Por Luiz Eduardo Rocha Paiva* |
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Um episódio da FEB na Itália: passagem extraída do livro Crônicas de Guerra do tenente-coronel Olívio Gondim de Uzêda, comandante do 1º Batalhão do 1º Regimento de Infantaria, o Glorioso Sampaio, transcrita pelo general Luiz Eduardo Rocha Paiva.
Certa feita recebemos ordens de substituir com o nosso Batalhão o destemido Esquadrão de Reconhecimento sob o comando do bravo capitão Pitaluga. O inverno já se avizinhava e nesse setor devíamos aguardar a primavera para o reinício de novas ofensivas. Ante isso o comando do Batalhão resolveu: colocar em linha duas companhias de fuzileiros (Cia Fzo); deixar em reserva a restante; reforçar as companhias em linha com elementos de morteiros 81 mm, de metralhadoras pesadas e um canhão 57 AC; fechar os intervalos na linha de frente com minas e redes de arame; fazer periodicamente, a título de repouso, um rodízio entre a Cia reserva e uma das do 1º escalão. E assim foi realizado!
Entretanto, o Fritz não gostou muito da troca que lhe revelaram seus magníficos observatórios [dominantes] e nos bombardeavam de quando em vez, de preferência pela manhã e ao entardecer. Uma tarde, lançaram 494 granadas de artilharia num único pelotão da nossa companhia da direita. Por último, todo dia, às seis horas, os alemães traziam três tanques para o povoado de Pietra Colora que nos defrontava e “passava em revista” toda a nossa linha de frente. Quando pedíamos tiros à Artilharia já era tarde, eles tinham fugido.
Eis quando o comandante do Batalhão chama o primeiro-tenente Paulo Paiva [meu pai], destemido comandante do Pelotão de Canhões anticarro [eram os pesados canhões 57 AC sobre rodas], um apaixonado pela sua arma; diz-lhe que, a despeito do péssimo estado das estradas cobertas de neve, estreitas e com rampas fortíssimas e malgrado a observação inimiga, tornava-se mister a colocação de um canhão 57 nas primeiras linhas. O tenente Paiva procurou e descobriu bois, construiu estradas e, sob o manto protetor da noite, cumpriu a missão. Fez mais, conseguiu dez granadas explosivas não sabemos onde. Em seguida, o comandante do batalhão disse ao tenente Paiva que sua missão era destruir os tanques de Pietra Colora na madrugada do dia seguinte. Fez mais, combinou com o dedicado tenente-coronel Gorreta um conjunto de tiros para o mesmo momento e distribuiu missão às metralhadoras e morteiros do Batalhão para a mesma hora.
Às 05h45 do dia seguinte, antes que os tanques iniciassem sua “brincadeira”, o batalhão fez um verdadeiro São João.
Não havia um ponto da frente alemã que não fosse contemplado com um tiro! O feitiço contra o feiticeiro. Nós é que fizemos a alvorada. Surgiram os tanques e o sargento Azevedo, comandante de uma peça de canhão 57, mandou-lhes uma rajada de granadas explosivas. Os tiros da artilharia e dos morteiros eram absolutamente precisos. Alarmou-se o inimigo, julgando-se sob a preparação de um vultoso ataque a iniciar-se imediatamente. Desencadeou sua barragem, soltou uma série de sinais luminosos, movimentou-se e denunciou suas posições. As metralhadoras do batalhão caçavam os “super homens”. O canhão 57 atingiu um tanque. Desde então, o Fritz diminuiu seu entusiasmo. Nossas armas deixaram suas posições suplementares [para esta ação] e voltaram às posições principais. O comandante do Batalhão mandou para o tenente-coronel Gorreta uma caixa de cigarros “Londres”, presente do tenente Gonçalves, como retribuição ao precioso auxílio da Artilharia.
*Luiz Eduardo Rocha Paiva é general-de-brigada , aspirante a oficial pela AMAN em 1973 e promovido a general-de-brigada 2003. Entre seus muitos altos estudos, possui doutorado, mestrado e pós-graduação pela ECEME, ESAO e FGV. Estagiou na 101ª Air Assault Division, do Exército dos EUA, foi Observador Militar da ONU em El Salvador e fez o Curso de Estado-Maior na Escola Superior de Guerra do Exército Argentino. Comandou o 5º Batalhão de Infantaria Leve (Regimento Itororó), em Lorena/SP, quando cumpriu missão de pacificação em conflito entre o MST e fazendeiros no sul do Pará, em 1998. Foi Chefe da Assessoria Especial do Gabinete do Comandante do Exército, comandou a ECEME e foi Secretário-Geral do Exército. É Professor Emérito da ECEME, membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e colaborador do Centro de Estudos Estratégicos do Exército. Recebeu diversas condecorações e medalhas nacionais e estrangeiras e publica artigos sobre temas políticos e estratégicos em jornais e revistas nacionais e estrangeiras.
Esses meus conterrâneos de outros, Fritz, me fazem rir. Os brasileiros, como sempre, pregando uma peça.
O texto é muito gostoso de ler, e é uma história tipicamente brasileira. Grato por comentar, forte abraço!
Saudades do “Leão de Ouro”! Em 1981, fui infante na 2ª Cia 1º Pel. Do destemido “Regimento Sampaio”. Aprendizado nunca mais esquecidos por toda vida: amizade, companheirismo, união, coragem, disposição e acima de tudo o amor pela pátria e os símbolos nacionais. Amor esse, esquecidos pelas novas gerações. E, SAMPAIO!!! Padroeiro da Infantaria (Rainha das Armas). Quem é forjado nessa arma, nunca será um covarde ‘Uma vez infante… Infante para o resto da vida”. Minha continência a esta Briosa OM do Exercito de Caxias. Monteiro (108)
SELVAAAAA!!!!
Orgulho mais do que justificado Junior! Parabéns! Grato por comentar, um forte abraço!
Fevereiro de 1945, Brumas do Monte Castelo
Artigo publicado no Jornal do Comércio de Porto Alegre/RS
Véspera do ataque, um tenente comandante de pelotão de petrechos do Regimento Sampaio está agoniado. Seu estado físico desaconselhava arremeter com seus pracinhas o morro maldito. O comandante do batalhão já pensava em substituí-lo, mas o jovem estava decidido: participaria da luta como soldado, se deslocado do comando de sua fração. Neste interim, outro tenente, este comandante de pelotão de canhões anti-carro, armamento sem previsão pelo terreno impróprio para carros de combate, se oferece para juntar-se ao amigo esfalfado e galgar junto com ele a elevação.
E assim foi. São 6 horas da manhã. Infantaria brasileira em guarda! Calar baionetas! O 1º RI-Regimento Sampaio vai fazendo a escalada debaixo de metralha, pagando seu tributo de sangue. Eis que, 16h20min, a artilharia divisionária concentra fogo sobre o Monte Castelo. Começava o anoitecer, noite de inverno europeu chega num repente. A posição inimiga, sob um dilúvio de fogo, logo será assaltada por uma infantaria auriverde ensandecida.
Como tantos, o bravo tenente Godofredo, completamente esgotado, se manteve na liderança de seus homens durante todo o ataque. Com ele, sempre, seu irmão em armas, o tenente Campos Paiva. Às 17h45min, com o assalto já em fase final, a artilharia alonga fogos, permitindo aos infantes fazer a limpeza final do butim de guerra e o preparo para um eventual contra-ataque.
Quando da reorganização, os dois oficiais estão juntos num abrigo confraternizando. É quando um mensageiro vem avisar Campos Paiva. O comandante do batalhão queria ter com ele. Os amigos se despedem. Posteriormente, mais à retaguarda, este se depara com soldados observando um saco ensanguentado. Curioso, ele indaga sobre aquele corpo. A tristeza calou fundo, ali estava seu amigo. Um obus inimigo explodira no abrigo que ambos ocupavam, vitimando Godofredo. Era 21 de fevereiro de 1945! Quantos brasileiros sabem dessa data? Ah! Mas 12 de junho, desta ninguém esquecerá! Povo sabido este nosso!
Paulo Ricardo da Rocha Paiva
Coronel de Infantaria e Estado-Maior