Forças de Autodefesa do Japão

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Por Reis Friede* e Catarina Costa**

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo analisar o contexto histórico e político que culminou com a criação, em 1954, das Forças de Autodefesa do Japão (Força Terrestre de Autodefesa, Força Naval de Autodefesa e Força Aérea de Autodefesa, que passaram a ser os três ramos correspondentes da defesa territorial japonesa), levando-se em conta, ainda, a expressa disposição do texto constitucional japonês, que em seu artigo nono dispõe: “o povo japonês, aspirando à paz internacional, baseada na ordem e na justiça, renuncia para sempre à guerra”, deixando clara a proibição do país de possuir forças militares clássicas de ataque e defesa. Embora relativamente pequenas e compactas do ponto de visto quantitativo, sob o prisma qualitativo, as Forças de Autodefesa do Japão são consideradas, por alguns especialistas, como uma das melhores do mundo, sendo claro que o país se encontra hoje na posição de principal aliado militar dos EUA na Ásia, bem como é reconhecido mundialmente por sua elevada organização e alta tecnologia.

I. Introdução

As denominadas Forças de Autodefesa do Japão foram criadas em sequência a uma série de eventos geopolíticos, desenvolvidos ao fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Em setembro de 1945, o Japão se encontrava em ruínas, em face dos resquícios dos 13 anos de conflito (iniciado com a anexação de territórios chineses em 1932), que acabaram por exaurir todas as forças produtivas nipônicas, incluindo o próprio elemento humano, com a morte de expressiva parte da população na faixa etária produtiva.


(Color) Surrender of Japan, Tokyo Bay, 2 September 1945
Rendição do Japão, Baía de Tóquio, 2 de setembro de 1945: Representantes do Império do Japão a bordo do USS Missouri (BB-63) durante a cerimônia de rendição (Imagem: Naval Historical Center Photo #USA C-2719. Fotografia do Army Signal Corps Collection no U.S. National Archives).

Os embates contra os Estados Unidos, pelo controle do Pacífico, foram o clímax para a ruína do país asiático, conduzindo o arquipélago japonês a assinar um Acordo de Rendição em 1945. Dentre as cláusulas do acordo (a que muitos historiadores, equivocadamente, interpretam como completamente impositivo e incondicional, quando, em verdade, algumas disposições foram efetivamente “negociadas”), constava a dissolução completa das Forças Armadas Japonesas. O outrora grandioso exército imperial japonês, composto por mais de seis milhões de militares em suas fileiras, deixou repentinamente de existir, restando apenas uma força policial de 75 mil homens, equipados com armas leves e com o objetivo (restrito) de manter a ordem interna durante a reconstrução do país, cabendo então (exclusivamente) ao exército estadunidense a proteção do território japonês, face às eventuais ameaças externas.

Com a deflagração da Guerra da Coréia (1950-1953), expressiva parcela dos militares estadunidenses, que restaram no Japão, foram enviados para a península coreana, expondo, em certa medida, a própria defesa territorial nipônica.


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Pôster de recrutamento da JSDF, 1954 (Imagem: The Asia Pacific Journal, Japan Focus, https://apjjf.org/site/show_list/id/226/start/210)

Paralelamente, movimentos socialistas no Japão começaram a se expandir, demonstrando um perigoso aumento da influência soviética na política interna japonesa, conduzindo, desta feita, a uma nova perspectiva, através da caracterização de um novo cenário, que acabou por originar nos EUA a necessidade de expandir a força policial do país para mais de 100 mil homens, culminando, finalmente, em 1954, com a decisão política de se criar as denominadas Forças de Autodefesa do Japão.

As nominadas Força Terrestre de Autodefesa, Força Naval de Autodefesa e Força Aérea de Autodefesa, passaram a ser os três ramos correspondentes da defesa territorial japonesa. O termo “autodefesa”, embora passe a impressão de ser (pleonasticamente) repetitivo, por ser sempre explicitado nos nomes designativos das diferentes vertentes de suas forças, advém da expressa disposição do texto constitucional japonês que, neste contexto analítico, deixa clara a proibição do país de possuir forças militares clássicas de ataque e defesa. O artigo nono da Constituição do Japão expressamente menciona que “o povo japonês, aspirando à paz internacional, baseada na ordem e na justiça, renuncia para sempre à guerra”.

II. As Forças de Autodefesa Japonesas no Século XXI

Com o desmoronamento da União Soviética em 1991, todavia, o Japão e os EUA passaram a mudar o foco de sua atenção militar, gradualmente, para a China e para a Coréia do Norte. Destarte, já no século XXI a política de defesa japonesa era, claramente, orientada contra as ambições chinesas no Pacífico, e a ameaça nuclear norte-coreana, fato que conduziu o gabinete japonês a elevar, em 2006, a então Agência de Defesa do Japão, ao estatuto de Ministério da Defesa. Mesmo parecendo uma alteração simples, o Japão passou a ostentar maior autonomia na gestão e disposição de suas forças militares. No ano de 2015, seguindo na mesma trilha, o Parlamento Japonês aprovou uma lei que permitia ao país a extensão de seu corpo de defesa a outros países aliados, caso fossem atacados, abandonando (interpretativamente) a ideia (original) mais restritiva de “autodefesa”.


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Edifício do Ministério da Defesa do Japão (Imagem: Peace and Japan – How Japan got militarized again, 15 de agosto de 2014, https://www.tofugu.com/japan/japan-militarization/)

Por outro lado, a própria posição política-constitucional de “autodefesa” japonesa vem sendo, cada vez mais, contestada internamente no país, com dirigentes políticos, parlamentares e organizações institucionais procurando elevar a mencionada Força de Autodefesa ao status de uma Força Armada, completa e autônoma, legalmente capaz de realizar ações ofensivas internacionais, caso seja necessário. Nesse sentido, vale ressaltar que Japão vem se envolvendo, cada vez mais, em atividades militares internacionais, ainda que todas patrocinadas pela ONU, no âmbito das chamadas “missões” de manutenção da paz, com destaque para o Sudão, onde o Japão esteve por cinco anos.

O atual Comandante das Forças Armadas do Japão é o Primeiro-Ministro, SHINZŌ ABE (que tomou posse em 2012) que é o responsável por acompanhar o trabalho do Ministro da Defesa, e, logo abaixo, na hierarquia, os próprios militares, que utilizam uma estrutura organizacional típica do Ocidente. Vale destacar que, atualmente, as forças militares japonesas estão dividas em cinco exércitos, cinco distritos navais e três forças aéreas.

III. Força Terrestre de Autodefesa Japonesa

A Força Terrestre de Autodefesa possui um contingente de 150.850 soldados, com mais de 46 mil reservistas, sendo eles divididos em dois principais grupos: o de resposta rápida, e o principal de reserva. Em caso de urgência, esse último ficaria responsável por treinar os outros dois milhões de reservistas, formados por efetivos ainda em idade militar.


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Soldados da Japanese Ground Self-Defense Force em treinamento anual no Campo de Treinamento Higashifuji em Gotemba, próximo ao Monte Fuji (Imagem: REUTERS/Kim Kyung-Hoon)

Apesar de seu tamanho reduzido, o exército japonês é considerado como uns dos mais bem treinados e equipados do mundo, possuindo, 690 tanques de combate médios, incluindo 66 unidades dos ultra modernos TIPO 10 (adicionadas a 283 do TIPO 74 e 341 do TIPO 90), além de possuir uma das maiores forças de helicópteros de ataque do mundo, com destaque para os norte-americanos AH-64D Apache (12 unidades) e BELL AH-1S Cobra (59 unidades), operando, também, grandes quantidades de helicópteros leves de ataque, como o Kawasaki OH-6D (44 unidades), que vem sendo substituídos pelo mais moderno e eficiente Kawasaki OH-1 (com 33 unidades já operacionais). No que concerne a sua infantaria, costuma vir armada com o fuzil de assalto Howa, TIPO 89, com munição de calibre tipo 5.56, padrão da OTAN.

Desde 1949, Japão e Estados Unidos mantém uma intima parceria em todos os níveis militares. desde equipamentos, troca de informações de inteligência e treinamento, contando, ainda, com a realização de exercícios regulares conjuntos anualmente. O efetivo total estadunidense em solo japonês vem sendo, entretanto, reduzido gradativamente, de um total de cinquenta mil em 2015, passando para 47.050 em 2016 e 39.950 em 2017 (respectivamente, 2.950 do Exército; 11.700 da Marinha; 11.450 de Força Aérea e 3.600 de Corpo de Fuzileiros Navais)1.


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Membros do Japan Ground Self-Defense Force lotados na 102ª de Aviação, no Campo Kizarazu (Imagem: defense.gov)

A Sede da 7° Frota Naval localiza-se, em solo japonês, na base de Yokosuka, contendo unidades da esquadra também aportadas na base de Sasebo2. Assim como a sede da 5° Força Aérea, na base aérea de Kadena, em Okinawa3 e seu comando estratégico, dotado de radares em Shariki (AN/TPY-2 x-band) e, em Kyo GAMISAKI (AN/TPY -2 x-band). As forças estadunidenses desdobradas no Japão correspondem ao maior contingente norte-americano no exterior, superando os efetivos estacionados, respectivamente, na Alemanha de 37.450 (sede dos Quartéis-Generais dos Comandos Europeu e Africano) e na Coréia do Sul de 28.500 soldados (sede da 7° Força Aérea, sediado na base aérea de OSAN, e do Quartel-General do 8° Exército).

IV. Força Naval de Autodefesa Japonesa

A Força Naval de Autodefesa do Japão conta com 45.350 militares (além de mais de 13.740 da Guarda Costeira), cerca de 150 navios e 350 aviões, destacando-se como a sexta maior marinha de guerra do mundo, atrás apenas das forças navais dos EUA, Rússia, China, Reino Unido e França.


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JDS Isoyuki, destróier classe Hatsuyuki (Imagem: JMSDF)

Possui 19 submarinos, 2 cruzadores, 32 destroieres, 9 fragatas e 4 porta-helicópteros, 3 grandes navios de desembarque anfíbio e diversos navios de apoio, tendo destaque para a classe Izumo de porta-helicópteros, que possui capacidade máxima para transportar 28 helicópteros fortemente equipados4. Os destroieres japoneses são dotados de lançadores de mísseis de cruzeiro, o que os transformam em plataformas eficientes contra alvos em terra e no mar. Em se tratando de submarinos, o Japão utiliza a classe Soryu e a classe Oyashio, ambas dotadas de submersíveis diesel-elétricos extremamente modernos e adequados para a defesa costeira do país5.

V. Força Aérea de Autodefesa Japonesa

A Força Aérea de Autodefesa Japonesa conta com mais de 50 mil militares e aproximadamente 800 aviões, 370 dos quais aviões de combate. É uma das maiores e mais bem equipadas do mundo. Seu caça principal de superioridade aérea é o F-15 Eagle (contando com 147 F-15J e 42 F-15 DJ), mas, recentemente, começou a receber os novos e mais modernos caças F-35 Lightning II, de 5° geração e com capacidade stealth.


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JASDF Mitsubishi F-2 na Base Aérea Misawa (Imagem: USAF/SSgt Chad Strohmeyer)

Utiliza, ainda, o Mitsubishi F-2, construído (sob licença) com base no F-16 Falcon norte-americano (com um total de 88 unidades operacionais: 58 F-2A e 30 F2-B), além de 51 caças F-4EJ Phantom II (em processo de substituição).

VI. O Desafio Chinês e Norte-Coreano

Conforme já referido, as atuais atenções japonesas estão voltadas para a China, e principalmente para a Coreia do Norte. Foi exatamente em resposta aos testes de mísseis balísticos norte-coreanos, que o Japão equipou seus destroieres com sistemas antimísseis. Esse sistema, contando todo o seu potencial, é capaz de deter até 360 ataques simultâneos de mísseis balísticos, um número claramente superior a capacidade (estratégica) estimada da Coreia do Norte. O país tem ainda sistemas terrestres móveis antimísseis, que, em conjunto com a marinha, acabam por criar um escudo antibalístico eficiente, principalmente a volta das grandes cidades.

VII. Principais Conclusões

Analisadas pelo ponto de visto meramente quantitativo as Forças de Autodefesa japonesas são consideradas relativamente pequenas e compactas. No entanto, ao analisarmos sob o prisma qualitativo, são consideradas, por alguns especialistas, dentre as melhores do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, Rússia, China, Reino Unido e França, rivalizando, em grande medida, com as Forças de Defesa de Israel.


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US Marines em instrução com soldados japoneses (Imagem: USMC/Caporal Chad J. Pulliam)

O Japão se encontra hoje na posição de principal aliado militar dos EUA na Ásia, sendo, ainda, um país reconhecido mundialmente por sua elevada organização e alta tecnologia.

Notas Complementares:

1 Efetivos Norte-Americanos no Mundo em 1980

É importante destacar que, em 1980, as atenções norte-americanas se concentravam, sobretudo, na Europa, com um contingente de 219.729 soldados (208.000 na Alemanha Federal, 4.400 em Berlim Ocidental, 3.760 na Itália, 569 na Grécia, 1.000 na Holanda, 1.200 na Turquia, além de outros 900 espalhados nos demais países da OTAN), além de mais 54.000 efetivos da Força Aérea, sendo 20.500 estacionados no Reino Unido.

Em comparação, existiam 30.000 soldados na Coréia do Sul e apenas 2.500 no Japão, além de 30.000 efetivos de Força Aérea espalhados entre a Coréia do Sul, Japão e Filipinas. O substancial aumento das forças estadunidenses no Japão decorreu, inicialmente, pelo fechamentos das bases norte-americanas em território filipino, e do colapso da União Soviética, em 1991, que fez com que, gradualmente, as atenções estadunidenses se voltassem para a Ásia.

2 Forças Navais Norte-Americanas no Japão

As principais embarcações norte-americanas no Japão incluem, em regra, 1 Porta-Aviões Nuclear da Classe Nimitz (CVN); 3 Cruzadores Porta-Mísseis com Helicópteros da Classe Ticonderoga Aegis Baseline 5/6/8/9 C2 (CGHM); 2 Destroieres Porta-Mísseis com Helicópteros da Classe Arleigh Burke (Flight IIA) Aegis Baseline 6/7 C2 (DDGHM); 7 Destroieres Porta-Mísseis da Classe Arleigh Burke (Flight I) Aegis Baseline 5/9 C2 (DDGM); 1 Navio Anfíbio de Comando da Classe Blue Ridge (LCC); 4 Navios Caça-Minas Oceânico da Classe Avenger (MCO); 1 Porta Helicóptero da Classe San Antonio (LPD); 2 Navios de Assalto com Helicóptero da Classe Harpers Ferry (LSD); e 1 Navio de Assalto Anfíbio da Classe Wasp (LHD).

3 Aeronaves Militares Estadunidenses Estacionadas no Japão

Na base aérea de Misawa encontram-se estacionados dois esquadrões de caças F-16C/D Falcon (22 unidades), enquanto na base aérea de Yokota situa-se uma ala de aviões de transporte com 10 C-130H Hercules e 3 Beech 1900C.

Já a base aérea  de Kadena (quartel-general da 5° Força Aérea) conta com dois esquadrões de caças F-15C/D Eagle (27 unidades), um esquadrão de caças F-35A Lightining de 5ª Geração (12 unidades), um esquadrão de aviões-tanque KC-135R Stratotanker (15 unidades), um esquadrão de aviões de alerta antecipado e comando (AEWC) com 2 E-3B/C Sentry, um esquadrão de combate, busca e salvamento (CSAR) com 10 helicópteros HH-60C Pavehawk, além de um grupo de operações especiais, contando com um esquadrão de MC-130H Combat Talon (5 unidades), um esquadrão de MC-130J Commando II (5 unidades), dois esquadrões de inteligência, reconhecimento e vigilância (ISR), o primeiro com algumas unidades do RC-135 Rivet Joint e o segundo com 5 unidades do drone RQ-4A Global Hawk.

4 Força Naval de Autodefesa do Japão

A Força de Autodefesa do Japão conta com 47 principais Navios de Superfície, incluindo 4 Porta-Helicópteros (CVH), – sendo 2 da Classe Hyuga (equipados com até 10 helicópteros SH-60 Seahawk) e 2 da Classe Izumo (carregados com até 12 helicópteros SH-60 Seahawk) –; 2 Cruzadores Porta-Mísseis com Helicóptero (CGHM) de Classe Atago (Aegis Baseline 7 C2); 26 Destroiers Porta-Mísseis com Helicóptero (DDGHM), – incluindo 8 Asagiri, 4 Akizuki, 9 Murasame, 5 Takanami (Murasame aperfeiçoado) –, 6 Destroiers Porta-Mísseis (DDGM), sendo 2 da Classe Hatakaze e 4 Kongov (AEGIS- Baseline 4/5 C2); 3 Fragatas Porta-Mísseis com Helicóptero (FFGHM) da Classe Hatsuyuki e 6 Fragatas da Classe Abukuma; além de 3 Navios de Assalto Anfíbio (LHD) da Classe Osumi.

Possui, ainda, 74 aeronaves de patrulha antissubmarino (12 P-1 e 62 P-3C ORION); 5 aeronaves de inteligência eletrônica (ELINT) EP-3C Orion, além de 87 helicópteros antissubmarino (ASW) SH-60B (35 unidades) e SH-60K (52 unidades).

5 Força de Submarinos do Japão

Dentre as inúmeras lições aprendidas pelo Japão após a Segunda Guerra Mundial, é possível destacar a de: “jamais permitir qualquer forma de bloqueio naval”, considerando a particular configuração territorial insular japonesa.

Quando os japoneses atacaram diversas bases e territórios norte-americanos no Oceano Pacífico (incluindo Filipinas e a base de Guam) e, especialmente, Pearl Harbor, no dia 7 de dezembro de 1941, alterando a opinião pública estadunidense, – até então majoritariamente (mais de 70% da população) contra o ingresso dos EUA em uma “guerra europeia e asiática” –, e compelindo (com o inflamado discurso do seu Presidente ROOSEVELT) os Estados Unidos a se lançar naquele Conflito Mundial, a marinha japonesa era considerada a segunda maior armada do mundo, se encontrando (comparativamente) apenas em desvantagem em relação à Marinha Real Britânica.


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Marinheiros da Naval Air Station Kaneohe tentam salvar um PBY Catalina após o ataque japonês a Pearl Harbor (Imagem: História Licenciatura, http://hid0141.blogspot.com/2017/09/ataque-em-pearl-harbor-em-fotos-1941.html).

O ataque “surpresa” (pelo menos no que concerne ao alvo principal – a base naval de Pearl Harbor –, uma vez que já era esperada uma reação militar japonesa em resposta as duras sanções econômicas aplicadas pelos EUA), no final do ano de 1941, que colocou em definitivo os EUA na guerra, alterou todos os objetivos industriais do país, que passou a ter a maior parte de sua produção orientada (exclusivamente) para o esforço de guerra, através de um programa de reconstrução de seu poderio militar e de amplo apoio bélico (e econômico) a seus aliados, no contexto do conflito, que se tornava, desta feita, verdadeiramente mundial. Esse processo teve como resultado, dentre outros, a elevação, à primeira colocação mundial, da marinha norte-americana, no curtíssimo intervalo temporal de apenas dois anos.

A estratégia naval estadunidense no Pacífico foi, sobretudo, a de construir uma inédita capacidade de efetivar um bloqueio naval, que consistia, sobretudo, no ataque (e interdição) às linhas japonesas de suprimentos que abasteciam as forças armadas daquela nação, viabilizando suas respectivas conquistas territoriais no Pacífico. Essa estratégia de ação foi, pouco a pouco, enfraquecendo as defesas japonesas, especialmente nas áreas periféricas de seu império, o que proporcionou o rápido (e consistente) avanço americano de ilha em ilha.

O Japão era à época (como ainda continua a ser) um país com pouquíssimos recursos naturais, além de não possuírem recursos energéticos vitais (como petróleo e gás natural) e terras aráveis suficientes para a subsistência populacional. Sendo assim, o bloqueio naval norte-americano, foi o fator derradeiro, – dentro da seara de sua estratégia estabelecida, – que acelerou e facilitou a vitória estadunidense na Guerra do Pacífico.

Com o final da Segunda Guerra Mundial, – e em decorrência das lições aprendidas com a mesma –, as intituladas Forças de Autodefesa Japonesas (uma vez que, constitucionalmente, ao Japão foi imposta uma total proibição de possuir Forças Armadas Plenas), passaram a ter como objetivo primordial evitar que a mesma estratégia naval fosse novamente aplicada contra o seu arquipélago, o que restou implantado, – particularmente em face do destacado crescimento naval de forças de superfície ofensivas por parte da China –, nas últimas décadas, através do desenvolvimento de uma extremamente moderna e eficiente força de submarinos.

Como primeiro resultado desse investimento japonês, destaca-se, já na primeira década do século XXI, os submersíveis da classe Soryu, que se constituem na evolução natural da classe Oyashio (1990) que conta com 11 embarcações em operação atualmente (sendo duas destacadas para treinamento de tripulações).

O primeiro submarino de nova classe foi comissionado no ano de 2009 e, ao longo de nove anos, o número de submarinos que correspondem à esquadra nipônica foi gradualmente ampliado até o total de nove embarcações (com o comissionamento de uma unidade por ano), revelando um grandioso esforço da indústria naval japonesa, com o objetivo último de fazer frente aos desafios navais chineses, com sua crescente força de navios de superfície, incluindo dois porta-aviões e uma terceira unidade (nuclear) em inicio de desenvolvimento.


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Submarino japonês classe Soryu (Imagem: r/WarshipPorn, u/mojave955)

As embarcações da classe Soryu receberam grande destaque por força de sua grande automatização, com o emprego de computadores extremamente avançados, o que resultou em uma tripulação de número reduzido, contando com apenas 65 membros. Dentre os detalhes técnicos dos submarinos, vale ressaltar seu comprimento de 84 metros; deslocamento de três mil toneladas à superfície e quatro mil e quatrocentas quando submergido; velocidade de 13 nós à superfície (aproximadamente 24 km/h) e 20 nós quando submergido (cerca de 37 km/h); e propulsão através de motores diesel-elétricos confeccionados pela Kawasaki de modelo Stirling, que, de forma inovadora,  independem de oxigênio para funcionar, constituindo-se, na atualidade em uma característica extremamente positiva para os submarinos não nucleares.

Vale lembrar que os submarinos nucleares podem permanecer longas semanas ou meses em estado de submersão, ao passo que os de propulsão diesel-elétrico precisam, de dias em dias, voltar a pelo menos a profundidade de snorkel para ligar os motores a diesel (que funcionam a base de oxigênio) que tem como função recarregar as baterias que fazem funcionar os motores elétricos de propulsão.

Com a introdução dos motores Stirling o tempo que antes era marcado por dias para a emersão, passou a ser de semanas, deslocando-se a velocidade de seis nós. Outra importante característica agregada a esses submarinos é o fato deles serem extremamente silenciosos, posto que essa forma de geração de energia não gera ruídos. E, buscando aumentar ainda mais a imperceptibilidade, os mesmos também são recobertos com uma camada de polímeros que absorvem as ondas de sonar. Em incremento a sua capacidade combativa, contam ainda com sonares extremamente precisos e sensores passivos para detecção de presença inimiga, sem denunciar a sua própria localização.

No que cerne ao seu poder de ataque, os submarinos contam com seis tubos de torpedos que podem lançar mísseis norte-americano do tipo UGM-85 Harpoon (antinavio), além de minas. Em se tratando de contramedidas, contam com lançadores de dispositivo acústicos, que são extremamente efetivas para o desvio de torpedos guiados por sonar.

Atualmente existem nove submarinos da classe Soryu, tendo sido o Seiryu o nono submarino comissionado pela força naval de autodefesa do Japão, no ano de 2018, estando ainda outros quatro em fases de produção distintas. Cada nova unidade possui um custo aproximado de 500 a 600 milhões de dólares.

E, apesar da destacada qualidade dos motores da classe Soryu, o Japão encontra-se desenvolvendo uma atualização em sua tecnologia de propulsão, preparando-se para a substituição dos motores stirling por baterias de lítio, capazes de manter uma carga maior por mais tempo, tornando, ainda mais eficientes os seus submarinos.

6 Força Aérea de Autodefesa do Japão

A Força Aérea de Autodefesa do Japão possui, ainda, 1 aeronave Kawasaki EC-9 e 2 YS-11EB (de guerra eletrônica/EW); 13 RF-4EJ Phantom II e 4 YS-11EB de reconhecimento e vigilância (ISR); 13 E-2C Hawkeye e 4 E-767 de alerta antecipado e controle (AEW); 6 aviões-tanques (2 KC-130H e 4 KC-767J), além de 57 aeronaves de transporte (13 C-130H Hercules; 3 C-2; 2 B-747-400; 13 Beech T-400; 19 C-1 e 5 Gulf Stream IV).


Principais Referências Bibliográficas:

  • RONALD DOLAN e ROBERT WORDEN; Japan: a Country Study. 5th ed. Washington, D.C. 1992 (Disponível em: https://www.loc.gov/item/91029874/. Acessado em: 21 de Junho de 2018).
  • BBC NEWS; Japan Creates Defense Ministry (Disponível em: http://news.bbc.co.uk/ 2/hi/asia-pacific/6182087.stm. Consultado em:  21 de junho de 2018).
  • The Military Balance 2018; International Institute for Strategic (IISS) Routledge Studies, Londres, 2018.

*REIS FRIEDE é Desembargador Federal; Professor Emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) e Professor Honoris Causa da Escola de Comando e Estado-Maior da Aeronáutica (ECEMAR). Site: https://reisfriede.wordpress.com/. E-mail: reisfriede@hotmail.com.

**CATARINA COSTA é Assistente de Pesquisa e Graduanda de Licenciatura em História pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: costa.catarina@outlook.com.


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4 comentários

  1. Ótima análise histórico/militar das forças de defesa do Japão, parabéns aos escritores.

  2. Impressionante a qualidade editorial da matéria, sensacional a análise da força de submarinos japonesa, em especial a classe Soryu e sua propulsão com motores de ciclo stirling!

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