O abalroamento do USS Porter

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Carlos Norberto Stumpf Bento.png Por Carlos Norberto Stumpf Bento*

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O USS Porter navegando pelo Bósforo em 8 de agosto de 2019 (Foto: Yoeruek Isik/Stars and Stripes).

“O preço da segurança é a eterna vigilância”. Frase padrão impressa próximo à assinatura do livro de Ordens Noturnas do Comandante do USS Porter.


Em 12 de agosto de 2012, sete meses após o emblemático acidente com o Navio de Passageiros Costa Concordia, que colidiu com o fundo em uma ilha ao largo da costa italiana, o Contratorpedeiro (CT) USS Porter envolveu-se em um abalroamento[1] com um Navio Tanque (NT) próximo ao Estreito de Ormuz no Golfo Pérsico.

Ao analisar os dois acidentes, percebe-se que ambos são exemplos claros de que os conceitos de e-navigation e de Gerenciamento das Equipes do Passadiço (BTM – Bridge Team Management) não têm sido adequadamente aplicados na navegação aquaviária. O conceito de e-navigation foca na integração de ferramentas de navegação existentes, em particular as eletrônicas, em um sistema abrangente que contribuirá para aprimorar a segurança da navegação. Já o conceito de BTM, que já existe há muitos anos, visa à integração de todo o pessoal que guarnece os passadiços das mais diversas embarcações, sendo fundamentado em técnicas de organização, liderança e trabalho em equipe. O livro Navegação Integrada, em referência, aborda a importância de o navegante saber como e quando utilizar as modernas ferramentas de navegação atualmente disponíveis, as quais o auxiliam na condução de sua embarcação por águas seguras e no acompanhamento adequado do tráfego de embarcações, contribuindo significativamente para evitar colisões com o fundo e abalroamentos, respectivamente. Ademais, ressalta a importância do gerenciamento das equipes de passadiço.

Em seu Capítulo 4, onde são analisadas as principais causas de ocorrência de acidentes aquaviários, a saber: fatores ambientais; explosão ou incêndio a bordo; colisão com o fundo; e abalroamentos, é constatado que as duas últimas causas geralmente estão associadas à não aplicação dos conceitos mencionados, como foi o caso do Costa Concordia, que concorreram para a sua colisão com o fundo.

O presente artigo pretende evidenciar as falhas na aplicação desses conceitos no episódio envolvendo o USS Porter, que culminaram no seu abalroamento por um Navio Tanque.

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Apesar de não ter o intuito de provar a ocorrência de falhas ou fazer qualquer tipo de julgamento dos envolvidos no acidente, é importante colher alguns ensinamentos daquele episódio por meio de suposições, informações extraoficiais disponíveis na internet e pela análise do áudio do passadiço obtido do VDR[2] do CT e de dados AIS (Sistema de Identificação Automático – Automatic Identification System) também disponíveis na Internet.

Sequência de eventos

O USS Porter possivelmente evitava trafegar próximo ao mar territorial iraniano, região de grande tensão, onde em 2010 um navio anfíbio foi abalroado por um submarino nuclear, ambos estadunidenses, e onde já houve incidentes envolvendo embarcações iranianas, minas e até o abate de um Airbus, em 1988.

O navio saía da faixa de tráfego norte de um Esquema de Separação de Tráfego (TSS – Traffic Separation Scheme) e demandava a rota mais ao sul, contrária ao fluxo de navios que demandavam a faixa de tráfego sul do TSS, assumindo o rumo 230° com velocidade desconhecida (Figura 1). A Equipe do Passadiço era composta pelo Comandante, pelo Oficial de Quarto, pelo Oficial de Manobra e pelo Timoneiro, além da equipe de navegação[3].

O Comandante havia se ausentado do passadiço visando resolver alguns afazeres não relacionados com a navegação.

Os Oficiais no passadiço então se deparam com a luz de bombordo do Navio Tanque (NT) Shat Al Alab pela sua bochecha de bombordo (Figura 2)[4], com velocidade de 10,5 nós.

Como o contratorpedeiro aproxima-se muito do NT, o Oficial de Manobra determina aumentar a velocidade para “toda força adiante” visando safar logo a popa do mercante, já tendo em mente guinar em seguida, acentuadamente para bombordo, reassumindo o rumo base 230°.

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Figura 1.

Não se sabe se o CT guinou um pouco para boreste a fim de evitar uma maior aproximação com o NT. Provavelmente, devido à situação de perigo gerada, o Comandante é chamado ao passadiço. Ao chegar ao compartimento e constatar ruído excessivo, ele determina “Silêncio no passadiço!”. Desse evento em diante, a gravação do áudio do Passadiço é disponibilizada de acordo com a Lei sobre Liberdade de Informação (Freedom of Information Act) dos EUA.

Nesse momento, outro Navio Tanque, o NT Otowasan (totalmente carregado), a uma distância aproximada de cinco milhas náuticas pela proa e a uma velocidade de 14 nós, percebia o USS Porter em uma situação de “roda a roda” e iniciava uma guinada para boreste (Figura 3), prevista no RIPEAM[5], visando passar “bombordo com bombordo” com o CT, sem saber das intenções desse de guinar para bombordo.

O Comandante do Porter, também desconhecendo as intenções do Oficial de Manobra e a situação em relação ao Otowasan, determina ao Oficial de Quarto “leme a meio”. O comando de leme é passado para o Oficial de Manobra, quando este já estava comandando ao Timoneiro “todo leme a bombordo”. O Comandante questiona o porquê da manobra e a intensidade da guinada já que o NT Shat Al Alab já havia passado. O Oficial de Quarto responde que estava se livrando da popa do NT e reassumindo o rumo base 230°. Em seguida o Oficial de Manobra determina ao Timoneiro “governar no rumo 230°”, e o Timoneiro o atende. O Oficial de Quarto comenta: “OK. Vamos voltar ao nosso rumo base”. O Comandante diz que não importa o rumo base, mas sim fazer com que o navio cruze o tráfego.

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Figura 2.

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Figura 3.

O Oficial de Quarto determina então ao Timoneiro “leme a meio” (sem rumos a seguir) e informa ao Comandante que tem outro Navio Mercante pela bochecha de boreste. O Timoneiro informa que a proa já está em 210°. Nesse momento o Oficial de Manobra participa ao Comandante que está avistando uma luz encarnada e solicita autorização para guinar para “boreste 250°” para passar bombordo com bombordo com o NT.

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Figura 4.

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Figura 5.

Nessa fase crítica (Figura 4), o Comandante pergunta: “passar quem?”, e o Oficial de Quarto responde: “esse cara bem aqui!”. Em seguida o Comandante questiona por que haviam aumentado a velocidade para “toda a força”, e o Oficial de Quarto responde que também era para ajudar a se livrar da popa do Shat Al Alab, determinando reduzir a velocidade para 5 nós.

Como provavelmente o CT estava navegando em formatura, seguem-se diálogos sobre a necessidade de informar a situação a outro navio, possivelmente o navio do OCT (Oficial de Comando Tático) ou simplesmente outro navio que fazia parte do seu Grupo-Tarefa.

O timoneiro informa que está com a proa em 230°. O Comandante começa a orientar o Oficial de Quarto para não usar novamente a máxima velocidade, pois entende que não é daquela forma que se diminui o problema. O Oficial de Quarto dá o ciente, mas avalia que o NT está com aspecto de bombordo e que é necessário agir com rapidez.

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Figura 6.

O Comandante avalia a situação e determina em sequência: “todo o leme a bombordo (20 graus?)”; “todo o leme a bombordo em emergência (30 graus)”; e soar cinco apitos curtos[6].

O Timoneiro informa que está com a proa em 180° e, quando o Oficial de Manobra verifica que está em 170°, este sugere ao Comandante continuar nesta proa. O Comandante concorda e o Oficial de Quarto determina ao Timoneiro seguir o rumo 170°. Imediatamente o Comandante visualiza uma situação que o faz gritar “máquinas adiante toda a força em emergência e soar novamente cinco apitos curtos!”. Em seguida determina ao Timoneiro “todo o leme a bombordo”, quando há o choque (Figura 5) e são ouvidos, no passadiço, gritos (de desconhecidos): “Segurem-se! Preparar para a colisão! Meu Deus! Você está bem? Soar o alarme de colisão!”.

O Oficial de Quarto pergunta ao Contramestre se todo mundo está bem. O Comandante determina parar máquinas e o Oficial de Quarto manda tocar Postos de Combate.

Provavelmente, devido à grande inércia do NT, principalmente por estar navegando carregado, não houve redução significativa de velocidade. O NT atingiu, com a parte em ângulo de sua roda de proa, o CT na altura do convés do CIWS[7].

A grande diferença de calado entre os dois navios evitou que o bulbo de proa do NT atingisse as obras vivas do Porter, o que poderia ter consequências mais sérias (Figura 6). O acidente não teve vítimas em nenhum dos navios envolvidos.

E-Navigation

O relatório final do acidente com o Costa Concordia ressalta que o navio não dispunha de carta de grande escala da ilha exibindo a pedra com a qual o navio colidiu. O livro Navegação Integrada ressalta que, no episódio com o Costa Concordia, o Comandante dispensou modernas ferramentas que poderiam ajudar a evitar a colisão com o fundo. Apesar de só ser obrigatório o uso de um ECDIS (Sistema de Exibição de Cartas Eletrônicas – Electronic Chart Display System) por aquele tipo de navio a partir de 2014, tal equipamento já existia a bordo e havia pessoal qualificado na sua operação. Essa ferramenta de navegação, que permite integrar todas as ferramentas de navegação do passadiço, possibilitaria exibir em detalhes a pedra; soar com a antecedência necessária alarmes em relação à aproximação daquele perigo; e até plotar a posição futura do navio a partir de dados de rumo, velocidade e ângulos de leme. Contudo, o seu uso foi negligenciado.

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Contratorpedeiro Classe “Arleigh Burke”.

Da mesma forma, existiam a bordo do NT Otowasan e do USS Porter modernas ferramentas de acompanhamento automático de embarcações, tais como o Radar dotado de ARPA (Automatic Radar Plotting Aid – Auxílio de Plotagem Automática Radar) e o AIS (Automatic Information System – Sistema de Identificação Automático), baseado na transmissão de dados via VHF entre embarcações.

Possivelmente o Radar/ARPA do NT Otowasan disparou um alarme de COLISÃO (Threat – Ameaça) em relação ao USS Porter, que por possuir geometria furtiva (stealth) deve ter aparecido na tela radar do NT como uma pequena embarcação. Como navios de guerra não são obrigados a transmitir os sinais AIS, operando o mesmo em passivo, o NT pode ter inferido que o pequeno eco radar tratava-se de uma pequena embarcação sem AIS, ou mesmo de um navio de guerra caso o tenha observado com aspecto de estar fazendo parte de uma formatura naval. O desconhecimento das condições atmosféricas no local não permite garantir que o NT tenha avistado as luzes de bordo do CT antes de guinar para boreste.

Já no USS Porter, pela análise do áudio do passadiço, não há nenhum indício de que alguém tenha percebido a guinada do NT ou que algum alarme de ameaça ou colisão tenha sido acionado pelo Radar/ARPA e/ou pelo AIS em relação a ele. E tais alarmes geralmente são configurados para serem emitidos de forma sonora, somente sendo interrompidos por ação do operador. O AIS também é capaz de exibir a derrota percorrida de qualquer alvo e até a derrota planejada, caso seja inserida no sistema. Além disso, tais belonaves possuem em seus CIC (Centros de Informação de Combate) sensores eletromagnéticos e acústicos incomparáveis na detecção de qualquer tipo de ameaça aérea, submarina ou de superfície.

Gerenciamento da Equipe do Passadiço

Conforme é ressaltado no capítulo 4 do livro Navegação Integrada, um acidente raramente é fruto de um único evento, mas de uma série deles que formam uma cadeia de erros. Geralmente essa cadeia é formada por eventos do tipo: má configuração de equipamentos, confusão de identificação, erros de cálculo, informação mal interpretada ou por mal-entendidos, sendo agravada por um eventual despreparo do pessoal.

Somente aquele Oficial no passadiço que mantém permanentemente a “consciência situacional”, ou seja, que sabe o que está ocorrendo a bordo e no entorno do navio e está alerta para perceber sinais que indiquem uma tendência a criar uma cadeia de erros, pode tomar uma atitude para interrompê-la. Muitas vezes a percepção de um desses sinais não indica necessariamente que um acidente está prestes a ocorrer, mas apenas que a navegação não está sendo conduzida adequadamente ou como planejado, podendo a “consciência situacional” ser degradada, comprometendo desnecessariamente a segurança da navegação.

Geralmente existem alguns sinais que, caso não sejam percebidos e interrompidos, podem levar ao desenvolvimento de uma cadeia de erros. A tabela a seguir, constante do livro Navegação Integrada (adaptada da obra Bridge Team Management), mostra alguns exemplos de sinais típicos que podem contribuir indesejavelmente para essa situação.

O Capítulo 4 do livro Navegação Integrada faz uma análise do caso Costa Concordia à luz do Gerenciamento da Equipe do Passadiço e conclui que erros dos tipos 1c), 1d), 2b), 6 e 7 formaram a cadeia de erros naquele episódio. O relatório final do acidente também aponta interpretações de ordens de leme erradas por parte do Timoneiro (erro 4) e a falta de empenho da equipe do passadiço por não ter sido suficientemente enfática em alertar o Comandante sobre a situação de perigo.

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Sinais típicos de desenvolvimento de uma cadeia de erros.

Analisando o caso USS Porter, podemos também constatar os seguintes sinais que, por não terem sido interrompidos, formaram uma forte cadeia de erros que culminaram no abalroamento.

Erro 1c) O Comandante discordou da manobra e da velocidade adotadas pelos Oficiais de serviço no passadiço, sem ter a “consciência situacional” em relação às intenções dos Oficiais, à velocidade do próprio navio, e à presença ameaçadora do NT Otowasan.

Erro 1d) O Comandante, como é recomendado em situações críticas, deveria ter assumido imediatamente a manobra e não apenas ter se limitado a interferir na manobra dos Oficiais de serviço no passadiço.

Erro 1e) Os Oficiais de serviço no passadiço não conseguiram passar rapidamente ao Comandante as suas intenções de manobra e a situação em relação ao NT Otowasan, nem foram suficientemente enfáticos em suas percepções em relação à ameaça do NT. O BTM recomenda que se procure evitar que o risco do erro de um único indivíduo possa resultar em uma situação de catástrofe. Também recomenda deixar claro em que situações se deve “chamar o Comandante ao passadiço”.

Erro 1f) Ninguém no passadiço percebeu que o NT Otowasan já havia guinado para boreste bem antes de o Comandante chegar ao passadiço, o que poderia ter sido facilmente constatado por meio da identificação de suas luzes de navegação, ou por meio do Radar/ARPA, ou pelo AIS, que, como já mencionado anteriormente, possuem eficientes alarmes para tal propósito, caso adequadamente configurados.

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Erro 2a) Não existe registro de carga de trabalho excessiva, stress ou fadiga por parte dos Oficiais, mas sempre se deve levar em consideração que navegar à noite, possivelmente engajado em manobras militares, em uma região perigosa como o Golfo Pérsico, pode facilmente contribuir para a incidência desses fatores negativos.

Erro 2b) Segundo divulgado na mídia, o Comandante havia se ausentado do passadiço a fim de despachar relatórios de rotina, uma tarefa não relacionada com a segurança da navegação. Ao sair do TSS[8], o Comandante deveria ter em mente que cruzaria intenso tráfego no sentido contrário, evitando ausentar-se do passadiço, ainda mais navegando à noite e em formatura.

O Comandante não conseguiu recuperar a “consciência situacional” após seu regresso ao passadiço e desperdiçou um valioso tempo de reação ocupando-se, durante cerca de um minuto, em participar a redução de máquinas para o OCT e em advertir os Oficiais a respeito do uso das máquinas a toda força, procedimento que já poderia constar de suas ordens e recomendações. A página do seu livro de ordens noturnas para aquela noite estava em branco, mas havia uma frase padrão impressa próximo ao local destinado à assinatura do Comandante.

Erro 3) Quando o Comandante chegou ao passadiço, havia um excesso de ruído no compartimento, demonstrando certa confusão, agravada pelo fato de ele não ter efetivamente assumido a manobra.

Erro 4) É interessante constatar que, na primeira fala do Oficial de Manobra, ele comanda o bordo errado, corrigindo-o em seguida e, na última fala do Oficial de Quarto, este diz que o navio foi atingido por bombordo, quando na realidade o foi por boreste. Tal tipo de erro em relação aos bordos, caso não seja percebido a tempo e passado na forma de comando ao Timoneiro, pode rapidamente gerar ou agravar uma situação de perigo.

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Erro 5) Mesmo estando claro que a manobra sempre permaneceu com o Oficial de Manobra, o fato de o Comandante não a ter assumido naquele momento crítico, fez com que suas recomendações tivessem que passar pelo Oficial de Quarto e pelo Oficial de Manobra antes de chegarem ao Timoneiro. Da mesma forma, o Oficial de Quarto necessitava sugerir a manobra ao Comandante e obter autorização antes de agir. E uma situação dessas geralmente tende a se agravar em caso da presença do Prático no passadiço.

Erro 7) O USS Porter, ao contrário do NT Otowasan, não cumpriu o RIPEAM nem efetuou chamada VHF para combinar a manobra. Não se tem conhecimento se o USS Porter navegava em CONSET (Condição de Silêncio Eletrônico).

Conclusão

Podemos concluir que, se a ordem inicial do Comandante de manter o leme a meio tivesse sido dada a tempo, não haveria a colisão. Da mesma forma, caso o Oficial de Manobra mantivesse a velocidade máxima após a guinada, provavelmente cruzaria rapidamente a proa do NT. A perda da “consciência situacional” pelo Comandante; a sua interferência na manobra, sem efetivamente assumi-la; a redução drástica de velocidade, limitando a capacidade de manobra do navio; e a incapacidade da equipe do passadiço em perceber a guinada do NT e em participar ativamente das decisões do Comandante foram fatais.

A não utilização de modernas ferramentas de navegação e as diversas falhas no gerenciamento da equipe do passadiço do USS Porter criaram um paradoxo no qual um navio de guerra da marinha mais poderosa do planeta, concebido para evitar as mais diversas ameaças, incluindo o ataque por mísseis supersônicos a curta distância, não foi capaz de evitar ser atingido por um grande e lento petroleiro. 

Gravação do áudio do passadiço do USS Porter

Tradução: CC Marcus André de Souza e Silva e CT (USN) Charles Calhoun Todd.

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Bibliografia

BENTO, Carlos Norberto Stumpf. Navegação Integrada. Claudio Ventura Comunicação, Niterói, 2013. 200p. (http://www.e-nav.net).

BRASIL, Marinha do Brasil. RIPEAM-72: Convenção sobre o Regulamento Internacional para Evitar Abalroamento no Mar. (Tradução do COLREGs-72). Diretoria de Portos e Costas, Rio de Janeiro, 2011. 102p.

DEFENSE NEWS – Bridge audio from USS Porter’s Aug. 12 collision. Disponível em: http://www.defensenews.com/VideoNetwork/2372083607001/Bridge-audio-from-USS-Porter-s-Aug-12-collision.

SWIFT, A.J Captain; BAILEY, T.J Captain. Bridge Team Management: A Practical Guide. 2nd ed. England: The Nautical Institute, 2004. 111p.

Notas

[1] Abalroamento ou Abalroação – choque mecânico entre embarcações ou seus pertences e acessórios (NORMAM-09/DPC). Antigamente significava um choque intencional, já que os balros eram instrumentos ou aparelhos formados por um cabo amarrado a uma balroa (gancho, fateixa ou garatéia), utilizados para abordar uma embarcação inimiga e mantê-la a acostada durante o combate (Nota do autor).

[2] VDR – Gravador de dados de viagem (Voyage Data Recorder).

[3] Na U.S. Navy o Oficial de Quarto (OOD – Officer of the Deck) é um oficial que supervisiona o serviço do Oficial de Manobra (CONN – Conning Officer), que geralmente é o mais inexperiente.

[4] As figuras de 1 a 4 foram elaboradas com base em informações do AIS (Sistema de Identificação Automático) no dia 11/08/2012, outrora disponíveis em http://www.shipfinder.co. Os números que acompanham as posições dos navios envolvidos representam o minuto aproximado das mesmas. As posições do USS Porter foram deduzidas em virtude do mesmo, por ser um navio de guerra, operar o AIS em passivo.

[5] RIPEAM – Regulamento Internacional para Evitar Abalroamento no Mar.

[6] Regra 34 d) do RIPEAM – Quando várias embarcações à vista uma da outra se aproximarem, e por qualquer causa alguma delas não entender as ações ou intenções da outra, ou se tiver dúvida sobre se a outra estiver efetuando a manobra adequada para evitar a colisão, a embarcação em dúvida indicará imediatamente essa dúvida emitido pelo menos cinco apitos curtos e rápidos. Este sinal poderá ser complementado com um sinal luminoso de no mínimo de cinco lampejos curtos e rápidos.

[7] CIWS – Close-In Weapon System (Sistema Naval para Defesa de Ponto, concebido para defesa contra mísseis antinavio e aeronaves de ataque a curta distância).

[8] As regras para navegar em um TSS (Esquema de Separação de Tráfego), constam do Capítulo 3 do livro Navegação Integrada.

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*Carlos Norberto Stumpf Bento é Capitão de Mar e Guerra da reserva (RM1) da Marinha do Brasil. Guarda-marinha pelo Colégio Naval e pela Escola Naval, possui formação como Oficial de Estado Maior e Doutorado em Política e Estratégia Marítimas pela Escola de Guerra Naval e MBA em Gestão Internacional pelo COPPEAD/UFRJ. Entre suas diversas funções na Marinha, foi instrutor de Navegação no Navio-Escola “Brasil”, vice-diretor da Diretoria de Hidrografia e Navegação e Adido Naval junto à Embaixada do Brasil em Buenos Aires, Argentina.


 

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