Apontamentos sobre o “Relatório Pós-Ação” da resposta ao tiroteio na escola em Uvalde, nos EUA

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Policiais nas proximidades da Escola Primária Robb em Uvalde, Texas, após o tiroteio (Dario Lopez-Mills/AP).

Policiais nas proximidades da Escola Primária Robb em Uvalde, Texas, após o tiroteio (Dario Lopez-Mills/AP).

As observações de um experiente oficial da PMESP a respeito do Relatório Pós-Ação do caso da escola primária de Uvalde, no Texas, trazem reflexões sobre a resposta aos incidentes de atirador ativo e gestão de crises.


Em 24 de maio de 2022, um homem portando um rifle invadiu a Escola Primária Robb, na cidade de Uvalde, Texas, efetuou disparos e causou a morte de 19 crianças e dois professores. Depois da tragédia, o Departamento de Segurança Pública do Texas (Texas Department of Public Safety) solicitou a um órgão especializado a elaboração de um relatório pós-ação.

Os autores do relatório deixaram claro que seu objetivo não foi criticar as ações da polícia no local, mas melhorar as respostas futuras. Explicaram que o relatório detalha tanto as ações que funcionaram bem como aquelas que não funcionaram.

O relatório aponta que um dos primeiros policiais a responder passou pelo estacionamento da escola em alta velocidade. O suspeito ainda se encontrava naquela área, mas o policial não o viu. Se o policial tivesse dirigido mais devagar ou estacionado o veículo fora da propriedade da escola e se aproximado a pé, poderia ter visto o suspeito antes de que adentrasse o prédio.

Acredito que essa é a primeira lição para evitar a “visão de túnel” próximo ao local da chamada e escanear ao redor da área-alvo com nossos olhos e visão periférica. Os suspeitos podem estar esperando para emboscar policiais enquanto passamos, como já ocorreu em diversas ocorrências.

Momentos antes do atirador entrar na propriedade da escola, ele se envolveu em um acidente de trânsito nas proximidades. O relatório diz que um agente do Departamento de Polícia de Uvalde chegou ao local do acidente e observou o suspeito carregando um rifle, obviamente antes de chegar à escola.

Esse policial estava armado com um rifle, avistou o atacante e poderia intervir, no entanto, pediu ao seu supervisor permissão para atirar, o que não é cabível nesse tipo de ocorrência.

O relatório continua citando o Código Penal do Texas 9.32 “Força Letal em Defesa da Pessoa”, que estabelece que uma pessoa pode usar força letal quando acredita razoavelmente que isso é imediatamente necessário para proteger a si ou outrem contra o uso de força letal ilegal por outra pessoa, ou para evitar um sequestro, assassinato, agressão sexual, ou roubo.

O relatório segue dizendo que outro policial teria ouvido tiros e/ou relatos de tiros e observado um indivíduo se aproximando do prédio da escola armado com um rifle.


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Um policial razoável concluiria, com base na totalidade das circunstâncias, que o uso de força letal era justificado. Além disso, o relatório prossegue afirmando que o policial estava aproximadamente 148 metros da porta externa do salão oeste, onde o suspeito entrou na escola, distância que está dentro da faixa efetiva de uma plataforma AR-15.

O relatório reconhece que a decisão final de usar força letal é do policial que está no local. Se o policial não estava confiante em acertar o alvo, não deveria disparar. Mais uma vez chamo a atenção aqui para a necessidade de atiradores designados para esse tipo de atuação emergencial.

Outros tópicos observados no relatório:

  • Portas deixadas destrancadas pelos funcionários da escola (a regra nas escolas americanas é estarem trancadas);
  • Equipes de policiais dividindo-se causando preocupação com “fogo amigo”;
  • Problemas de comunicação entre os policiais de diversas agências (falta de comunicação integrada);
  • Os três primeiros policiais da Uvalde identificaram o problema como sendo uma ocorrência de reféns e não como uma situação de atirador ativo, adotando o procedimento padrão (infelizmente pouco se discute sobre o momento do caos e como o primeiro respondedor pode compreender o que realmente está acontecendo);
  • Os policiais no local não elaboram um “plano de ação” para a atuação necessária (o relatório discorre sobre os fatores de exigência que deveriam ter levado os policiais a executar um plano de ação imediato);
  • Falta de aplicação de Atendimento Pré Hospitalar (APH). O relatório concluiu que algumas pessoas que morreram possivelmente poderiam ter sido salvas se tivessem recebido cuidados médicos mais rapidamente;
  • Não foi estabelecido um comando efetivo, o que provavelmente prejudicou a atuação integrada.

Conclusão

O tiroteio na escola de Uvalde destaca a necessidade de treinamento contínuo de resposta a atiradores ativos para a polícia e a comunidade escolar. Infelizmente priorizamos a sequência de ações (procedimentos) sem compreender todas as fases da gestão de um incidente crítico complexo (prevenção, proteção, resposta, recuperação e mitigação).

A ocorrência não vai “cair na rede” como atirador ativo, portanto devemos treinar como as equipes de primeira intervenção devem compreender o problema e aplicar o remédio apropriado.

Tristemente, no Brasil não produzimos “relatórios pós ação com todas as agências envolvidas nos incidentes” a fim de extrair lições e criar protocolos integrados de atuação.

Análises pós-ação conduzidas por observadores independentes, com lições aprendidas documentadas, permitem que as agências de aplicação da lei avaliem objetivamente suas estratégias, políticas e procedimentos, o que pode aumentar a segurança dos policiais e da comunidade.

“Quem não estuda e aprende com o passado está condenado a repeti-lo”.

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7 comentários

  1. O Artigo acima só reforça a necessidade de muito treinamento e de uma resposta rápida e eficaz.
    Não podemos ficar presos a procedimentos sem ao menos saber em qual fase da crise estamos, é clara a necessidade de identificar o problema para ter a solução mais apropriada.
    Seria de suma importância que em nosso País adotasse a produção de “relatórios pós ação com todas as agências envolvidas nos incidentes” para criarmos protocolos integrados de atuação.

  2. Diante destes apontamentos, o quanto é necessário a prevenção do que é possível de acontecer ! Preparar a polícia e outros órgãos com técnicas. Treinamento constante envolvendo a todos que possa fazer parte de um cenário como esse. Mitigação!

  3. Temos que ter Policiais preparados , para todo tipo de ação , por isso investir no policial para ter bom treino e preparo, também preparo emocional pós ocorrência .

  4. Analisar as ocorrências passadas é aquirir parâmetros e procedimentos para que se houver uma ocorrência futura, os primeiros interventores e equipe tática, possam estar mais preparados evitando erros de visão em túnel ou até mesmo de aguardar a decisão de seus superiores para agir.

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