Embora seja nebuloso – e arriscado – tentar adivinhar os rumos da política dos Estados Unidos para o Oriente Médio, não há dúvida de que os relacionamentos estão mudando. A visita de Sergei Lavrov ao Oriente Médio, na semana passada, mostra que Moscou está atenta, e procura capitalizar sobre as mudanças de rumo implementadas por Biden.
Duas semanas atrás, Washington divulgou um relatório de inteligência no qual acusa o príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, de ter ordenado o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, em 2018. A divulgação do relatório ocorreu na sequência da suspensão, no final de janeiro, da venda de armas consideradas “ofensivas” pelos EUA a países do Oriente Médio, incluindo o cancelamento de um grande lote de PGMs para a Arábia Saudita e UAVs MQ-9 Reaper e caças F-35 para os Emirados Árabes Unidos.
A interrupção da venda de “armas ofensivas” está relacionada ao desejo de Biden de encerrar o conflito no Iêmen devido às preocupações com abusos de direitos humanos na guerra civil iemenita. Segundo um porta voz do Departamento de Estado, Washington irá manter as vendas de armas consideradas “defensivas”, de forma a “garantir que a Arábia Saudita tenha tudo o que precisa para defender seu território e seu povo”.
Biden também reverteu a designação dos Houthis como grupo terrorista, alegando a dificuldade que essa classificação representa para as organizações humanitárias que tem que lidar com eles para distribuir alimentos e assistência aos civis iemenitas.
Além disso, a estratégia de Joe Biden para o Irã, procurando trazer o país de volta ao JCPOA, parece indicar que é possível que se abram certas concessões aos iranianos que não agradarão aos países árabes, na contramão da política de alianças com Israel que vinha sendo implementada por Trump.
As pressões do governo Joe Biden sobre os sauditas podem levá-los a buscar outros aliados, mesmo que eles não se afastem totalmente dos Estados Unidos. Segundo o semanário The Arab Weekly, fontes diplomáticas dos países árabes dizem que o governo Biden está cometendo os mesmos erros de Barack Obama, que acabaram levando os países Golfo a se aproximar da China e Rússia e a realizar acordos importantes com esses países.
É nesse contexto que ocorreu a visita de Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia, ao Oriente Médio, onde manteve encontros com o Ministro das Relações Exteriores e Cooperação Internacional dos Emirados Árabes Unidos, Abdullah bin Zayed bin Sultan Al Nahyan, em Abu Dhabi, o Ministro das Relações Exteriores da Arábia Saudita, Faisal bin Farhan Al Saud, em Riad e os Ministros das Relações Exteriores da Turquia, Mevlut Cavusoglu e do Catar, Mohammed bin Abdulrahman Al-Thani, em Doha.
A visita de Lavrov mostra que Moscou deverá explorar os erros de Washington nos campos diplomático, militar e econômico. Embora os sauditas já contem com um sistema THAAD, ainda que de forma limitada, e algumas baterias Patriot, a negociação dos mísseis S-400 esteve entre os assuntos tratados.
A viagem traz duas mensagens imediatas: a primeira, que a Rússia se coloca como alternativa para o mundo árabe. E a segunda, que os países árabes, mostram aos americanos que sua condição de ricos produtores de petróleo lhes permite equilibrar relações com outras potências baseadas em interesses comuns.
As conversas entre Moscou e Riad podem deixar o governo Biden em um dilema: ao manter uma estratégia que impede os sauditas de desempenhar um papel de forte liderança regional, arriscam perder negócios, investimentos e capacidade de influência para a Rússia.
Outra pauta das discussões foi a cooperação econômica. Mesmo com a pandemia, o comércio entre a Rússia e os árabes aumentou 78% no ano passado, atingindo US$ 3,27 bilhões. Foram discutidos projetos nas áreas de geração de energia, indústria, agricultura, infraestrutura e uso pacífico do espaço, além de aspectos relacionados à segurança na região.
James Dorsey, especialista em Oriente Médio da Universidade Nanyang de Singapura, disse que Lavrov está aproveitando a oportunidade que os EUA oferecem ao ignorar os principais líderes do Oriente Médio. Ele disse que o atraso de Biden em ligar para os principais líderes do Golfo indica que Washington está subestimando a importância do Oriente Médio.
Ao mesmo tempo, Riad vem realizando campanhas de relações públicas nos Estados Unidos na tentativa de influenciar a opinião pública, parceiros comerciais e congressistas para, através deles, pressionar o governo Biden a melhorar o relacionamento com o Reino.
É muito cedo para dizer se negociações com a Rússia frutificarão conforme os desejos de Moscou, ou o que os árabes farão em resposta às políticas de Biden. Por enquanto, os sauditas afirmam que “a parceria entre o Reino e os Estados Unidos é forte e duradoura”. Mas algumas mensagens estão sendo enviadas.
Como sempre Albert é lúcido.???????
Grande Vínio! Obrigado!
Eu acho que chamar o Biden de “Governo Biden” é gentileza. Esse partido dele vai forçar os EUA num caminho de pobreza que vai no sentido da Venezuela. Mas muito antes de concretizarem vão tomar uma bela rasteira. E vão ter que tentar reverter os erros que já começaram a cometer. Resta saber o tamanho e a capacidade de recuperar os prejuízos.
Pois é Wilton, eu penso que ele está metendo os pés pelas mãos, mas quem sou eu na fila do pão? Vamos acompanhar. Forte abraço!
A Rússia não vai deixar de ocupar o ” vácuo” deixado pelos Estados Unidos. Ainda mais com o $$$$$ e as necessidades dos Sauditas…
Albert, como a Rússia poderia apoiar o atual PR do Brasil, numa provável ruptura constitucional por parte do Executivo (porque a depender dos outros 2 poderes a corda já rompeu desde 2018).