O interesse militar em destruir infraestruturas de energia

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Equipes ucranianas combatem um incêndio depois que um foguete atingiu um objetivo de infraestrutura elétrica em Kharkov, na Ucrânia (Sergey Kozlov/EPA-EFE).

Por Olivier Dujardin*

Equipes ucranianas combatem um incêndio depois que um foguete atingiu um objetivo de infraestrutura elétrica em Kharkov, na Ucrânia (Sergey Kozlov/EPA-EFE).

Sem entrar em considerações morais ou jurídicas, os ataques russos à infraestrutura energética ucraniana atendem a objetivos militares, portanto, o mais provável é que continuarão enquanto durar a guerra.


Por várias semanas, as forças russas vêm atacando intensamente a infraestrutura de energia da Ucrânia. Até o momento, de acordo com declarações oficiais de Kiev, 50% da rede elétrica ucraniana está fora de serviço. No entanto, se a mídia ocidental está principalmente interessada nas consequências para os civis, não se deve esquecer que isso também, e acima de tudo, apresenta um importante interesse militar para o exército russo. A questão aqui não é se essa destruição pode ou não ser considerada como “crime de guerra”. Não sou jurista e não possuo a resposta a esta pergunta. O objetivo aqui é simplesmente expor as vantagens militares que isso oferece à Rússia.

Interrupção logística ucraniana

A logística ucraniana, assim como a dos russos, depende enormemente da rede ferroviária. Cerca de metade desta rede é eletrificada e, para além de a destruição penalizar fortemente o uso de locomotivas elétricas, sobretudo perturba muito fortemente a gestão da rede (controle de comutadores, sinalização, passagens de nível, etc.) e o impacto no tráfego é, portanto, muito significativo. Embora o governo ucraniano não informe sobre as consequências dos ataques russos no volume geral do tráfego, o que é lógico, sem dúvida isso o atrapalha fortemente.

A destruição de infraestruturas elétricas afeta gravemente outro elemento essencial ao funcionamento de um Estado: o serviço de comunicações. Sem eletricidade, acabou-se o telefone fixo ou móvel, acabou-se a internet, acabou-se o e-mail, etc. Nessas condições, a transmissão de ordens, a organização dos fluxos logísticos e o reporte de informações são interrompidos. Claro que podemos assumir que os serviços essenciais do Estado são dotados de geradores de forma a permitir o seu funcionamento, mas para comunicar são necessárias pelo menos duas pessoas, e se o(s) destinatário(s) estiver(em) privado(s) de energia nesse momento, a conexão não será feita.

Interrupção das operações militares ucranianas

A interrupção do fornecimento de energia também tem um impacto significativo para as tropas na frente de batalha. As forças ucranianas são muito dependentes de redes telefônicas civis e, embora possam contar com a rede de comunicação por satélite Starlink, os terminais também precisam de eletricidade para operar; da mesma forma, as baterias de drones, rádios PMR (walkie-talkie), laptops, etc. devem ser recarregadas. Obviamente, pode-se pensar que as forças ucranianas têm geradores, mas é improvável que haja o suficiente para todos. Além disso, um gerador requer combustível, que não estará disponível para os veículos. Gera-se assim um fluxo logístico adicional que por si só será mais difícil de concretizar pelas razões expostas no parágrafo anterior.

Consequências para a população civil

A falta de energia tem consequências muito negativas na vida dos civis. Os nossos meios de comunicação noticiam amplamente: problemas relacionados com o frio, a falta de água potável (as estações de tratamento funcionam com eletricidade) e o impacto no abastecimento de alimentos. O Estado ucraniano deve, portanto, providenciar o mais urgente para garantir o mínimo de assistência às populações. No entanto, esse fardo adicional pesa muito em uma cadeia de suprimentos já tensa. Isso, portanto, obriga o governo a desviar parte de seus recursos humanos e materiais para socorrer a população. Recursos que então não estarão disponíveis para a frente de batalha.


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Considerações finais

Nossas sociedades são extremamente dependentes de energia e a tecnologia está aumentando ainda mais essa dependência. Ao atacar a infraestrutura de energia do país, a Rússia está se certificando de interromper profundamente a ferramenta militar ucraniana. Se não podemos excluir o desejo de “punir” e pressionar a população ucraniana desta forma, é improvável que este seja o principal motivo desta campanha de ataques.

A única questão real é: por que agora? Durante o ataque da OTAN ao Kosovo em 1999 e a invasão do Iraque em 2003, a infraestrutura de energia foi destruída em 70% e 80%, respectivamente, nas primeiras 24 horas do conflito, a fim de interromper o máximo possível as forças oponentes. Isso está de acordo com a ideia de que a operação militar lançada em 24 de fevereiro deveria, nas mentes das autoridades russas, ser muito curta e impactar o mínimo possível em uma população civil que recebe as tropas russas…

Parece que a Rússia agora adotou o longo prazo e está tentando ganhar tempo para reorganizar suas próprias forças, que foram maltratadas pelo exército ucraniano. Pode-se também questionar o fato de que, por enquanto, as pontes sobre o Dnieper foram poupadas quando, como acontece com a infraestrutura elétrica, as pontes geralmente estão entre os primeiros alvos de uma guerra, ao lado dos centros de comando e das principais bases militares. A Rússia, no entanto, dispõe de amplos meios e podemos assumir que mantém essa possibilidade em reserva.

Para além da dimensão moral ou jurídica que se pode atribuir a estes ataques, eles respondem bem a objetivos militares cujos efeitos sobre o exército ucraniano são hoje essenciais para a Rússia. Portanto, é provável que esta campanha contra a infraestrutura de energia continue enquanto durar esta guerra.


Publicado no Centre Français de Recherche sur le Renseignement (Cf2R).


*Olivier Dujardin tem 20 anos de experiência em guerra eletrônica e processamento de sinais de radar. Exerceu sucessivamente funções operacionais em guerra eletrônica, no estudo de sistemas de radar e guerra eletrônica, e na análise e coleta de sinais. Ele também atuou como especialista técnico em sistemas de coleta de dados.

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