Ilusão da Conspiração: A praga do pensamento dos políticos – Parte 2

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O rei Abdullah II da Jordânia em entrevista à rede americana CNBC (Captura de tela/CNBC).

O rei Abdullah II da Jordânia em entrevista à rede americana CNBC (Captura de tela/CNBC).

Leia a Parte 1 deste artigo.


A ideia de uma “OTAN árabe”, originada no Egito há cerca de 50 anos, vem sendo atualizada para “OTAN do Oriente Médio” para incluir Israel, visando formar uma coalizão regional para enfrentar o Irã.


Mal se passaram 55 anos da Guerra Árabe-Israelense e os países árabes estão, um a um, normalizando suas relações diplomáticas com Israel. Ainda que alguns tenham iniciado esse relacionamento com emissão de vistos, aceitação de turistas e lançamento de voos comerciais, eles têm em mente uma cooperação militar e de segurança.

Alguns que trabalham na resolução da questão árabe-israelense gostam de utilizar uma ferramenta que parece surtir efeito até aqui: pintar uma cara assustadora do Irã na região. É claro que muitos fatores estiveram envolvidos na criação dessa imagem, e o papel de algumas facções pró-guerra não pode ser ignorado.

“OTAN árabe” como esperança

A “OTAN árabe” seria um acordo militar entre os países árabes. Talvez a última declaração que se possa encontrar sobre a formação desse pacto militar seja a declaração feita pelo rei da Jordânia em junho passado. Após sua visita aos Emirados Árabes Unidos, em entrevista ao canal americano CNBC, Abdullah II falou sobre o apoio de seu país à formação de uma “OTAN árabe” entre os países, com alinhamento similar à OTAN.

Respondendo a uma pergunta sobre a formação desse pacto, ele enfatizou que seria o primeiro a apoiar o lançamento da aliança e exigiu que os países com “pensamento semelhante” estabeleçam tal coalizão. Claro que, ao mesmo tempo, ele enfatizou que o acordo deve ter “missões claras e específicas”.

Ele também afirmou que os países “alinhados” do Oriente Médio vêm trabalhando há algum tempo para lidar com os desafios causados ​​pela guerra na Ucrânia e, a esse respeito, disse: “Vamos sentar e ver como podemos ajudar uns aos outros.”

O rei da Jordânia se referiu a um plano que veio à tona em 2017 durante o governo de Donald Trump. Embora, de acordo com matéria publicada pelo The Arab Weekly ontem, o Rei Abdullah II pareça demonstrar menos entusiasmo a respeito, a ideia de uma OTAN árabe não é nova e já se passaram pelo menos vinte anos desde o início dessa discussão entre os países da região. Sua origem remonta a cerca de meio século atrás e à ideia de formar uma força militar islâmica conjunta. Em 1965, o Rei Faiçal bin Abdul-Aziz, então governante da Arábia Saudita, convidou os países islâmicos a formar essa força, que mais tarde foi denominada “OTAN Islâmica”.

O objetivo era combater a influência do marxismo no território islâmico. Na época, embora Irã e Jordânia também concordassem com a criação dessa força, os requisitos necessários nunca foram alcançados e ela sempre permaneceu apenas como uma ideia. No entanto, com a continuidade das políticas dos Estados Unidos (EUA) para combater a influência iraniana na região, em 2017 a administração Trump e seus aliados árabes na Ásia Ocidental, incluindo Egito, Jordânia e Emirados Árabes Unidos, liderados pela Arábia Saudita, reiniciaram as negociações para estabelecer uma coalizão política e de segurança com o título “OTAN árabe”.

Embora os detalhes nunca tenham sido divulgados, de acordo com a Reuters o plano foi apoiado por autoridades árabes. Seus objetivos incluiriam aprofundar a cooperação na área de defesa antimísseis, treinamento militar, combate ao terrorismo e outras questões, inclusive o apoio às relações econômicas e diplomáticas. A Reuters afirmou que essa ideia é uma versão árabe da Organização do Atlântico Norte (OTAN) que inclui uma coalizão de países árabes sunitas, e previu que o conceito de uma “OTAN árabe” provavelmente aumentaria a tensão entre os EUA e o Irã xiita.

Um tratado que perdeu sua missão antes de ser formado

Basicamente deve existir uma potencial ameaça em comum para a formação de um pacto militar. Talvez a ameaça do Irã tenha sido uma motivação para esse acordo. O Irã, país com o qual a possibilidade de um conflito militar foi levada a sério em um projeto iranofóbico.


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Claro, alguns analistas políticos acreditam que lutar contra o terrorismo e lidar com movimentos políticos relacionados a países não árabes em países árabes é um dos objetivos de uma “OTAN árabe”. No entanto, se listarmos os países em torno de tal acordo, não há uma definição abrangente em comum a esse respeito e muitas vezes alguns apoiam movimentos que outros consideram terroristas.

Portanto, a justificativa mais comum para esse pacto nos últimos anos tem sido a hostilidade em relação ao Irã, apesar de vários desses países, incluindo Catar, Omã e Kuwait, não considerarem a República Islâmica do Irã como uma ameaça à segurança e estabilidade da região, citando evidências políticas e econômicas. Esses países querem ter relações melhores e mais estáveis ​​com o seu vizinho do outro lado do Golfo Pérsico, e o maior desejo político dessas três nações é uma solução abrangente para questões que serão seus problemas futuros.

Os Emirados Árabes Unidos, que vem considerando elevar o nível das interações políticas com o Irã a ponto de enviar novamente um embaixador pela primeira vez em sete anos, mostraram que pensam em normalizar suas relações com o Irã.

Em relação à Arábia Saudita, o maior membro do pacto, a situação é a mesma. A mediação do primeiro-ministro iraquiano Mustafa Al-Kadhimi entre os sauditas e o Irã vem valendo a pena, já que ambos estão próximos de dar um passo diplomático para “derreter o gelo” após meses de negociações secretas em Bagdá.

Vale ressaltar que desde o anúncio do primeiro encontro entre Irã e Arábia Saudita na capital iraquiana em abril de 2021, as partes relevantes nessas negociações não estabeleceram prazo algum para suas atividades. Isso permitiu que Bagdá tivesse tempo suficiente para completar a missão. Nasser Kanaani, o novo porta-voz do ministério das Relações Exteriores do Irã, disse a jornalistas dias atrás, em uma reunião semanal, que o resultado das negociações com a Arábia Saudita foi encorajador.

“OTAN árabe-israelense”, objetivo final dos idealizadores

A ideia de uma “OTAN do Oriente Médio” é a versão atualizada da “OTAN árabe”, na qual a filiação e a centralidade de Israel justificariam a mudança de nome. Na verdade, a “OTAN árabe” foi uma ideia egípcia que Mohamed Hussein Tantawi, então ministro da Defesa do Egito, propôs em junho de 1988; sua formação chegou a ser anunciada por Abdul Fatah Khalil Sisi, então presidente egípcio, em fevereiro de 2015 durante uma viagem à Jordânia; e foi mencionada novamente por Donald Trump antes de sua visita a Riad em maio de 2017. Recentemente, a ideia foi promovida a “OTAN do Oriente Médio”, com o objetivo de ajudar a avançar na sua formação.

Ela pode ser considerada um dos objetivos da recente viagem de Joe Biden à região após a considerável expansão das relações árabe-israelenses. Nos últimos anos o Ocidente, em especial os EUA à sombra da iranofobia, conseguiram fazer com que os países árabes, um a um, normalizassem suas relações com Israel. Hoje, os governos da Jordânia e da Tunísia também se voltaram para a normalização das relações com Israel depois dos Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Sudão, Arábia Saudita e o Maghreb.

A febre da comunicação com Israel aumentou tanto entre os árabes que às vezes os nomes de Omã, Catar, Kuwait e Iraque também são incluídos nessa lista. Embora os estadistas ainda não tenham preparado a opinião pública desses países para essa mudança na política internacional, e mesmo que os governos do Catar e Omã, e os parlamentos do Iraque e do Kuwait tenham negado essa questão, o fato é que os países árabes cujas relações com Israel foram aprimoradas também a negaram a princípio, e nunca consultaram seus povos para tomar uma decisão.

Quais países irão aderir a esta tendência no futuro pode ser um ponto importante, mas na realidade, o principal é que o Irã é vizinho dessas nações e Israel é um país transregional. Assim, esse vizinho é e sempre será, sem dúvida, uma característica permanente ao longo da história.

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