O afundamento do cruzador russo “Moscou” com forte simbolismo por levar o nome da capital da Rússia, vem sendo muito bem aproveitado pelos ucranianos, alavancando o esforço de guerra do país.
Na última semana de fevereiro, quando entrei na Ucrânia para acompanhar o conflito em andamento, passei a ver a frase “Російський військовий корабель, до біса!” em vários lugares, o que me chamou atenção. Depois do terceiro dia, resolvi perguntar ao guia ucraniano qual era o significado. Ele contou a história do grupo de combate de fuzileiros navais ucranianos que ocupava a ilha Zmeiny (das Cobras).
Essa tropa teria sido arrasada pelo fogo naval do cruzador russo Москва (Moscou), após responder com essa frase ao incitamento à rendição, cujo significado é “Navio de guerra russo, foda-se”. Entretanto, posteriormente, surgiu outra versão de que os militares da ilha teriam sido capturados pelos russos e libertados em uma troca de prisioneiros. Roman Hrybov, o suposto combatente autor da frase, também teria sido condecorado pelo presidente ucraniano Volodymyr Zelensky.
A verdade é que a frase passou a ser uma espécie de mantra ucraniano contra o ocupante russo. Ao conversar com os ucranianos, fiquei com a impressão de que é uma forma de catarse coletiva após todas as atrocidades a que foram submetidos pelos russos. A Ucrânia foi subjugada a uma dominação forçada por séculos, inicialmente pelo Império Russo e depois, pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
Na semana passada, foi divulgado o lançamento de um selo comemorativo na Ucrânia referente ao alegado bombardeamento do cruzador Москва. Esse novo selo postal de tempo de guerra foi apresentado pela agência de correios da Ucrânia. A imagem retrata um fuzileiro naval ucraniano na ilha de Zmeiny fazendo um gesto hostil, mostrando o dedo médio da mão direita e, ao fundo, no mar, o Москва, nau capitânia da frota russa no Mar Negro. Esse navio teria sido afundado em Sebastopol em 14 de abril de 2022 após um bombardeamento. O evento empolgou os ucranianos, que formaram longas filas nas agências postais para adquirir o selo.
Segundo o filatelista brasileiro Fábio Pereira Ribeiro, esse evento atípico está sendo criticado por alguns segmentos de colecionadores. Isso porque não segue alguns dos padrões vigentes em relação à característica cultural e artística estabelecidos pela União Postal Universal, que congrega todos os países que emitem selos.
Entretanto, é necessário lembrar que em tempos de beligerância, as ações dos Estados passam a ser canalizadas para seu esforço de guerra. Nesse caso, o governo da Ucrânia decidiu aproveitar o fato como peça de propaganda para manter a população e as tropas com moral elevado. Devido ao cunho provocativo, estima-se que o selo deverá circular em vários países. Por causa da elevada procura, há reclamações de que já existe uma espécie de mercado negro em que o selo estaria sendo vendido por valores bem mais altos do que o pago nas agências postais ucranianas. Essa demanda provocou várias solicitações de que o selo seja vendido online.
Pela primeira vez na história, estamos vendo na Ucrânia uma fila para comprar um selo maior do que a fila para comprar um iPhone. Com isso, o governo daquele país espera arrecadar mais recursos para financiar o esforço de guerra. Em consequência do sucesso nas vendas, imagina-se que possa haver mais de uma edição do mesmo selo. O suposto ataque ao navio russo está sendo muito bem aproveitado pelos ucranianos na guerra informacional. Certamente, isso foi alavancado porque a embarcação possui o mesmo nome da capital da Rússia, o que confere forte simbolismo ao evento.
Publicado na CNN Portugal.
Excelente e esclarecedor artigo ! Sou filatelista também e interesso-me em comprar esse selo, tanto pelo simbolismo como pelo apoio a esse pais que sofre dura e covarde invasão !