vigor. Depois dos drones, os mísseis de cruzeiro ou balísticos voam em direções diferentes, atingindo várias infraestruturas e depósitos de munições.

Para a Rússia, a destruição do sistema de defesa aérea ucraniano provido pela OTAN é uma tarefa primordial, cuja solução poderia mudar a maré da guerra.  Esta tarefa é completamente solucionável, mas exigirá o envolvimento de recursos significativos, planejamento operacional competente e vontade política para ampliar frotas de aeronaves de alerta aéreo antecipado, ELINT e guerra eletrônica (EW), atualmente em número insuficiente. A perda não confirmada de uma aeronave A-50U AWACS seria muito prejudicial à eficiência dos ataques de cruzeiro russos e à integração de seu sistema de defesa aérea perante ataques ucranianos com mísseis de cruzeiro como SCALP ou Storm Shadow.

Considerações finais: Tendências e dificuldades no ano de 2024

Após o fracasso da contra- ofensiva de verão, Kiev está mudando a sua estratégia e passando para a “defesa ativa” para sobreviver em 2024. Ao mesmo tempo, o Ocidente coletivo reconhece que as Forças Armadas da Ucrânia não são capazes de manter um esforço defensivo sustentável sem ajuda estrangeira e não esperam ataques que levem a grandes recuperações territoriais em um futuro próximo.

O regime de Kiev abandonou as esperanças de uma vitória rápida e se prepara para um confronto prolongado com a Federação Russa, já que há poucas hipóteses de um avanço operacional decisivo ou substancial de qualquer dos lados em conflito em 2024, muito menos nos próximos meses.

Esta realidade também foi reconhecida em Kiev: no início de dezembro, o presidente Volodymyr Zelensky disse que tinha chegado uma “nova fase”. Quando as suas forças não conseguiram retomar vastas áreas no sul como originalmente planejado, ele ordenou ao exército que erigisse novas fortificações ao longo de seções-chave da linha da frente de mais de mil quilômetros, sinalizando uma transição de uma postura ofensiva para uma postura defensiva.

Algumas análises mais otimistas dizem que uma estratégia de “defesa ativa” baseada em manter linhas defensivas enquanto sonda as fraquezas do inimigo, combinada com ataques aéreos de longo alcance em infraestrutura crítica na retaguarda russa, permitirá à Ucrânia “aumentar sua força” este ano e preparar-se para 2025, quando uma contra ofensiva tiver maior chance de sucesso.

Mas em um cenário mais realista, o destino da Ucrânia será certamente decidido por vários fatores. A principal delas é a incerteza em torno da assistência militar ocidental. Em primeiro lugar, trata-se de munições, que já são escassas. A questão da determinação do Ocidente em manter o mesmo nível de fluxo de recursos em volume de assistência como nos anos de 2022 e 2023 também permanece em aberto: o Ocidente será capaz (e estará disposto) a continuar a apoiar a Ucrânia em sua luta?  E, em caso afirmativo, até que ponto?

Na Europa tendências negativas de continuidade deste nível de suporte já são expostas, com países como Eslováquia e Áustria se juntando à Hungria em uma frente cada vez mais expressiva que se recusa apoiar militar e economicamente a Ucrânia.

A maior preocupação está em Washington, já que no dia 27 de dezembro a Casa Branca anunciou que estavam esgotadas as possibilidades de transferência de armas e equipamento militar para Kiev. Embora os países europeus, incluindo o Reino Unido e a Alemanha, forneçam um apoio financeiro e militar significativos, os EUA continuam a ser o maior fornecedor de equipamento militar às Forças Armadas da Ucrânia. Mas os republicanos de direita no Congresso retiveram dezenas de bilhões de dólares em financiamento militar para Kiev. E até que o Congresso aprove este pacote, não se espera mais apoio. Fiona Hill, uma importante especialista em Rússia e antiga conselheira de segurança nacional da Casa Branca, disse ao Politico em dezembro que a Ucrânia ainda se mantém unida “graças ao apoio militar maciço dos aliados europeus e de outros parceiros”.

Mas mesmo que a Casa Branca chegue a um acordo com o Congresso sobre mais ajuda à Ucrânia, é pouco provável que consiga o tipo de avanço em capacidade e tecnologia que permitirão à Ucrânia recuperar uma vantagem decisiva neste ano.

Em dezembro passado, o Ministério da Defesa da Estônia publicou um relatório argumentando que a Ucrânia deveria mudar para uma “defesa estratégica” para ganhar, para ela própria e seus aliados, tempo para fortalecer sua base industrial, treinar reservas, acumular mão-de-obra e aumentar a capacidade de produção de artilharia, a fim de retomar a atividade ofensiva em 2025.

Acredita-se que Washington esteja incutindo uma estratégia semelhante na Ucrânia. Os americanos também insistem em uma abordagem mais conservadora. Em vez de uma ofensiva terrestre, o foco está na manutenção do território atualmente controlado por Kiev, no fortalecimento de posições taticamente importantes e no acúmulo de suprimentos e forças nos próximos meses.

Entretanto, segundo os Estados Unidos, as Forças Armadas da Ucrânia poderão continuar a investigar as fraquezas das defesas russas, a fim de tirar partido delas assim que a oportunidade surgir. Da mesma forma, a Ucrânia poderá continuar – e talvez expandir – ataques aéreos de longo alcance utilizando mísseis e drones que já se revelaram eventualmente eficazes (por exemplo, contra a Frota do Mar Negro na Crimeia e contra campos de aviação na referida península).

Outra razão pela qual a Ucrânia precisa de reforçar sua defesa é que a Rússia pode estar planejando uma ofensiva em grande escala no próximo verão, conforme indicado por algumas autoridades ucranianas. O objetivo desta ofensiva russa seria tomar os territórios restantes de quatro regiões – Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporizhzhya, que Putin anexou em setembro de 2022. Além disso, segundo as mesmas autoridades ucranianas, não pode ser descartada outra tentativa de sitiar Kharkov ou mesmo Kiev, buscando o colapso político do regime e do comando militar.

Isso explica por que a Rússia continua as operações ofensivas no leste da Ucrânia em várias direções ao mesmo tempo – especialmente em torno de Avdeevka, bem como em direção a Krasny Liman e Kupyansk, no nordeste.

No entanto, o impasse no campo de batalha é mais benéfico para Moscou, pois Putin conta com ele para enfraquecer o apoio ocidental à Ucrânia e, em última análise, dar uma vantagem estratégica ao Kremlin.

O ano de 2024 será complexo e ligeiramente favorável à Federação Russa nos aspectos militar e político, permanecendo, entretanto, sérios desafios e dificuldades para ambas as forças em conflito.


Publicado no História Militar em Debate.


Fontes consultadas

Ukraine is ramping up its drone attacks on Russian forces, hitting a record 220 targets last week, official say. Business Insider, 2 de outubro de 2023. Disponível em: https://www.businessinsider.com/drones-taking-out-record-number-of-russia-armor-artillery-ukraine-2023-10.

Ukraine fatigue: Bad for Kyiv, bad for the West. Centre for European Reform, 21 de novembro de 2023. Disponível em:  https://www.cer.eu/publications/archive/policy-brief/2023/ukraine-fatigue-bad-kyiv-bad-west.

90% Ukrainian FVP Drones ‘Fall Prey’ To Russian EW Attacks While ‘Mighty’ AD Systems Struggle, Reports Say. The Eurasian Times, 15 de dezembro de 2023. Disponível em: https://www.eurasiantimes.com/90-ukrainian-fvp-drones-fall-prey-to-russian-ew-attacks-while-mighty-ad-systems-struggle-reports-say/.

Russians do everything for a reason: Ignat talked about the goals of mass attacks of the Russian Federation and the work of air defense (video).  Focus, 20 de janeiro de 2024. https://focus.ua/uk/eksklyuzivy/621371-rosiyani-vse-roblyat-ne-prosto-tak-ignat-rozpoviv-pro-cili-masovanih-atak-rf-ta-robotu-ppo-video.

Ukraine’s mobile air defences have ammo for ‘few more attacks’: commander. France 24, 1º de janeiro de 2024. Disponível em: https://www.france24.com/en/live-news/20240104-ukraine-s-mobile-air-defences-have-ammo-for-few-more-attacks-commander.

Angry Drones of Ukraine Armed Forces. What types of kamikaze drones are most publicly mentioned: statistics and examples. Molfar. Disponível em: https://molfar.com/en/blog/angry-drones-yaki-droni-kamikadze-zsu-naychastishe-zgaduyutsya-v-media-statistika-i-prikladi.

Ukraine’s Cheap FPV Drones ‘More Efficient’ Than Prized Artillery. Newsweek, 20 de dezembro de 2023. Disponível em: https://www.newsweek.com/ukraine-fpv-drones-mykhailo-fedorov-russia-avdiivka-1853646.

Opinion: This Is the World If Ukraine Loses. Politico, 13 de dezembro de 2023. Disponível em: https://www.politico.com/news/magazine/2023/12/13/russia-ukraine-war-west-funding-00131638.

Ukraine wants more Western air defenses ‘right now’. Politico, 9 de janeiro de 2024. Disponível em: https://www.politico.eu/article/ukraine-foreign-minister-dmytro-kuleba-missiles-air-defense-nato-russia-war/.

Yermak: A defensive position will lead to a freezing of the war, which we will not agree to. Pravda, 20 de janeiro de 2024. Disponível em: https://www.pravda.com.ua/news/2024/01/20/7438153/.

‘It’s a survival issue’: Ukraine looks to arm itself as Western support slips. Politico, 2 de outubro de 2023. Disponível em: https://subscriber.politicopro.com/article/2023/10/its-a-survival-issue-ukraine-looks-to-arm-itself-as-western-support-slips-00119528.

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