Por Albert Caballé Marimón* |
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Erdogan pode ter cometido um erro de cálculo na Síria e se enganado com Putin. E isso pode ter arruinado a “amizade” que tinham. Poderia também significar que as sempre cuidadosamente planejadas jogadas do homem forte da Rússia talvez não saiam exatamente como planejado desta vez.
Vladimir Putin pode estar com pressa para declarar vitória na Síria. Depois de salvar o regime de Bashar Al-Assad, o único obstáculo para essa declaração é a província de Idlib, que as forças anti-Assad ainda controlam.
O líder russo está trabalhando para concluir a alteração na constituição da Rússia em um plebiscito nacional marcado para o dia 22 de abril. A emenda deve garantir que ele mantenha protagonismo sobre o sistema político e as principais e decisões do país além do término de seu quarto mandato em 2024. No entanto, pesquisas de opinião pública indicam que os russos estão insatisfeitos com os conflitos militares em que a Rússia está envolvida no exterior; assim, sair da Síria seria positivo para Putin, um movimento que ajudaria a melhorar sua situação internamente.
O presidente russo também pretende melhorar suas relações com a União Europeia e convencer os europeus a pressionar a Ucrânia a aceitar os termos da Rússia para encerrar o conflito no leste da Ucrânia, região que, efetivamente, está sob controle de Moscou.
Seu plano seria simples. Pacificando a Síria e retirando as forças russas do país, ele obteria duas vantagens: melhorar sua situação interna e obter a colaboração do Ocidente na consecução de seus objetivos. Mas para conseguir isso tudo, Putin teria que sair rapidamente do atoleiro sírio. Daí a pressa.
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No entanto, o ataque aéreo que matou 33 soldados turcos, colocando a Rússia e a Turquia à beira de um confronto militar direto, pode prejudicar seus planos de uma retirada rápida, deixando Moscou em rota de colisão com Recep Tayyip Erdogan, o presidente turco que, até há algumas semanas, parecia um aliado.
O discurso oficial, tanto em Damasco como em Moscou, é que o ataque foi realizado pelos sírios, que atingiram as forças armadas turcas em uma região em que não deveriam estar. Mas há uma forte suspeita de que os ataques partiram da Força Aérea Russa, que fornece cobertura aérea e apoio às forças terrestres de Assad e detém superioridade aérea na região. Ancara não quer culpar Moscou abertamente e arriscar um confronto militar com Putin. Erdogan não quer isso, e a OTAN também não.
Mas não deixa de ser irônico que Erdogan, que passou os últimos anos ignorando os EUA e os aliados ocidentais, comprando sistemas de defesa aérea russos e organizando negociações de paz para a Síria em Sochi, na Rússia, agora precise do apoio da OTAN e dos EUA frente as ações de Putin.
Em recente entrevista à rede americana CNN, Hulusi Akar, Ministro da Defesa da Turquia, disse que “Pode haver apoio de uma bateria de Patriot”, confirmando que foi feito um pedido. Ele disse que se houver apoio semelhante de aliados europeus, a Turquia também consideraria, e acrescentou que “A Turquia está determinada a usar a força para garantir um cessar-fogo em Idlib”, e que “A Rússia não deve intervir nas ações da Turquia em Idlib; a Turquia não tem intenção de enfrentar a Rússia”.
No entanto, até ontem ainda não havia resposta dos EUA ao pedido, que foi transmitido a James Jeffrey, emissário dos EUA para a Síria.
Na tentativa de obter apoio ocidental, Erdogan abriu as fronteiras da Turquia para que cerca de um milhão de refugiados da sírios entrem na União Europeia. Omer Celik, porta-voz do partido de Erdogan, disse que “a Turquia não é mais capaz de reter refugiados” após o ataque em Idlib. O anúncio ocorreu enquanto cerca de trezentos imigrantes atravessavam o noroeste da Turquia em direção às fronteiras com a Grécia e a Bulgária.
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Erdogan enxerga essa ameaça como uma ferramenta para tentar forçar os líderes europeus a pressionar Putin, mas o tiro pode sair pela culatra: ele se arrisca a perder bilhões em financiamentos da UE, como parte do acordo feito para manter as fronteiras da Turquia fechadas.
Obviamente, o fato de Erdogan ter despendido tempo e esforço distanciando-se da OTAN e da UE e agora pedir sua ajuda não passou desapercebido pelos russos. Ainda assim, a estratégia de Putin pode dar errado se Erdogan forçar a aposta e continuar com uma ofensiva contra o exército sírio e empregar a força aérea da Turquia.
O conflito ainda pode terminar de forma satisfatória para Putin se ele agir rápido o suficiente para impedir qualquer ação turca. Um bombardeio maciço em Idlib possivelmente teria esse efeito. Ou talvez ele tenha chegado a algum acordo com Erdogan na conversa telefônica que tiveram na sexta-feira.
No entanto, a longo prazo Putin pode ter criado problemas para si mesmo. É provável que Erdogan nunca se esqueça dessa humilhação. O episódio o enfraqueceu tanto internamente, na Turquia, como frente aos EUA e aliados da OTAN. Ele poderia restaurar suas relações com a aliança e não cessar as hostilidades com o regime de Assad, o que significaria que o objetivo de Putin de deixar a Síria pode não se realizar – pelo menos não a curto prazo.
Com informações da Deutsche Welle.
*Albert Caballé Marimón possui formação superior em marketing, é fotógrafo profissional e editor do blog Velho General. Já atuou na cobertura de eventos como a Feira LAAD, o Exercício CRUZEX e a Operação Acolhida. É colaborador da revista Tecnologia & Defesa e do Canal Arte da Guerra, onde, entre outras atividades, mantém uma resenha semanal de filmes e documentários militares. Entre suas atividades, já proferiu palestras para os cadetes da Academia da Força Aérea. Pode ser contatado através do e-mail caballe@gmail.com.
Será que essa ação tem o mesmo peso da derrubada de um SU-24 pelos Turcos alguns anos atrás?
Não sei, mas mostrou que Erdogan está isolado. Obrigado por comentar, um abraço!
Republicou isso em OSROC7 – Segurança & Defesa.