Por Gustavo Franco* e André Amorim dos Anjos**

Os contrastes entre as legiões de Roma e os exércitos europeus dos séculos XVII e XVIII: de táticas a legados, entenda o recrutamento, equipamentos e o destino de forças militares que moldaram a história.
Comparar forças armadas de períodos tão distintos não é simples. Séculos de avanços ou regressões sociais e tecnológicas mudam muito a concepção militar de um povo, mas vamos aqui analisar cinco tópicos: Como era o mundo em que existiram? Como era feito o recrutamento? Como se equipavam? O que ganhavam ou perdiam? E por fim, qual foi o seu fim?
O mundo nas respectivas épocas
Os exércitos romanos nasceram junto de Roma, sua fundação e crescimento não seriam possíveis sem uma força armada minimamente capaz de se defender dos vizinhos, tão ou mais necessitados de um lugar para viver, plantar e criar animais. Guerras contra os ditos Sabinos (esses que passaram a integrar o povo romano), etruscos e samnitas foram fundamentais para o início de uma identidade “Romana”. Em um período tão arcaico, Roma se destacou com uma considerável organização social e consequentemente militar. A influência sobrenatural dos deuses, tanto romanos quanto inimigos, ditava tanto quanto as decisões dos líderes, sejam os reis, ou futuramente os cônsules.
O início das guerras romanas não foi por puro deleite de governantes interessados em enriquecer ou provar um conceito divino, mas uma necessidade de sobrevivência. Quantas civilizações desapareceram sem nem ao menos deixar resquícios de sua cultura, pelo simples fato de se negar a pegar em armas? Com os romanos no início de sua existência e dos povos vizinhos, a guerra era fundamental, básica, e extremamente violenta.
Com o passar do tempo a sociedade romana evoluiu e seus exércitos também, influenciados pelos novos contatos, sejam comerciais ou bélicos. As legiões romanas viajaram por todo o mundo conhecido. O Império Romano foi forjado com guerras civis de romanos contra romanos. É como se depois de tantos inimigos estrangeiros caídos (cartagineses, macedônicos, selêucidas, gauleses, germânicos, gregos e egípcios, dentre outros), o único exército capaz de derrotar um exército romano, era “outro exército romano”. O Mundo Romanizado gerou o seu maior inimigo, uma cópia de si mesmo.
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Quando se fala em forças armadas dos séculos XVII e XVIII, inicialmente é interessante associar as potências desses períodos, com certo destaque para os Espanhóis e Franceses, a criação dos Tércios e do Exército Real francês e os combates da “primeira guerra mundial”, a Guerra dos Sete Anos, ainda com o uso de armas brancas, mas também com o advento das armas de fogo portáteis.
O mundo no qual foram criados era completamente diferente do mundo em que reinavam as legiões de Roma. A religião predominante era a cristã, já com divisões entre católicos e protestantes, inclusive com uma considerável gama de conflitos acontecendo justamente devido a essa divisão religiosa.
Os homens comuns e os reis também mudaram seus objetivos, havia sim muitos possíveis inimigos, mas a sobrevivência da nação não era como no período romano, em que perder poderia, nos seus primórdios, significar uma aniquilação de toda a cultura e escravização geral da população. As guerras desse período focavam mais em expandir um território já considerável e se apropriar de fontes de recursos minerais e humanos, além é claro, de rotas comerciais por terra e principalmente navais. Não foram poucas as vezes que esses motivos ficaram ocultos devido a desavenças religiosas, iniciadas ainda na Idade Média.
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Após a perda do prestigio do Império Espanhol e seus exércitos, com seus famosos Tércios, os campos de batalha europeus viram o alvorecer de uma nova máquina de combate, poderosa, disciplinada, organizada, e leal ao seu país. Uma unidade merece destaque nas guerras europeias dos séculos XVII e XVIII. Estamos falando da formação dos Mosqueteiros, ou mais precisamente, os Mosqueteiros do Rei da França. Ganhando renome mundial nos tempos modernos com a famosa obra Os Três Mosqueteiros, do francês Alexandre Dumas, essa unidade foi o centro das atenções militares da França nos governos dos reis Luiz XIII, O Justo, e Luiz XIV, O Rei Sol.
Os Mosqueteiros do Rei foram criados durante o reinado de Louis XIII, em 1622. Assim como outros regimentos da Guarda Real francesa, eles faziam parte da Maison Militaire du Roi de France (Casa Militar do Rei da França). Ou seja, atuavam como guardas particulares do palácio real e da pessoa do rei. O nome completo da companhia é “Mosqueteiros da Casa Militar do Rei da França”. A companhia surgiu a partir de uma outra unidade militar, a guarda pessoal do pai de Louis XIII, Henri IV. No entanto, a guarda de Henri IV era composta pela cavalaria leve, e não por infantaria (se fosse necessário, os Mosqueteiros do Rei também podiam lutar a cavalo).
Pouco depois da fundação dos Mosqueteiros do Rei, devido a uma ameaça de morte ao cardeal Richelieu, que ganhou sua guarda pessoal baseada nos Mosqueteiros do Rei. Richelieu foi uma figura importantíssima, trabalhando como principal ministro, sobre o qual falaremos mais adiante.
Armand Jean du Plessis, cardeal-duque de Richelieu, tornou-se primeiro-ministro em 29 de abril de 1628 e arquitetou o absolutismo na França. Imortalizado como o grande vilão do escritor Alexandre Dumas na obra Os Três Mosqueteiros, o verdadeiro cardeal Richelieu nunca participou de nenhuma traição contra o rei Luis XIII; ao contrário, foi totalmente leal ao rei durante toda a sua vida.
A coexistência entre duas guardas de elite na França, a do rei e a do cardeal, gerava tensão e conflitos entre elas. Portanto, até a proibição das brigas de rua por Louis XIV em 1655, era comum duelos e brigas generalizadas entre membros das duas guardas. Geralmente, isso ocorria após provocações em tabernas ou como algo ligeiramente organizado entre os dois corpos nas ruas de Paris. No uniforme a principal diferença era que o tabardo dos mosqueteiros do cardeal era vermelho. Em 1661, os guardas do cardeal foram incorporados à guarda do rei.
Apesar do título de nobreza, Richelieu veio de uma família com poucas posses e ligações na corte. Graças a sua inteligência e capacidade foi nomeado bispo em 1607. Entrou para a política, transformando-se em secretário de Estado, em 1616. Apesar das intrigas da corte contra ele, Richelieu logo adquiriu grande poder na Igreja católica e na França, convertendo-se em cardeal em 1622 e em posteriormente em primeiro-ministro do rei Luís XIII, cargo no qual permaneceu até sua morte em 1642.
Sua política exterior fundamental foi contrabalançar o poder da dinastia austro-hispânica dos Habsburgo, então reinante na Espanha e no Sacro Império Romano Germânico. Para atingir esse objetivo, mesmo sendo um ministro católico, ele se aliou aos protestantes. Foi particularmente notória sua intervenção na Guerra dos 30 Anos, que terminou com a Paz de Westfalia, da qual a França emergiu como principal potência europeia ao término do conflito.
É importante mencionar o sucessor de Richelieu, o Cardeal Mazarin. Jules Mazarin venceu batalhas na série de revoltas ocorridas pelo aumento de impostos para suprir os gastos da Guerra dos 30 Anos, que formaram o conflito chamado de “A Fronda”. Com as brilhantes vitórias que conseguiu nessa guerra, assinou a paz de Vestfália em condições vantajosas em 1648, convertendo a França na principal potência europeia. Esses feitos só foram possíveis graças às grandes atuações dos mosqueteiros e seu profissionalismo no campo de batalha.
O recrutamento dos Exércitos
Diferente da loucura lacedemônia de colocar crianças de sete anos em treinamentos físicos extremos (o famigerado Agogê) a fim de se criar uma sociedade forte militarmente, Roma nunca preparou crianças especificamente para a guerra. Haveria treinamentos na forma de brincadeiras, uso de espadas de madeira com escudos e corridas, mas o que mais preparava fisicamente os futuros soldados eram as atividades no campo. O trabalho infantil era comum também nas áreas urbanas. A exceção eram os filhos das famílias ricas, que se dedicariam a estudos sobre os mais diversos temas. Também havia um curioso esporte que lembra o futebol americano, com relatos de que Júlio Cesar e outros estadistas também jogavam, o chamado Harpastum.
A vida militar romana com o passar do tempo se tornou uma bela forma de acender socialmente, e muitos queriam seguir por esse caminho, pois além de a demanda por soldados ser intensa em meio a tantas guerras com o passar dos séculos, a carreira oferecia muitos incentivos aos candidatos. Roma precisava a cada ano de 7.500 a 10.000 novos recrutas nativos do território romano (há relatos do século II a esse respeito), e a vida no exército garantia comida, abrigo e um salário que, se não fosse bem superior ao de um trabalhador livre, tinha a vantagem de ser garantido pelo general em comando. Havia também atendimento de saúde, oportunidades de promoção interna, bem como certos privilégios ao lidar com processos judiciais.
Após as reformas de Mario no ano de 107 a.C., a forma de milícia do Exército Romano (Legiões Manipulares) foi abandonada, e foi criado um modelo de exército profissional, sendo portanto assinado um termo de compromisso. O contrato dos legionários previa cerca de 20 anos de serviço, exigindo assim que o recruta não tivesse mais do que 20 anos de idade. A altura ideal de um recruta para infantaria ou cavalaria variava entre 1,72 e 1,77 m, embora os mais baixos não fossem rejeitados se fossem fortemente constituídos. No final do Império a exigência de altura caiu para 1,65 m. Uma certa simplicidade e ignorância também eram necessários a estes militares, para que as fileiras não tivessem homens que questionassem as ordens recebidas. Mas, para ocupar cargos administrativos, não se excluíam recrutas que tivessem educação em letras e números.
Eram valiosos para as Legiões aqueles que trouxessem da vida civil uma profissão e habilidades úteis para a vida nos acampamentos, como ferreiros, carpinteiros e caçadores. Alguns fizeram uso de cartas de recomendação escritas por pessoas influentes, em que as suas competências eram exaltadas.
Ser um legionário romano, era o sonho de muitos dos Socii, os povos que viviam ao redor do território materno de Roma e que um dia foram seus inimigos. Eles até lutavam por Roma, mas não eram considerados cidadãos e eram sempre subalternos. Com o passar do tempo, foram criadas os Auxiliarii, nos mesmos moldes, mas já com o status de contratado (não necessariamente mercenário), e no qual não deviam lutar à moda romana, mas com as características de seu povo, com destaque para as tropas de cavalaria, arqueiros e fundibulários. Com o fim de seus contratos, os Auxiliarii se tornavam cidadãos, com os mesmos direitos dos legionários (recebimento de um pedaço e terra nas terras que ajudou a conquistar e manter e uma quantia em dinheiro).
A formação dos recrutas incluía uma ligação de fraternidade. Os jovens serviam com os mais velhos e tal ideia foi eficiente, pois melhorava consideravelmente os ensinamentos adquiridos nos treinamentos.

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O recrutamento dos Tercios (“Terços”) se dava de acordo com sua organização, que variou bastante durante a sua existência. A estrutura original dos terços dividia-os em 10 capitanias ou companhias (oito de piqueiros e duas de arcabuzeiros), com 300 homens cada uma. Cada companhia incluía o capitão, um alferes, um sargento e 10 cabos (cada um comandando uma esquadra de 30 homens). Além dos oficiais, as companhias incluíam alguns funcionários administrativos e auxiliares como furriel, capelão, músicos e pajem do capitão.
Com a evolução dos armamentos e das táticas de combate, as companhias de piqueiros e de arcabuzeiros foram sendo substituídas por mosqueteiros e estas, posteriormente, por fuzileiros (armados com espingardas). Assim, a partir do final do século XVII, o Tercio incluía, normalmente, oito companhias de fuzileiros e uma companhia de granadeiros.
O pessoal de cada unidade era sempre voluntário e treinado na sede do próprio Tercio. Este sistema viria a ser o gérmen dos exércitos profissionais modernos. Os exércitos espanhóis da época integravam soldados recrutados em todos os domínios dos Habsburgos. Além disso integravam mercenários alemães, italianos, valões, suíços, flamengos, ingleses, irlandeses, portugueses, espanhóis e outros. No conjunto do exército, a proporção de efetivos portugueses e espanhóis tendia a ser inferior a 50%. Na Guerra da Flandres, por exemplo, o número de efetivos portugueses e espanhóis era de apenas 10% a 15%. No entanto os espanhóis eram considerados o núcleo combatente por excelência, encarregado das missões mais duras e arriscadas e, consequentemente, com os melhores pagamentos.
Quando um Tercio precisava de alistar soldados, o rei concedia uma autorização especial (“conducta”) – assinada de próprio punho – aos capitães designados aos quais era atribuído um distrito de recrutamento e que deviam ter o número de homens suficiente para compor uma companhia. O capitão, então, desfraldava a bandeira da companhia em um lugar determinado e alistava os voluntários que acorriam, em grande quantidade, graças à fama dos Tercios, nos quais pensavam poder obter uma boa carreira e ganhar uma boa fortuna. Estes voluntários incluíam desde humildes camponeses até fidalgos arruinados ou filhos segundos de famílias nobres. Normalmente, não se recrutavam menores de 20 anos e nem idosos. Era expressamente proibido o recrutamento de religiosos ou doentes contagiosos. Os recrutas tinham que passar por uma revista de inspeção, na qual poderiam ser expulsos se fosse verificado que não reuniam as condições necessárias para o combate. Ao contrário do que ocorria em outros exércitos, os soldados dos Terços não eram obrigados a jurar fidelidade e lealdade ao rei.
O alistamento era por tempo indefinido, terminando quando houvesse concessão de licenciamento por parte do rei ou mesmo pelos generais do Exército. Partia-se do princípio de que o juramento era tácito e efetivo a partir do momento do recrutamento. Ao entrar no Terço, normalmente o soldado recebia um soldo adiantado para pagar pelo seu próprio equipamento.
Apesar das condições de recrutamento variarem conforme as necessidades, exigia-se que o soldado fosse saudável e forte, com uma boa dentadura para poder se alimentar dos duros biscoitos que constituíam o elemento principal da alimentação distribuída às tropas. As principais zonas de recrutamento eram Castela, Andaluzia, Navarra, Levante Espanhol e Aragão. Não existiam centros de instrução, pois isso era responsabilidade dos sargentos e cabos. Na verdade, os recrutas eram treinados em marcha, sendo divididos por todas as companhias, para melhor aprenderem com os veteranos e, também, para não se enfraquecer demasiado uma única companhia. Era também comum que, nas companhias, se formassem grupos de camaradas, cada qual integrando cinco ou seis soldados unidos por laços especiais de amizade e que enfrentavam, juntos, os perigos de suas missões.
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Fazer parte da corporação de Mosqueteiros era muito benéfico para seus membros. Os Mosqueteiros do Rei eram recrutados entre os jovens mais capazes das regiões rurais da França. Depois disso, surgiram duas companhias de mosqueteiros reais: a cinza e a negra, cada uma tendo seu nome de acordo com a cor dos cavalos que utilizavam. Geralmente, a idade de admissão era entre 16 e 17 anos, porque o treinamento dos mosqueteiros funcionava da mesma forma que uma academia militar. No entanto, o tipo de pessoa admitida durante o reinado de Louis XIV eram filhos dos próprios mosqueteiros ou parentes de oficiais veteranos de guerra.
Apesar disso, não era incomum um jovem de origem humilde ascender socialmente através do serviço prestado ao rei na corporação. Ainda assim, os Mosqueteiros do Rei passavam por um severo e constante treinamento, que não só envolvia as práticas militares, mas também o ensino de línguas, matemática, história e ciências. No mais, as táticas utilizadas pelos mosqueteiros franceses eram basicamente as mesmas utilizadas pela infantaria e cavalaria dos séculos XVII e XVIII, já que eles poderiam cumprir ambas as funções, e seu treinamento se assemelhava ao da infantaria comum, para desgosto dos nobres que tinham seus filhos na corporação.
Como se equipavam?
Inicialmente os romanos se equipavam a moda grega, com couraça de bronze ou de couro endurecido e escudo redondo de grande diâmetro, lança de choque que servia para arremessos a curta distância, espada curta e elmo de bronze com penacho característico. Sua forma de luta era a clássica falange. Com o nascimento da República, houve mudanças, mais inimigos e contatos comerciais que levaram os romanos a criarem as suas próprias indumentarias. É digno de nota que nessas fases quem pagava pelo equipamento era o próprio soldado, e naturalmente, quanto mais dinheiro ele tivesse melhor seria o seu equipamento. Isso ficou claro nas forças de infantaria.
A legião clássica, chamada de legião manipular, tinha cerca de três mil membros, que futuramente se tornariam cinco mil, com algumas fontes colocando o número exato em 6.666 soldados. Independentemente do número, a infantaria sempre foi o foco das legiões, e inicialmente era composta por quatro classes de soldados, lembrado que sua divisão não era inicialmente por talento ou habilidades, mas pelo poder financeiro de custear seu equipamento e pela experiencia de combate. As quatro classes seriam os Veles (Velites), Hastatus (Hastati), Princeps (Principes) e Triarius (Triarii), além da pequena força montada, os Eques (Equites).
Os Velites eram os de menor poder aquisitivo, serviam como infantaria ligeira, fustigavam o inimigo e recuavam para a retaguarda quando este aproximava de suas linhas. Eram equipados apenas com um pequeno escudo redondo, três a quatro dardos (chamados de javelinas) e uma espada curta ou adaga para defesa pessoal. As poucas representações que se tem dos Velites os mostram com uma pele de lobo na cabeça, mas é difícil imaginar que haveria tantos lobos assim para equipar toda uma legião. Algumas fontes indicam que haveria até 1.200 Velites em uma única legião.
Os Hastati formavam a primeira linha de batalha: tratava-se de soldados de infantaria cobertos com armaduras de couro, couraças e capacetes enfeitados com três canetas de cerca de 30 centímetros de altura. Levavam um escudo de madeira reforçado com ferro que media quatro pés de altura (cerca de 120 cm) e tinha forma de retângulo convexo. Brandiam uma espada chamada gladius e duas lanças de arremesso conhecidas como pilos (um pilo pesado e um dardo menor). Cada legião tinha 1.200 Hastati.
A segunda classe, os Princeps (Principes), formavam habitualmente a segunda linha de soldados na formação de batalha. Eram soldados de infantaria pesada, armados e protegidos como os Hastati, salvo pelo fato de usarem uma cota de malha (lorica hamata) mais leve em lugar de uma couraça sólida. Cada legião levava 1.200 Principes. Os Triarii, que formavam habitualmente a terceira fila quando o Exército se colocava em ordem de batalha, eram os últimos remanescentes de soldados em estilo hoplita no exército romano. Suas armas e armaduras eram similares às dos Principes, com a exceção de que sua arma principal era uma lança de choque em lugar dos dois pilos. Eram os homens mais velhos das legiões manipulares, e cada legião tinha cerca de 600 Triarii.
Havia forças ainda mais “fracas”, os Rorarii, soldados que não tinham nenhum vínculo oficial com as legiões e eram recrutados às pressas em situações específicas, quase sempre servindo apenas para fazer número, pois não tinham equipamentos adequados e nem treinamento.
A cavalaria romana era formada pela ordem equestre, uma classe de cidadãos com considerável poder aquisitivo, pois além de seus equipamentos, comprava cavalos, algo caro na Itália antiga. Ocasionalmente conseguia-se cavalaria e infantaria ligeira adicional dos aliados latinos do restante da Península Itálica. Cada legião tinha cerca de 300 a 600 cavaleiros, subdivididos nas chamadas “Turmas”, que eram grupos de 30 cavaleiros.
Depois das Guerras Púnicas ficou claro que havia sérios problemas nas forças romanas que, apesar da vitória, sofreram muito. Em 107 a.C. Caio Mario iniciou um processo de melhoria conhecido como Reforma Mariana, permitindo que todos os cidadãos pudessem se tornar soldados, já que seus equipamentos seriam custeados pelo Estado. A distinção entre Hastatii, Principes e Triarii, que já se tornara muito fraca, foi oficialmente eliminada e a legião romana foi criada da forma como é habitualmente recordada. A infantaria legionária passou a ser uma força homogênea de infantaria pesada composta por cidadãos romanos e tropas auxiliares de povos aliados ou conquistados.
O legionário clássico era armado com um escudo oval ou retangular, um gládio, um ou dois pilos, usava uma armadura de anéis de aço (lorica hamata) que passou a ser feita de placas sobrepostas (lorica segmentata), o Elmo Montefortino recebeu influencias da Gália e passou a ser chamado de Elmo Galeo. Também levava um novo modelo de gládio, o Gladius Hispaniensis, com forte influência das espadas hispânicas.
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Falando nos Tercios, como foi dito seu foco também era a infantaria, mas com um misto de armas de fogo e armas brancas, inicialmente eram piqueiros, com suas lanças (os piques) que podiam passar dos cinco metros de comprimento, e os arcabuzeiros, que necessitavam de um suporte para orientar o disparo. Os Tercios, assim como todas as forças armadas do período, também tinham tropas de artilharia e cavalaria.
Piqueiros eram grosso modo uma “cópia dos falangistas macedônicos”. A ideia de formações com um grande número de lanças, com manuais da época exemplificando unidades de três mil lanceiros trabalhando juntos, é clássica. Desde os tempos de Alexandre, seriam virtualmente seriam invencíveis contra a cavalaria, contanto que os flancos da formação fossem protegidos por tropas de cavalaria. Com o advento da tecnologia, aos poucos o pique foi sendo trocado pelo rifle, mas o conceito de formação cerrada e movimentação em uníssono continuou.
Piqueiros normalmente usavam capacetes com proteção lateral no rosto e couraças metálicas no peito e área da cintura. As pernas e braços eram normalmente cobertas apenas com tecidos resistentes da época. Além de luvas de couro, carregavam uma espada curta e facas, pois quando duas forças de piqueiros se chocavam, muitos largavam seus piques e partiam para o combate corpo a corpo no curto espaço entre as tropas. Devido ao seu tamanho e peso, piques e escudos não eram usados, pois era necessário usar as duas mãos para manusear a arma.
Os arcabuzeiros eram soldados fundamentais nas formações dos Tercios. Apesar de ainda possuírem um sistema de municiamento complexo, serem pesadas, barulhentas, espalharem uma enorme quantidade de fumaça e serem praticamente impossíveis de usar em dias de chuva, podiam fazer um estrago considerável nas fileiras inimigas quando estas se aproximavam. Os Atiradores deviam disparar e recuar para trás das tropas de piqueiros e da cavalaria, lembrando bastante o estilo de combate dos Velites romanos.

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Além da arma, os arcabuzeiros tinham espadas, e se tivessem condições compravam uma pistola de retrocesso, que basicamente era um arcabuz em miniatura e também levavam facas. Não tinham armaduras, mas alguns ainda usavam capacetes. Seu principal adversário era a cavalaria, portanto proteger a cabeça era importante. São representados com pequenos sacos contendo pólvora, facilitando um pouco o municiamento da arma, já que era necessário colocar todos os componentes de forma manual – a pólvora, o projetil, e um cordão feito de material inflamável que era mantido aceso para efetuar o disparo. Quando as forças de piqueiros se aproximavam, os arcabuzeiros abandonavam suas armas pesadas e ajudavam no combate corpo a corpo com suas espadas e facas.
As armas de fogo se mostraram tão eficientes que aos poucos foram tomando conta de todas as classes. Líderes como Gustavo Adolpho II da Suécia e os franceses Duque de Turenne e o Duque de D’Enghien, mostraram que as artilharias e armas portáteis seriam fundamentais nas guerras modernas.
A cavalaria do período é absurdamente superior à cavalaria dos tempos romanos. Por séculos as forças a cavalo foram a principal arma europeia, e isso possibilitou cruzamento de raças, fornecendo cavalos maiores e mais fortes, mas ainda assim rápidos e ágeis.
Nas terras da atual Alemanha surgiu uma nova força a cavalo, os chamados Reiters. Esses homens eram cavaleiros com armaduras menores e armados com duas armas de fogo. Recriaram a famosa tática da Cavalaria Númida dos tempos romanos de disparar e recuar, mudando a concepção dos cavaleiros medievais que partiam em cargas avassaladoras sobre os inimigos infantes ou demais inimigos a cavalo.
Cargas a cavalo passaram ser a última opção, ou usadas apenas para perseguir inimigos em fuga e assim completar a vitória. A tática do caracol era complexa e dependia de muitos fatores, mas é uma marca registrada dessa nova era da cavalaria, na qual os cavaleiros se aproximavam do inimigo, disparavam e recuavam para dar tempo de remuniciar suas pistolas e voltar a disparar.
Nesse período, a arma mais mortal para as infantarias já estava em plena atividade, a Artilharia. Os canhoes da época eram pouco confiáveis, com alguns afirmando que eram mais perigosos para os usuários do que para o próprio inimigo. Ainda assim podiam fazer a diferença, considerando que Tercios e demais infantarias europeias ainda marchavam em formações fechadas com centenas ou milhares de soldados em cada formação. A munição mais comum não era explosiva, mas sim carapaças maciças que despedaçavam as linhas de homens, independente de que tipo de armadura usassem. A única chance dos infantes era o momento do recarregamento dos canhoes, pois era um processo lento, além do que nesse período a mira era refeita a cada disparo, e mesmo assim com pouca precisão.
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O nome da unidade de mosqueteiros deriva da arma mais moderna e utilizada na época por todos os exércitos europeus, o mosquete, evolução dos pesados arcabuzes dos Tercios espanhóis e demais forças do período.
O mosquete se assemelha a uma espingarda porém muito mais pesado, com um cano de até 1,5 m sobre uma culatra integrada com guarda mão de madeira geralmente munido de baioneta, podendo ser de mecha (como os arcabuzes) e posteriormente de pederneira.
O uniforme dos mosqueteiros franceses pertencentes à guarda real era bastante característico, e se tornou um símbolo da corporação. Além dos chapéus com uma pluma branca, utilizavam um tabardo azul com uma cruz branca no centro. Essa cruz branca significava a aliança dos mosqueteiros com o catolicismo, já que a corporação foi criada para suprimir as rebeliões dos huguenotes na França, que eram protestantes. Por baixo desse tabardo, havia as cargas de munição de seus mosquetes.
Apesar de seu uniforme se manter praticamente o mesmo, isso não pode ser dito do equipamento que utilizavam. Basicamente, era sempre composto de uma rapieira e um mosquete. Ainda assim, em sua formação inicial de 1622, as normas para os equipamentos eram inexistentes, o que possibilitava aos mosqueteiros o uso de qualquer tipo de armamento. Em relação aos mosquetes, era comum que se utilizassem modelos de fecho de mecha até a introdução do fecho de pederneira por volta de 1660.
O modelo das espadas, no entanto, variava de acordo com a função do mosqueteiro. Geralmente, a infantaria ficava com um modelo de rapieira (espadas de bom aço, agudas e mais focadas em estocadas, como as modernas espadas da esgrima olímpica) conhecido como à la mousquetaire, e os que preferiam o combate montado utilizavam uma espada larga, utilizada pela cavalaria até o século XIX. O uso de pistolas de fecho de pederneira também passou a ser comum quando esse tipo de armamento foi introduzido, e durante o reinado de Louis XV se tornou o único utilizado, com os mosquetes sendo acompanhados pela baioneta.
Recompensas no fim dos serviços
Além da morte, que não era algo excepcional, existiam três maneiras de o militar romano de deixar a sua legião. O primeiro era resultado de uma grave doença ou lesão que deixava o combatente inútil para o Exército. A chamada missio causaria, algo como uma “dispensa honrosa”. Nesse caso, tal como hoje, o legionário era licenciado após um rigoroso exame de sua condição.
O segundo caso era por cometer atos criminosos que provocavam a sua dispensa desonrosa e desqualificação de qualquer serviço imperial, conhecida como missio ignominiosa.
Por fim havia os legionários, cerca de metade do efetivo, que conseguiam sobreviver aos 20 ou 25 anos ou mais de serviço e eram licenciados com honra na missio honesto.
Uma vez licenciados, estes homens tinham uma série de direitos e privilégios como cidadãos e veteranos militares. Eles eram isentos de muitos impostos e receberiam tratamento preferencial em relação à justiça. Se quisessem também poderiam legalizar seu estado de cidadão, no caso dos Auxiliarii. Estes combatentes recebiam um documento escrito que declarava a sua dispensa. Alguns destes militares se destacavam tanto que recebia um diploma de bronze, com o detalhamento do seu status legal como soldado veterano.
O licenciamento permitia aos legionários “voltarem para suas casas”, mas muitos não voltavam para lugar algum, pois durante a sua vida aquilo que significava “casa” sempre foram seus quartéis.
Muitos recebiam terras perto de seus acampamentos, ou na região onde tinham servido. As parcelas de terras reservadas para cada licenciado eram delimitadas por técnicos agrários em um processo chamado “centuriação”. Isso era interessante, especialmente se eles tivessem casado com mulheres das regiões dos aquartelamentos. Aqueles que tinham sido centuriões poderiam desfrutar de uma boa posição na cidade onde decidiram fixar residência e até atingir os mais altos escalões do judiciário local. Outros investiam suas economias visando abrir um negócio; por exemplo, a venda de cerâmica ou espadas.
Mas diferentemente dos centuriões, os legionários veteranos, mesmo com certos reconhecimentos por parte do Império, normalmente tinham uma vida muito dura no final de sua existência. Na maioria dos casos terminavam com o corpo mutilado pelas feridas, com saúde limitada, recebendo salários miseráveis em troca de uma vida de dedicação e lutas. Mas, por incrível que possa parecer, estes soldados viviam melhor do que muitos civis pobres do Império Romano.
Havia ainda um grupo seleto de veteranos, que mesmo após o cumprimento do seu período de soldado, se fosse considerado apto, o militar poderia ingressar no chamado Evocati, um grupo de soldados veteranos de elite, que poderia servir como guarda pessoal de generais de outros funcionários do império.
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Os Tercios espanhóis, assim como os demais exércitos do seu tempo, não tinham um período específico de serviço militar. Isso dependeria do decorrer do conflito no qual estavam envolvidos e da liderança do rei ou general em questão. Sua recompensa eram um salário fixo relacionado à patente. Mesmo na mais baixa classe militar, era consideravelmente maior do que um camponês ganhava, o que explica a grande procura quando era divulgado o recrutamento.
Generais podiam ser recompensados com títulos de nobreza e terras. Para seus subordinados mais leais e confiáveis, joias, que simbolizavam a bravura e coragem do soldado, como as atuais medalhas de honra.
Uma forma de enriquecer era por meio do saque de cidades em território inimigo, atos que aconteciam normalmente com autorização do líder da força armada na região, mas nada impedia que unidades mais afastadas efetuassem essas atividades de forma ilícita.

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O fim
Na época do Baixo-Império (a partir do ano 395) acentuou-se o desinteresse do cidadão romano pela carreira militar. As tropas auxiliares adquiriram cada vez mais importância. Algumas foram até mesmo elevadas à dignidade das legiões. Entre as legiões estabelecem-se distinções de acordo com o local em que estão sediadas. Assim, por exemplo, as legiões palatinas se encontram mais próximas do imperador, as riparienses situam-se nos confins do Império e as comitatenses estão alojadas no interior.
O fim do império romano foi uma sucessão de crises em todos as áreas da organização imperial, e no exército a crise foi sentida com mais força.
Alguns dizem que “invasões bárbaras” foram grandes contribuintes para a queda do império, mas a verdade é que os romanos como civilização nasceram e cresceram lutando contra os ditos “bárbaros”. O problema era mais grave, pois era difícil ver as diferenças entre os exércitos visigodos e as legiões romanas. O Império espalhou suas táticas e formas eficientes de lutar, e como foi dito no início do artigo, o maior inimigo do Exército romano era “outro Exército romano”.
O Império do Ocidente realmente foi destruído em uma série de derrotas militares, mas causadas por motivos “extra militares”. Os principais seriam:
• Constantino I enfraqueceu as legiões: seu modelo administrativo dava muito poder e autoridade aos generais longe da capital, o que os tornava pouco interessados nos assuntos de Estado, e mais focados em ganhar dinheiro por via de subornos de líderes inimigos;
• Os Hunos eram inimigos terríveis: Átila e seus guerreiros eram uma força diferente, não invencível, mas suas táticas de cavalaria e a velocidade com que se moviam estava além das capacidades dos romanos, que ainda dependiam mais da infantaria;
• Os Germanos eram inimigos terríveis: as tribos germânicas sempre foram vencidas pelos romanos, mas a incapacidade de dominar a Germânia por inteiro sempre criava a oportunidade de levante das tribos, sugando recursos humanos e financeiros do império para manter alguma segurança;
• Houve uma crise de qualidade: Indisciplina, falta de treinamento e atraso tecnológico: a falta de “novos inimigos” prejudicou os avanços romanos em tecnologia militar, o crescimento de carreiras menos perigosas, como as religiosas e comerciais, diminuíram consideravelmente o interesse de novos militares, e aqueles que ainda estavam dispostos a lutar passavam muito tempo ociosos em regiões relativamente pacificas;
• A falta de defesa em profundidade permitia devastações: os romanos investiram pouco nas defesas em grande escala nas partes mais distantes da Itália, com a ideia de que uma invasão inimiga iria consumir grandes áreas e dar tempo para uma defesa organizada. Isso se provou um grande erro, pois as áreas destruídas eram principalmente aquelas que forneciam alimentos e demais itens de subsistência;
• Os Limitaneus eram antes de mais nada fazendeiros (e dublês de guerreiros): outra ideia de Constantino, criar forças armadas regionais que seriam responsáveis pela primeira defesa contra invasões estrangeiras. Tinham péssimo treinamento, pois não eram soldados profissionais, a maioria eram camponeses, voltando a antiga modalidade de Milicia, mas sem qualidade alguma.
• Bárbaros dentro do exército eram traiçoeiros: com a falta de interesse dos romanos nativos, o crescimento de auxiliares no exército foi natural, e em 212, a divisão de patentes sociais acabou, com o “edito de Caracala”. Assim, aqueles que um dia eram inimigos passaram a ser a principal mão de obra do exército, basicamente seriam germânicos vigiando a fronteira de outros germânicos;
• Legionários romanos deixaram de usar armadura: parece incrível, mas as famosas lorica hamata e segmentata que simbolizaram o militar romano foram caindo em desuso. Tecidos grossos se mostraram suficientes para a maioria das armas romanas nos períodos das guerras civis, porém, principalmente contra as hordas de cavaleiros hunos, a mortandade era tremenda, já que a principal arma enfrentada eram os fatais arcos e flechas. Além disso, a cavalaria visigoda também era mestre em usar javelinas e lanças de choque.
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A Batalha de Rocroi, a 19 de maio de 1643, marcou o fim do mito da invencibilidade dos Tercios espanhóis. A derrota dos Tercios foi um autêntico golpe moral sobre os soldados levando-os a um quase completo desânimo. A esta derrota e outras posteriores na Guerra dos Trinta Anos, somou-se a obsolescência do armamento, instrução e táticas de combate usadas pelos Tercios, que foram perdendo suas caraterísticas iniciais e aproximando-se dos regimentos dos outros países europeus. Os Tercios espanhóis acabaram por ser dissolvidos por Filipe V da Espanha em 1704, sendo substituídos por regimentos comandados por coronéis, segundo o modelo francês dos Bourbons.
Já depois de extintos na Espanha os Tercios ainda se mantiveram na primeira linha do Exército português – terços pagos – até 1707, quando passaram a ser designados “regimentos de infantaria” e na sua segunda linha – terços auxiliares – até 1796, quando passaram a ser designados “regimentos de milícias”. No momento de sua extinção, os terços já tinham todas as caraterísticas de regimentos, havendo apenas uma mudança na designação.
Uma nova era militar começaria, com as armas brancas tornando-se apenas um último recurso e sendo mais importantes para aqueles que combateriam no lombo de um cavalo. As forças de infantaria se enfrentariam com fuzis e mosquetes mais leves que os arcabuzes e ligeiramente mais fáceis de manusear, teriam baionetas para a luta corpo a corpo, que ainda seria imprescindível, mas que perderia espaço para os combates com armas de fogo e artilharias mais eficazes.
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Os mosqueteiros participaram de várias batalhas. Entre elas, as mais notáveis são a Batalha de Fontenoy e a Batalha de Rocourt durante a Guerra de Sucessão Austríaca (1740-1748), um conflito generalizado que envolveu a maior parte das potências europeias em um duelo pela sucessão do trono austríaco, oficialmente ocupado pela imperatriz Maria Teresa.
Devido a uma redução do tesouro francês por causa de seu apoio aos colonos revoltosos na Guerra de Independência dos EUA, em 1775 as duas companhias de mosqueteiros do rei foram debandadas. Isso, no entanto, não impediu que o prestígio desses mosqueteiros se esvaísse, e uma nova tentativa de estabelecer a corporação ocorreu em 1789, sendo frustrada pela eclosão da Revolução Francesa. Com o fim do período napoleônico e o início da Restauração Bourbon, mais uma vez o rei da França, Louis XVIII, restabeleceu os Mosqueteiros do Rei.
Mesmo com o antigo prestígio, essa nova encarnação de 1814, que teve um hiato durante o Governo dos 100 dias de Napoleão, obteve a desconfiança de diversos políticos franceses. Isso se deve ao fato de que os gastos dessa nova corporação eram muito altos e sua verdadeira utilidade em batalha era constantemente questionada, já que a maioria dos seus membros eram homens velhos demais para atuar em guerras. Após um breve embate político, Louis XVIII finalmente cedeu e debandou os Mosqueteiros do Rei de uma vez por todas em dezembro de 1815. Sua histórica fama ainda assim permanece viva, principalmente nos contos de Alexandre Dumas e seus Três Mosqueteiros, que mantém acesa a chama dessa corporação até os dias de hoje.
Honrados e valorosos guerreiros, os mais prestigiados da França durante seu tempo, os Mosqueteiros do Rei estavam entre uma das forças de combate mais renomadas da Europa durante os séculos XVII e XVIII. Com treinamento árduo e uma participação no campo de batalha avassaladora, os mosqueteiros franceses deixaram sua marca para a posteridade, futuramente se tornando um ícone cultural da França, e mantendo a sua reputação internacional.
*Gustavo Franco é mestre em História e especialista em Ciências Penais e Segurança Pública.
**André Amorim dos Anjos é engenheiro ambiental, entusiasta de História Militar e criador de conteúdo da página Zona de Guerra.
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