Só o Brasil pode salvar a Amazônia

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Por Albert Caballé Marimón

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Vista aérea da floresta amazônica próxima a Manaus, em 19 de abril de 2011 (Foto: Neil Palmer/CIAT/Flickr)

No final de junho passado – após vinte anos de negociação –, o Mercosul e a União Europeia finalmente selaram um acordo de livre comércio entre os dois blocos, fato que foi amplamente noticiado. No início de agosto, o presidente Jair Bolsonaro demitiu o diretor do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) por divergir da forma com que foram divulgados dados sobre o desmatamento da Amazônia em 2019. Note-se que as informações sobre focos de incêndio, áreas afetadas e outros vem de diversos sistemas diferentes, e é necessária uma integração e uma análise antes de um parecer final. A divulgação de dados preliminares pode levar a distorções e interpretações diversas. Na sequência desse fato, passamos a assistir a um verdadeiro ataque midiático ao Brasil.

Em 1º de agosto passado, a revista The Economist publicou a matéria “Deathwatch for the Amazon”, “Velório pela Amazônia” em tradução livre, em que acusa o presidente Jair Bolsonaro de acelerar a destruição da Amazônia; no dia 5 de agosto, a revista Foreign Policy publicou a matéria “Who Will Save the Amazon (and How)?”, ou “Quem vai salvar a Amazônia (e como)?” – que, sugestivamente, originalmente se intitulava “Quem vai invadir o Brasil para salvar a Amazônia”, o que pode ser verificado pelo link da matéria.

Aponta-se que, no período entre janeiro e agosto, houve um aumento de 83% das queimadas em relação ao mesmo período de 2018, com mais de 72 mil focos de incêndios detectados. Como resultado da intensa campanha, gerou-se uma comoção mundial em relação ao fato. Na sequencia de acontecimentos, países como Noruega e Alemanha anunciaram a suspensão de recursos destinados à preservação da Amazônia.

Em seguida, diversas publicações e redes internacionais, amplamente apoiadas no país pela chamada “grande mídia” brasileira, impressa, online e televisiva, passaram a publicar matérias sobre o que seria a iminente e irreversível destruição da Amazônia pelas políticas ambientais de Bolsonaro.

Diversos absurdos vem sendo propagados nas redes sociais em milhões de postagens, incentivadas pelo alcance midiático de figuras públicas como governantes, artistas e celebridades. Numa enxurrada de postagens, todo tipo de disparate vem sendo propagado, coisas como “80% da Amazônia está sendo destruída”, muitas vezes com amparo de imagens de outros países, outras regiões, outras situações e mesmo outras épocas.

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O presidente francês, Emmanuel Macron, postou uma imagem da floresta amazônica em chamas – também usada em postagens por Leonardo Di Caprio e Giselle Bündchen – do fotógrafo americano Loren McIntyre, que nasceu em 1917, participou de expedições na Amazônia na década de 1970 e morreu em 2003. No post de Macron, ele afirma que “nossa casa” está em chamas, e conclama o G7 a discutir o tema – sem a presença de nenhum representante do Brasil ou de outros países da região –, no que foi apoiado por Angela Merkel, a chanceler alemã, e pelo premiê canadense, Justin Trudeau, que afirmou que os países do G7 devem “agir pela Amazônia”.

A Amazônia está sendo destruída?

De acordo com dados do SFB (Serviço Florestal Brasileiro), cerca de 61% do território do país é coberto por vegetação nativa nos diversos biomas, a Amazônia incluída (informação do MMA em https://www.mma.gov.br/florestas.html).

Apesar de ser um dos maiores produtores mundiais de alimentos, o Brasil tem forte atuação na preservação ambiental. De acordo com Evaristo de Miranda, chefe da Embrapa Gestão Territorial, a produção de grãos, fibras e agroenergia ocupa apenas 9% do território brasileiro (https://www.cnabrasil.org.br/artigos/vegetação-nativa-bem-protegida-por-produtores-brasileiros). Com um total de 20% preservados, os produtores rurais detém mais área de vegetação nativa preservada em suas propriedades do que todas as unidades de conservação somadas, que totalizam 13% do território.

Dados do CAR (Cadastro Ambiental Rural) mostram que os produtores brasileiros destinam mais áreas à preservação do que todas as unidades de conservação somadas. O Código Florestal exige a preservação de 20% de vegetação nativa em propriedades rurais. Na região Sul do Brasil, os agricultores preservam 26% das terras, no Sudeste 29%, no Centro-Oeste 49%, no Norte 56% e no Nordeste, mais de 50%.

Há problemas, claro. Inicialmente, o prazo para o cadastro vencia em maio de 2015, mas vem sendo adiado, impedindo a etapa seguinte, que seria a fiscalização dos produtores que desmataram além do que poderiam. Em seus mandatos, Dilma Rousseff e Michel Temer foram prorrogando o prazo, e finalmente Bolsonaro, através de uma medida provisória editada em junho, o extinguiu, liberando os produtores para cumprir a exigência quando quiserem. É justamente essa liberação que causa controvérsias e coloca Bolsonaro como um inimigo da preservação.

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No entanto, os dados de destruição apontados são de janeiro a agosto, e a medida de Bolsonaro é de junho, seguindo-se a sucessivos adiamentos de presidentes anteriores. Portanto, quais são os dados reais?

Analisamos algumas informações disponibilizadas pelo INPE que mostram dados referentes às queimadas. A tabela a seguir mostra claramente um aumento na quantidade de focos de incêndio detectados no período de 01/01 a 22/08 desde 2013. Nesta tabela, chama a atenção que o número de focos aumentou significativamente no Brasil – 85%, passando de 41.404 para 76.720 focos. Neste mesmo período, no entanto, houve aumento ainda mais significativo em outros países da região amazônica: 112% na Bolívia, 144% na Guyana, 120% na Guyana Francesa (alô, Sr. Macron?), 106% no Peru e 128% no Suriname.

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Fonte: Portal do Programa Queimadas do INPE  http://queimadas.dgi.inpe.br/queimadas/portal/situacao-atual


Na tabela seguinte, “Monitoramento dos Focos Ativos por Países”, filtrada pelo Brasil, nota-se claramente que, em todos os anos (desde 1998), de julho a agosto, há um aumento significativo nos focos de incêndio, o que coincide com a época da seca na região; portanto, o aumento nesta época não é exatamente uma novidade. Ainda assim, analisando-se os números de 2019, estão na maioria abaixo da média.

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Fonte: Portal do Programa Queimadas do INPE  http://queimadas.dgi.inpe.br/queimadas/portal/estatistica_paises


No entanto, focos de incêndio não significam extensão da área queimada. Quando se analisa a próxima tabela, que mostra dados da “Área Queimada em Km2 por bioma por ano”, nota-se que, com exceção do Pampa, a área queimada vem sendo reduzida desde 2015 em todos os biomas brasileiros, a Amazônia incluída. Pode-se argumentar que 2019 ainda não terminou; mesmo assim, como os dados são até agosto, fazendo-se uma estimativa pro-rata os números ainda seriam menores do que os de anos anteriores.

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Fonte: Portal do Programa Queimadas do INPE http://queimadas.dgi.inpe.br/queimadas/aq1km/


Já os dados da página “Fires in Brazil” do Earth Observatory (Observatório da Terra) da NASA atualizados em 22/08/2019 e consultados em 23/08/2019, (disponíveis em https://earthobservatory.nasa.gov/images/145464/fires-in-brazil), apontam que as queimadas na Amazônia estão próximas da média dos últimos 15 anos. Reproduzo a tradução de parte do texto da página tal como consta hoje (23 de agosto):


Na floresta amazônica, a estação das queimadas chegou. O espectrorradiômetro de imagem de resolução moderada (MODIS) no satélite Aqua da NASA capturou essas imagens de vários incêndios nos estados de Rondônia, Amazonas, Pará e Mato Grosso em 11 e 13 de agosto de 2019.

Na região amazônica, os incêndios são raros durante grande parte do ano, porque o tempo úmido os impede de iniciar e se espalhar. No entanto, em julho e agosto, a atividade normalmente aumenta devido à chegada da estação seca. Muitas pessoas usam o fogo para manter terras agrícolas e pastagens ou para limpar a terra para outros fins. Normalmente, o pico de atividade ocorre no início de setembro e praticamente cessa em novembro.

Em 16 de agosto de 2019, uma análise dos dados de satélite da NASA indicou que a atividade total de incêndios na bacia amazônica este ano esteve próxima da média em comparação aos últimos 15 anos (a Amazônia se espalha pelos territórios do Brasil, Peru, Colômbia e partes de outros países). Embora a atividade pareça estar acima da média nos estados do Amazonas e Rondônia, até agora apareceu abaixo da média no Mato Grosso e no Pará, segundo estimativas do Global Fire Emissions Database, um projeto de pesquisa que compila e analisa dados da NASA (observe que, enquanto o título do gráfico indique 2016, os dados do 2019 são listados em todos os gráficos como uma linha verde. Passe o cursor sobre o bloco verde 2019 abaixo do gráfico para isolar os números de 2019).


Já informações do Global Fire Emissions Database, fundeado, entre outras entidades, pela NASA, mostra que, na análise de uma série histórica, o pico das queimadas ocorreu em 2004 e 2005, em pleno “boom” da Soja durante o governo Lula da Silva. Além disso, faz uma análise em que aponta que a incidência de temperaturas de superfície mais altas tanto no Pacífico quanto no Atlântico Norte no início de 2019, projetavam um risco de incêndios mais alto na região amazônica durante o período de seca. Na figura abaixo, os mostradores indicam o risco de incêndio. Note-se o risco mais alto para os estados do Amazonas, Pará e Rondônia.

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Fonte: GFED http://www.globalfiredata.org/forecast.html#amazonas

Conclusão

Os dados mostram que as queimadas existem, representam um problema e que o Brasil deve, com toda a certeza, tomar providências no sentido de minimizar ao máximo o problema. No entanto, os mesmos dados mostram que as tendências, se preocupantes, não são alarmantes como a mídia e autoridades internacionais tem procurado fazer parecer, e se mantém mais ou menos estáveis há alguns anos, não havendo diferença significativa entre o atual governo e os anteriores. As demonstrações de autoridades internacionais e da grande imprensa de forma geral parecem muito mais explorar esses dados no sentido de minar a gestão do presidente Jair Bolsonaro, notoriamente tido como “persona non grata” por correntes ideológicas de esquerda.

O país deve sim atacar os problemas, e a postura do presidente Bolsonaro com relação ao assunto talvez não tenha sido a mais adequada; no entanto, este é um problema do Brasil e que deve ser resolvido pelo governo e povo brasileiros. Diante do que parece ser um ataque midiático coordenado, o governo deve traçar uma estratégia também coordenada e bem estruturada, atuando em diversas frentes, incluindo comunicação interna e externa, negociação político/diplomática, fortalecimento de alianças, desenvolver as políticas de preservação e, muito importante, fortalecer nossa capacidade de Defesa visando a dissuasão de tentativas de intimidação como as que estamos presenciando.

A Amazônia, sendo uma região de enorme importância, merece atenção mundial, tanto quanto as savanas africanas, a tundra siberiana, o Ártico ou tantas outras regiões quiçá ainda mais ameaçadas que a própria Amazônia. No entanto, o Brasil não deve aceitar a intromissão em assuntos internos do país. Apesar dos problemas, nós temos, como nação, todas as condições de lidar com a questão, e isso deve ficar claro para o mundo. Afinal, somos o país que conservou a maior floresta tropical do mundo, e, apesar das acusações de mortandade indígena, somos o único país do planeta que ainda mantém tribos indígenas isoladas, sem contato com a civilização.

Sabemos a dimensão dos nossos problemas, e não podemos e nem devemos ceder a pressões externas baseadas em dados alarmistas e falaciosos.


*Albert Caballé Marimón é fotógrafo profissional e editor do Blog Velho General. Atua na cobertura de grandes eventos tendo experiência em trabalhos como a Feira LAAD, o Exercício CRUZEX e a Operação Acolhida. É colaborador do Canal Arte da Guerra e da revista Tecnologia & Defesa. E-mail: velhogeneral2018@gmail.com


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34 comentários

    1. Em um momento em que a grande mídia perdeu toda a credibildade por estar, claramente, contrariada com as medidas do governo que estão afetando sensivelmente sua captação de recursos, e que, por isso, perdeu totalmente seu compromisso com a verdade, pois, distorce os fatos para influenciar a opinião pública para se opor ao governo, eis que encontramos este maravilhoso site onde podemos encontrar informação de verdade sobre questões tão importantes como segurança nacional, meio ambiente, e a tão oportuna questão da preservação da Amazonia, cujas queimadas estão ameaçando nossa soberania por estar sendo usando como álibe, por outras nações, para uma possível invasão do nosso país. Parabéns.

      1. Jerusa, muito obrigado. O compromisso do Velho General é com o BRASIL, independente de qual seja o governo da vez. Procuramos mostrar as coisas como elas são, visando melhorar a qualidade do debate sobre Defesa no país, que não é tratado com a importância que merece. Acreditamos que, com uma economia e defesa fortes, nosso país e a Amazônia não seriam alvos de ataques como os que estamos assistindo. Mais uma vez, muito obrigado por comentar e por nos acompanhar!

      1. De todos os materiais que li a respeito do tema esse foi o mais claro, objetivo e informativo que encontrei. Todos os dados com referências e sem as tabelas desengonçadas e sem sentido de outros meios de comunicação mais famosos. Parabéns ao autor pela análise.

        Os países europeus repartiram as Américas, a África e a Ásia e são responsáveis por guerras e intrigas internas nessas regiões até hoje…não obrigado, não precisamos dessa ajuda.

    1. Para acrescentar, posso incluir como motivação para os ataques gratuito deacron, o fato do Brasil está próximo de iniciar acordo econômico com união europeia, fato este que causou manifestação na franca contra o Brasil, pois o agronegócio do Brasil é muito competitivo, vai acabar tirando mercado da França, França ver nessas queimadas uma forma de querer barrar o acordo com Brasil e união europeia, interesse econômico por trás dessa hipocrisia francesa.

  1. Albert, como sempre uma análise objetiva e concisa sobre a idéia de que a nossa Amazônia “pertence ao mundo”, e desmistificando, com dados concretos, que é tudo uma falácia de quem que nossas riquezas… Parabéns!!!

    1. Excelente artigo, ótimas fontes muito bem articuladas passando um real entendimento sobre essa questão que é complexa, mas como dito no final do artigo é uma questão que compete apenas ao Brasil como nação soberana resolver, não permitindo a ingerência de outras nações, muito menos se amedrontar com essa pressão feita por órgãos internacionais, ONG’s e mídia nacional/internacional. Somos donos do nosso destino como nação.

  2. Albert, ÓTIMO trabalho.
    Um texto esclarecedor, com informações que a grande mídia não mostra (ou não quer).
    Abs.

  3. Parabéns, Albert. Belo texto, amplo trabalho de pesquisa. Um alerta para que se vejam as coisas para além das aparências. Há muitos e poderosos interesses direcionados à Amazônia. e nós devemos estar atentos! Como disse o Gen Rodrigo Otávio, “Árdua é a missão de desenvolver e defender a Amazônia. Muito mais difícil, porém, foi a de nossos antepassados de conquistá-la e mantê-la.” Selva!

    1. O que não sabem é que a amazônia não pertence ao povo brasileiro e sim meia dúzia de brasileiros abastados que sugam seus recursos e vendem lá fora, não repassando ao povo seus lucros e pondo seus capitais em bolsas externas favorendo o exterior. Usando mão de obra barata e deixando alguns míseros por desencargo de consciência, onde temos políticos, militares governo complacentes. Diante de tal situação que vendam na de vez aos americanos ou outro povo que tem capacidade para governa-la. A AMAZÔNIA NUNCA SERÁ DO POVO BRASILEIRO, ASSIM TAMBÉM COMO O PETRÓLEO NÃO É NOSSO A NÃO SER É CLARO AS SOBRA DAS MIGALHAS

  4. Albert obrigado pelo seu maravilhoso texto ! E sobre o trabalho das autoridades, esta resumido em Lucas Capitulo 16 ate o versículo 13 na Bíblia Sagrada

  5. Muito bom Albert, espero que muitos leitores entendam a importância de saber dos verdadeiros interesses estrangeiros. Parabéns.

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