O Fantasma da Floresta: O Papel Dissuasório da 3ª Cia de Operações Especiais do EB na Amazônia

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Imagem meramente ilustrativa, gerada por inteligência artificial.

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Análise do papel dissuasório da 3ª Cia de Operações Especiais na Amazônia, traçando paralelos históricos com táticas de resistência; a existência e capacidade dessas forças de elite, apoiadas por logística avançada, inibe adversários e defende a soberania.


“Árdua é a missão de desenvolver e defender a Amazônia. Muito mais difícil, porém, foi a de nossos antepassados em conquistá-la e mantê-la.” – General-de-Exército Rodrigo Octávio.

Este artigo investiga o papel dissuasório da 3ª Companhia de Operações Especiais do Exército Brasileiro, traçando paralelos com o emprego histórico de forças especiais no Monte das Tabocas para combater a presença holandesa. O estudo preenche uma lacuna na literatura de defesa, que subestima a dissuasão não-convencional. A metodologia empregada é a análise histórica comparativa e a avaliação doutrinária para demonstrar como a capacidade de infiltração, ação direta e guerrilha se tornam um meio para dissuadir potências estrangeiras e grupos criminosos na Amazônia. O objetivo é estabelecer que a mera existência de uma força de elite, com raízes em táticas de resistência, serve como um fator de dissuasão estratégico, influenciando o cálculo de riscos de potenciais adversários.

Introdução

Durante a semana de 25 a 29 de agosto de 2025, tive a honra de participar, em uma visita acadêmica pelo Programa de Pós-Graduação em Segurança Internacional e Defesa da Escola Superior de Guerra (ESG) junto com estagiários de alta vibração do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), o Comando Militar da Amazônia (CMA), o Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), o 9º Distrito Naval, o CINDACTA IV e os Fuzileiros Navais no 1º Batalhão de Operações Ribeirinhas (1º BtlOpRib).

Aquela experiência imersiva não foi apenas uma oportunidade de aprofundar conhecimentos sobre a defesa e a soberania do Brasil na região, mas também de testemunhar a complexa sinergia entre a estratégia militar e a logística de ponta. A viagem, por si só, foi um feito de projeção de poder, realizada a bordo do KC-390 Millennium, o ápice da engenharia aeronáutica brasileira, voando com o Esquadrão Gordo (1º/1º GT).


FIGURA 1: Foto tomada após o pouso do KC-390 na Base Aérea de Manaus (BAMN) partindo do Galeão-RJ. Estagiários do CAEPE 2025 e mestrandos do PPGSID 2025 (Acervo do autor).

KC-390 e Esquadrão Gordo

Pois bem, a bordo da aeronave, símbolo de modernidade e capacidade, pude refletir sobre a importância da logística para a defesa. A capacidade do KC-390, de transportar 26 toneladas de carga e operar em pistas curtas e não preparadas, é um diferencial estratégico para o Brasil. A aeronave não apenas fortalece a capacidade da Força Aérea Brasileira (FAB) de realizar transporte de tropas, cargas e suprimentos, mas também permite que o país atue de forma proeminente em missões humanitárias, como as que o Esquadrão Gordo tem realizado nos últimos 60 anos, levando ajuda a países afetados por desastres naturais e participando de missões de paz e resgates.


FIGURA 2: Emblema do 1º/1º Grupo de Transporte (1º/1º Grupo de Transporte – Esquadrão “Gordo”. Rudnei Dias da Cunha. Disponível em: https://historiadafab.rudnei.cunha.nom.br/2021/01/06/1o-1o-grupo-de-transporte-esquadrao-gordo/).

O voo sobre a vastidão da Amazônia a bordo do KC-390, além da emoção contida, me fez refletir e ponderar sobre a complexidade e os desafios impostos pela dimensão da região. A capacidade de projetar poder e garantir a presença do Estado em áreas remotas é fundamental. Nesse contexto, a atuação do 3º Companhia de Operações Especiais (3º CIOpEsp) se destaca como um componente crucial. Enquanto o KC-390 assegura a logística e o alcance, as forças especiais garantem a discrição e a precisão necessárias para enfrentar ameaças que não podem ser combatidas apenas com poderio aéreo ou tropas convencionais.

Homenagem à FAB e Embraer

Embora o tema seja Forças Especiais do EB, não posso deixar de registrar e homenagear a Força Aérea Brasileira (o Esquadrão Gordo, o CINDACTA IV e a Base Aérea de Manaus, BAMN) e a Marinha do Brasil (9º Distrito Naval e Flotilha da Amazônia) para o cumprimento da logística de alimentos, material, medicamentos, busca e salvamento e evacuação médica para o Comando Militar da Amazônia, notadamente para os Pelotões Especiais de Fronteira e as Brigadas de Infantaria de Selva, que em muitos municípios e áreas de fronteira somente tem acesso por via marítima e aérea.

Com efeito, homenageia-se tanto a FAB quanto a EMBRAER pela realização máxima da engenharia aeronáutica brasileira, recordando que a EMBRAER foi idealizada pelo Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) criado em 1946 e pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) criado em 1950, por engenheiros do Instituto de Engenharia do Exército por meio do coronel Casimiro Montenegro Filho.

O KC-390 [1] é uma aeronave de assalto multimissão de lançamento de tropas e materiais, combate a incêndio, busca e resgate, evacuação médica, operações humanitárias, capacidade de reabastecimento em voo (REVO) ou ser reabastecido (PROBE), com blindagem contra projéteis 7.62 mm, com radar tático meteorológico e de vigilância, sistema avançado de comunicação criptografada com salto de frequência, sistema de alerta de mísseis e radares inimigos (RWR e MAWS), e em caso de ataque pode liberar chaffs e flares contra mísseis teleguiados por radiofrequência ou infravermelho.

Os pontos altos da engenharia aeronáutica do KC-390 foram seu trem de pouso feito por uma liga de aço-titânio, seu sistema de comando de voo fly-by-wire, sua estrutura capaz de suportar altas vibrações, sua não necessidade de uso de pista regular, ou seja, opera em pistas semipreparadas, curtas e irregulares para pouso e decolagem, inclusive em áreas de climas extremos como a Antártida e a região Amazônica.


FIGURA 3: O KC-390 na pista (Foto cedida por Santos Machado).

Ademais, cabe sublinhar o papel do Esquadrão Gordo, criado em 18 de fevereiro de 1953, mesma dia e mês do meu aniversário, pela FAB para realizar as principais missões no Brasil e no exterior. Nos últimos 60 anos, o 1º/1º GT tem desempenhado um papel essencial em operações de transporte aéreo e apoio logístico, consolidando-se como peça-chave na aviação de transporte da FAB.

Segundo reportagem [2] dos 60 anos do 1º/1º GT pela revista Defesa Aérea & Naval por Luiz Padilha, ele é uma das unidades mais tradicionais e estratégicas da Força Aérea Brasileira (FAB), com missão essencial para as operações logísticas. Suas responsabilidades incluem o transporte de tropas, cargas e suprimentos, além de missões de apoio humanitário, defesa e resgate.

Ao longo dos anos, a unidade tem se destacado em momentos de crise, enviando ajuda humanitária a países afetados por desastres naturais e realizando missões de transporte em zonas de conflito, consolidando-se como pilar fundamental para a projeção de poder e assistência do Brasil no cenário global. Com sede no Rio de Janeiro-RJ, na Base Aérea do Galeão, o Esquadrão Gordo tem desempenhado um papel fundamental em diversas operações, tanto no território nacional quanto no exterior.

O Esquadrão Gordo opera a aeronave KC-390 Millennium, um vetor de última geração desenvolvido pela Embraer, que trouxe um salto significativo em termos de capacidade e versatilidade. Com a capacidade de transportar até 26 toneladas de carga, o KC-390 é ideal para missões de transporte estratégico e pode operar em pistas curtas e não preparadas.

Isto posto, em regiões longínquas como a Amazônica todo o apoio logístico às Unidades Militares, como os Pelotões Especiais de Fronteira (PEF) e a população ribeirinha, na sua maioria constituída de indígenas, se dá pelos modais aéreo e fluvial. Nesse escopo, a FAB cumpre sua missão utilizando seus meios aéreos, caracterizados pelo deslocamento rápido e de grande alcance.

A Visita ao Centro de Instrução em Guerra na Selva

Voltando a nossa viagem acadêmica, foi no CIGS, berço de uma doutrina de guerra adaptada à selva, que a relevância de nossa visita se tornou mais evidente. A capacidade de um pequeno grupo de elite como o CIGS e a Força 3, operando de forma autônoma e silenciosa, tem um poder dissuasório que vai além de sua dimensão numérica.

A ameaça de uma resposta invisível e letal é, por si só, um fator de contenção para adversários que buscam explorar vulnerabilidades na Amazônia. Este artigo, portanto, busca explorar o papel dissuasório da Força 3 sem subestimar o papel dos Guerreiros de Selva em guerra de resistência ou reconquista de território, analisando como a sua doutrina se integra à projeção de poder do Brasil e como a sua mera existência serve de aviso para aqueles que desejam desafiar a soberania nacional.


FIGURA 4: O autor, na Brigada de Infantaria de Selva (esq.) e com o KC-390 ao fundo (dir.) (Acervo do autor).

Capacidade Dissuasória da Força 3 (3ª Cia de OpEsp)

Superando a história do Comando de Operações Especiais (COpEsp) e de sua organização, por ser de fácil consulta, e partindo para a doutrina operacional das Forças Especiais, que são compostas por militares altamente treinados, armados e equipados para operações militares tradicionais (força igual ou menor) e assimétricas (forças armadas tecnologicamente superiores, em números ou material), de alto risco operacional e institucional, realizado com grande sigilo e coordenadas nos níveis estratégicos, táticos e operacionais, não servem a partidos políticos e sim ao Estado Brasileiro. Não devem ser subutilizadas nem superestimadas, podem ser empregadas em tempos de paz ou na iminência, durante e depois da deflagração de conflitos armados, buscando objetivos de alto valor nos níveis estratégico, tático e operacional.

Segundo Schwalb, a 3ª Companhia de Forças Especiais (3ª Cia F Esp) é a tropa que opera em prol do Comando Militar da Amazônia (CMA) em ações de alta complexidade, sendo empregada em inúmeras missões dentro do escopo das operações especiais, as quais podem ser subdivididas em ações diretas, ações indiretas e de reconhecimento especial.


FIGURA 5: Fronteiras do Comando Militar da Amazônia (Schwalb, p.24).

Destarte, a criação da 3ª Cia F Esp, no ano de 2003, representou um avanço com relação ao emprego de tropas de operações especiais na região amazônica. No entanto, nos dias atuais, a referida Organização Militar ainda opera apenas com um Destacamento Operacional de Forças Especiais. Neste contexto, este trabalho será conduzido de forma a verificar a necessidade de reestruturação física e organizacional daquela subunidade, a fim de potencializar suas ações em proveito do CMA.

Diferente do que propagam filmes, livros e séries sobre operadores de forças especiais, na maioria das vezes as ações na retaguarda profunda do inimigo via reconhecimento especial se dá em trajes civis, por meio de multiplicação de força, com uso de disfarces, obtendo os dois minutos necessários para o emprego da surpresa tática, por meio de vários armamentos, instrumentos e sistemas de armas altamente tecnológicos, seja para obtenção de superioridade de informação via levantamento de inteligência, seleção e aquisição de alvos estratégicos de alto valor, seja para sabotagem, infiltração e resgate de materiais ou pessoas.

Respeito ao Direito Internacional dos Conflitos Armados no Emprego de Forças Especiais

Grande parte das ações das Forças Especiais colimam cumprir os princípios do Direito Internacional dos Conflitos Armados (necessidade, humanidade, proporcionalidade, limitação e distinção) em causar o menor dano possível, isto é, vencer a guerra ou conflitos armados com as menores baixas e menor perda de material possível, com base no binômio paradoxal: economia de forças + concentração de forças, mapeando os pontos vulneráveis do oponente, agindo preventivamente por meio dissuasório e com Operações Psicológicas (princípios de credibilidade, oportunidade, progressividade, continuidade, coerência, antecipação, ofensividade, flexibilidade, eficácia, unidade comando, adequabilidade e objetividade).


FIGURA 6: Manual de Campanha. Operações Psicológicas. 3ª Edição, 1999. p.66 (Exército Brasileiro).

O origem do Exército Brasileiro se confunde com as ações de comandos (ações diretas) e as operações especiais (ações indiretas) levadas a cabo pelos patronos dos Comandos (Francisco Padilha) e das Forças Especiais (Antônio Dias Cardoso).

Origem do Exército Brasileiro nas Ações de Comandos e Operações Especiais

Em As Batalhas dos Guararapes: Descrição e Análise Militar, obra de fôlego e da maior relevância na história militar brasileira, analisada à luz da Arte Militar, do coronel Claúdio Moreira Bento, presidente da Academia de História Militar Terrestre, fica claro que Antônio Dias Cardoso e Francisco Padilha, aquele fazendo uso de princípios de forças especiais e este de comandos, levaram à derrota uma potência militar europeia sob a égide do general Francisco Barreto de Meneses, com a estratégia direta luso-brasileira, pelo menos 150 anos antes de Napoleão, primeiro via guerra de resistência ou de emboscadas com táticas nativas brasileiras causando pavor aos holandeses, (que cometeram erros táticos e doutrinários sob a égide do general prussiano Von Schkopp), que não estavam preparados para o relevo do país, seus militares estavam sedentários e sem resistência física, tornando-se alvo fácil para criar um ponto fraco no dispositivo holandês e sobre ele concentrar forças.

Ainda no prefácio, Luiz Ernani Caminha Giorgis destaca que lembrar de ‘Guararapes’ é necessário em tempos de ameaça à soberania da Amazônia, como ocorreu com a Tríplice Aliança e com a Força Expedicionária Brasileira:

Finalmente, o espírito de Guararapes é necessário na época atual, em que enfrentamos ameaças potenciais à outra região do país, a Amazônia. O mesmo denodo que houve nas Guerras Holandesas será necessário agora, e no futuro próximo. Com o espírito na Amazônia, não esqueçamos as lições de Guararapes, que foram recordadas pelo Visconde de Porto Seguro para motivar os soldados brasileiros que combateram na Guerra da Tríplice Aliança e, na 2ª Guerra Mundial, pelo general Mascarenhas de Morais, o comandante da Força Expedicionária Brasileira (FEB) que, nos Montes Guararapes, buscou inspiração e motivação para si e seus soldados, antes de partir para a Itália e que, ao retornar vitorioso, depositou os louros da vitória nos montes Guararapes.

O coronel Cláudio Bento em outra obra digna de ser lida e relida por todos os militares e profissionais de defesa, Brasil: Pensadores Militares Terrestres (2019:48) onde ressaltou a brilhante manobra de flanco do marechal Luiz Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias) em Piquirici “através do chaco, onde correu o risco calculado ao sacrificar o princípio de guerra da segurança em benefício da surpresa que obteve em nível estratégico ao desembarcar de surpresa na retaguarda profunda do inimigo”, abreviando o conflito, poupando recursos humanos e materiais, no maior conflito ocorrido na América do Sul.

Ao longo da história, não foi pacífica a aceitação do Brasil sob dominação portuguesa, sofremos investidas de franceses, holandeses e ingleses, tivemos vários problemas de questionamento internacional sobre a soberania brasileira sobre a região amazônica, como a tentativa de ocupação inglesa de Santos e da Foz do Amazonas pelos ingleses de 1613 a 1637, como atesta Carlos de Meira Mattos em seu clássico Geopolítica (vol. III, 2011:346), que afirmou: “com a expulsão dos holandeses em 1654, terminaram as principais tentativas militares europeias de conquista do nosso território.

Perspectiva Geopolítica da Amazônia

Também Terezinha de Castro [3], em artigo intitulado Amazônia – Geopolítica do Confronto e Geoestratégia da Integração, já sublinhava que a Amazônia, embora conquistada pelos portugueses no século XVII, integrada ao espaço político brasileiro no século XVIII e descoberta pelo mundo no século XX, alertava ela (p.05) que: “as intromissões externas são reflexos das omissões internas”, acentuado com a criação do Instituto da Hiléia Amazônica, cuja ação defendida por Terezinha é atacá-lo como problema geopolítico e geoestratégico.

As asserções de Terezinha continuam ainda hoje valendo como alerta e elevado espírito de vigilância e monitoramento:

A cobiça internacional vem procurando manter a Amazônia no atraso, nada de ação… só conservação. Temos que reagir para agir. Não se pode pensar em desenvolvimento sem transporte e energia.

Frederico Inácio Barros Filho em sua especialização em ciências militares na ECEME (Escola de Comando e Estado Maior do Exército) A influência do pensamento geopolítico brasileiro na estratégia nacional de defesa para a Região Amazônica [4], aborda a geopolítica de Golbery do Couto e Silva, Meira Mattos e Terezinha de Castro sobre a Amazônia. No percurso histórico o autor recorda o papel de José Bonifácio de Andrada e Silva, ao propor e defender a interiorização da capital e a criação de uma rede de estradas que ligariam a capital às demais cidades do país.

Cita o capitão Mario Travassos, que sempre lutou pelo status de potência regional do Brasil e para isso era preciso planejar e executar uma política de transporte terrestre, objetivando ligar os países vizinhos, criando um corredor entre o Atlântico e o Pacífico, pela transposição dos Andes.

Cita o brigadeiro Lysias Augusto Rodrigues, defensor da criação de um sistema viário nacional, com forte participação do transporte aéreo, principalmente para ligar a Amazônia e as regiões limítrofes.

Destaque-se que o general Golbery, cujos ideais de rearticulação do território, busca constante pela integração nacional e desenvolvimento de todo o país foram materializados nos governos militares, tinha um olhar diferente para a Amazônia, justamente pelas suas dimensões e seu interesse mundial.

Para o general Meira Mattos, a geopolítica brasileira que tinha como princípios basilares o desenvolvimento socioeconômico da Amazônia, a integração nacional, a defesa do território com a presença de efetivos adestrados, principalmente na Região Amazônica.

As mais recentes são a do presidente Francês de 2019, como se pode ver da reportagem [5]: Para Macron, Amazônia é “bem comum” e pede “mobilização de potências” contra desmatamento. recordando que temos a maior fronteira com a França na Guiana Francesa, que não é território independente e sim território francês, ou seja, temos fronteira com um país da OTAN.

Quanto ao Ambiente Nacional a Política Nacional de Defesa (2.2.11) dispõe:

A enorme extensão territorial da Amazônia brasileira, sua baixa densidade demográfica e as dificuldades de mobilidade, bem como seus recursos minerais, seu potencial hidroenergético e a valiosa biodiversidade que abriga, exigem a efetiva presença do Estado, com vistas à sua defesa e à sua integração com as demais regiões do país, contribuindo para o desenvolvimento nacional. A presença de recursos hídricos, minerais e energéticos, bem como toda a indústria bilionária que se beneficia disso, como cosmética, farmacêutica, bens industriais, etc.

Registre-se a ação militar contra a Colômbia em 26 de fevereiro de 1991, na Operação Traíra, frente a guerrilheiros das FARC, contra um destacamento brasileiro, causando três mortes e nove feridos, cuja resposta decisiva e proporcional do Exército Brasileiro contou com o emprego das Forças Especiais.

Houve também ocasiões de contato direto entre o Brasil e países fronteiriços, como contra a Venezuela em fevereiro de 1993 na Operação Maturacá, em que militares venezuelanos invadiram o território nacional para prender garimpeiros brasileiros ilegais que atravessavam a fronteira no entorno do Pico da Neblina, invadindo território venezuelano, dando volta nos postos de fronteiras venezuelanos para não serem presos ou abordados, fato que culminou então em combate de encontro entre uma força brasileira e uma força venezuelana.

Woloszyn, em Inteligência Militar, destaca que (p. 171) um episódio exitoso realizado pela inteligência militar brasileira ocorreu ainda 1993 quando o Comando do Exército foi alertado que o comando Sul dos EUA planejava realizar, sem aviso prévio, manobras militares na Guiana, a 300 km da fronteira com o Brasil, fato que acabou desencadeando a Operação Surumu, o maior exercício de mobilização militar para a defesa da Amazônia, cujo inimigo fictício ocupava “Cratênia”, no norte de Roraima.

Por isso já 1993 [6], a Operação Surumu marcou um momento de afirmação da soberania do Brasil sobre a região amazônica, em resposta a demandas internas e pressões externas para a demarcação das terras indígenas de Raposa Serra do Sol. Para os Estados Unidos, que mantêm uma política ativa na América Latina, a operação foi interpretada como um sinal do comprometimento brasileiro com a defesa de seu território e dos interesses estratégicos na Amazônia. A operação também trouxe à tona as tensões latentes entre desenvolvimento econômico, soberania nacional e preservação ambiental, temas que ainda hoje reverberam nas relações internacionais.

Cabe ainda ressaltar que as Operações Especiais naquelas e em várias operações militares executadas não geram repercussões nem divulgações, exceto quando dão errado, havendo vários soldados, cabos e sargentos que mereceriam honras militares e infelizmente não receberam medalhas, por terem sido submetidos a um alto risco em Operações Especiais, como nos conta o general Ridauto [7] no podcast do Canal Fala Glauber.


FIGURA 7: Reportagem sobre a Operação Surumu (Correio Braziliense, p. 10, Brasília-DF, 10 de outubro de 1993. Foto: Heitor Augusto).

Dito isso, a capacidade dissuasória da Força 3 precede seu brilhante êxito na área de inteligência militar, conforme destaca André Luiz Woloszyn em seu livro Inteligência Militar (2018:56) citando Cepik, explica que: “informações de combate são conceituadas como os dados obtidos em função do contato direto das tropas com o inimigo e são utilizadas imediatamente para alerta operacional, com observação visual junto a população local.

O general Câmara Senna (2020, p. 64 ss.) em seu livro Grandes Desafios, Decisões Difíceis e Riscos, sobre seus 50 anos de serviço no Exército, ressaltou sua participação na criação da Doutrina Delta após participação na Escola de Estado Maior do US Army em Fort Leavenworth. O general registrou ainda que, se por um lado se sentiu constrangido com os armamentos modernos e novos sistemas tecnológicos da OTAN à época, por outro pôde se sentir orgulhoso do Exército Brasileiro quanto à capacidade organizacional de Comando e Controle, superior ao Exército Americano, ao ser inquirido por comandantes americanos sobre o sucesso nas Operações Militares no Rio de Janeiro, comparando com o fracasso do Exército Americano nas operações em Los Angeles, em que não havia um comando militar unificado para coordenação interagências.

Ledson Schwalb, em monografia para a ECEME na conclusão da especialização em ciências militares, intitulada: A 3ª Companhia de Forças Especiais e a necessidade de transformações nas suas estruturas físicas e organizacionais, concluiu a necessidade de reformulação na estrutura organizacional para atender as necessidades operacionais do Comando Militar da Amazônia, de Companhia para Batalhão, alinhado com a Estratégia Nacional de Defesa e Plano de Emprego Estratégico do Exército à época.

O autor assim explica os novos desafios da região:

A previsão de um ambiente operacional amazônico cada vez mais complexo, nos próximos anos, exigirá uma estrutura de Op Esp compatível. As atuais ameaças difusas, transnacionais e irregulares, em constante evolução, certamente necessitarão de maior emprego de forças especiais na Amazônia.

A capacidade de dissuasão, segundo o conceito definido pelo Manual de Campanha, Glossário de Termos e Expressões para uso no Exército (C-20-1) é a “atitude estratégica que, por intermédio de meios de qualquer natureza, inclusive militares, tem por finalidade desaconselhar ou desviar adversários, reais ou potenciais, de possíveis ou presumíveis propósitos bélicos”.

Conforme vimos na história contada pelo general Ridauto sobre as operações Maturacá, Traíra e Surumu, provam que as Forças Armadas possuem um elevado sistema de prontidão e capacidade de pronto emprego de mobilização conjunta para a defesa da Amazônia e também capacidade de emprego de Forças Especiais como elemento dissuasório, haja vista nossa grande capacidade e profissionalismo em treinar, armar e equipar militares altamente treinados para realizar os princípios da Operações Especiais na busca por superioridade relativa, surpresa, simplicidade, propósito e criatividade.


FIGURA 8: Operador Especial nº 1, o coronel Antônio Azevedo Silva (Exército Brasileiro, https://www.eb.mil.br/web/noticias/w/centenario-do-pioneiro-do-curso-de-operacoes-especiais-do-exercito-brasileiro).

Cabe por fim homenagear o Operador Especial nº 1, o coronel Antônio Azevedo Silva, pois este ano de 2025 é o centenário de seu nascimento, e em reconhecimento aos serviços prestados por esse distinto militar, a Portaria nº 766, de 1º de julho de 2015, concedeu ao CIOpEsp a denominação histórica de “Centro de Instrução Coronel Gilberto Antonio Azevedo e Silva”.

Conclusão

Este artigo investigou o papel dissuasório da 3ª Companhia de Operações Especiais do Exército Brasileiro, traçando um paralelo com o emprego histórico de forças especiais no Monte das Tabocas para combater a presença holandesa na Batalha dos Guararapes, onde o próprio nascimento do Exército Brasileiro deu-se por meio de ações de comandos e de forças especiais, ainda que a doutrina fosse inexistente, empregando aquela estratégia, venceu uma potência europeia militarmente superior.

O artigo preencheu uma lacuna na literatura de defesa, que subestima a dissuasão não-convencional. A metodologia empregada foi uma análise histórica comparativa e a avaliação doutrinária para demonstrar como a capacidade de infiltração, ação direta e guerrilha se tornam um meio para dissuadir potências estrangeiras e grupos criminosos na Amazônia. O objetivo foi cumprido ao estabelecer que a mera existência de uma força de elite, com raízes em táticas de resistência, serve como fator de dissuasão estratégica, influenciando o cálculo de riscos de potenciais adversários e que a transformação de um efetivo valor Companhia em valor Batalhão, melhoraria sobremaneira o volume da capacidade dissuasória sem grande impacto orçamentário e de acordo com a Estratégia Nacional de Defesa que prioriza a dissuasão.

Além das tropas tradicionais (Pelotões de Fronteira e Brigadas de Infantaria de Selva) e dos guerreiros de selva formados no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS) a proteção e defesa da região amazônica brasileira conta com militares da Marinha do Brasil e da Força Aérea Brasileira, destacando-se que ainda que o país esteja polarizado entre direita e esquerda políticas, o interesse comum de todos é a defesa contra interferência externa. A demonstração da prontidão operacional e atuação em conjunto e de forma coordenada de nossas Forças Armadas certamente envia um recado a qualquer ameaça à nossa soberania territorial:

Que Venham, Não Passarão! Selva! Comandos, Força, Brasil!


Notas

[1] Arthur de Souza Rangel. Projeto Estratégico KC-390: a necessidade de revisão doutrinária do preparo e emprego da Aviação de Transporte da Força Aérea Brasileira. Monografia CAEPE. 2018. Disponível em: https://repositorio.esg.br/bitstream/123456789/856/1/Arthur%20de%20souza%20rangel%20VC.pdf.

[2] https://www.defesaaereanaval.com.br/data-comemorativa/cerimonia-dos-60-anos-do-esquadrao-gordo-1o-1ogt-foi-realizada-na-base-aerea-do-galeao

[3] https://ebrevistas.eb.mil.br/ADN/article/view/6303/5475.

[4] https://bdex.eb.mil.br/jspui/bitstream/123456789/8723/1/MO%206321%20-%20FREDERICO.pdf.

[5] https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/08/24/para-macron-amazonia-e-bem-comum-e-pede-mobilizacao-de-potencias-contra-desmatamento.ghtml.

[6] https://www.jornalopcao.com.br/colunas-e-blogs/geopolitica-colunas-e-blogs/operacao-surumu-perspectiva-dos-estados-unidos-sobre-a-defesa-da-amazonia-brasileira-659146/.

[7] https://www.youtube.com/watch?v=RIXguBXoY8U.

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1 comentário

  1. Analisando texto que referencia episódio histórico – Guararapes – e o momento tecnológico atual, qual seria a probabilidade de uma força especial, motivada e treinada, sustentar conflito de longa duração sem o suporte de meios logísticos adequados? O consumo de meios – com dificuldades de reposição – não elimina ( ou pelo menos reduz muito) a capacidade de resistência de longo prazo.
    Lembre que o Sudeste Asiático dos anos de 1970 recebia amplo reabastecimento da URSS pelo porto de Haiphong e da larga fronteira chinesa com o Vietnã do Norte e, por extensão, Laos e Camboja.

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