Dois assuntos: 1) atrás de Pokrovsk há apenas terreno aberto e posições dispersas, e a Rússia poderia fazer grandes avanços; e 2) novo site rastreia contribuições para think tanks por governos e por grandes empresas de Defesa.
O avanço russo é gradual, mas constante, especialmente em Donbass. Vários quilômetros quadrados são ocupados todos os dias. A Ucrânia está ficando sem tempo. Dada a ofensiva russa sustentada e a fraqueza das forças ucranianas, se Kiev não conseguir impedir esse desenvolvimento, “o país simplesmente entrará em colapso”, diz o coronel austríaco Markus Reisner.
Quase três anos atrás, Vladimir Putin deu a ordem de ataque. Apesar da resistência, as coisas parecem cada vez mais sombrias para os defensores. A Rússia está especulando sobre o tempo em uma longa guerra de atrito e a Ucrânia está ficando sem tempo. A situação na frente, no nível operacional, é precária. A cidade de Pokrovsk, cerca de 50 quilômetros a noroeste do reduto separatista de Donetsk, está atualmente em perigo de ser cercada pelo Exército russo pelo sul.
Este é um importante centro logístico para os ucranianos, que os russos também querem capturar “o mais intacto possível” e então usar como “trampolim para o Ocidente”, diz o oficial do Exército austríaco.
Ao mesmo tempo, os combatentes do Kremlin já chegaram a poucos quilômetros da fronteira com a província vizinha, Dnipropetrovsk. Conseguir isso seria uma “vitória importante” para a propaganda de guerra do Kremlin, embora a capital provincial, Dnieper, ainda esteja longe de seu alcance.
A barragem vai romper?
O grande medo: se Pokrovsk cair, os russos poderão fazer um grande avanço. A cidade faz parte da terceira linha de defesa construída e preparada com o apoio da OTAN desde 2014, atrás da qual há apenas terreno aberto e uma série de posições dispersas: a Rússia poderia avançar aqui relativamente rápido e pode haver uma espécie de ruptura de barragem aqui. Um colapso da frente poderia fazer com que toda a dinâmica tivesse um impacto negativo na Ucrânia.
O fato de os russos ainda conseguirem lucrar também se deve às enormes perdas que a Ucrânia sofreu e ainda não conseguiu compensar. “As unidades estão ficando menores e muitas vezes têm apenas 40 ou 50 por cento de potência na frente”, diz Reisner.
Também consultamos um dos poucos analistas sérios deste conflito na Argentina, o coronel da reserva Fernando Duran, que nos diz: “Ao contrário de Reisner, acredito que depois de Pokrovsk os russos têm dois modos de ação. O primeiro é atacar Slavyansk-Kramatorsk pelo sul (72 km), que é a parte menos defendida da área mais fortificada da Ucrânia, cumprindo assim a diretriz estratégica de Putin de 24 de fevereiro de 2022 para libertar Donbass e aniquilar as forças ucranianas que estariam cercadas entre Seversky Donetsk-Artemivsk e Toretsk, e não exigiria a redistribuição da logística ou do componente aeroespacial. A segunda, menos provável, é atacar Dnipro ou Zaporizhia (150 km).”
Considerando ambas as opiniões e o possível desenvolvimento futuro das operações, podemos dizer que as forças ucranianas estão em sérios apuros.
Como já dissemos diversas vezes: não levamos em conta a extensão do campo de batalha – a linha de frente é tão ou mais longa que a linha entre Mendoza e a cidade de Buenos Aires. Da perspectiva destas planícies, temos a impressão de que não há nada de novo na frente de guerra na Ucrânia, mas na realidade os combates progridem dia após dia.
Um milhão de mortos e feridos?
Nem em Kiev nem em Moscou é possível obter o número exato de vítimas de ambos os lados. No final do governo Biden, os militares dos EUA estimaram que havia entre 100.000 e 140.000 mortos e cerca de 400.000 feridos somente no Exército russo. Por outro lado, uma investigação realizada pela mídia russa independente apoia essa avaliação. Um total de 88.726 soldados russos são conhecidos pelo nome.
Segundo relatos americanos, as coisas parecem igualmente ruins do lado ucraniano. O Pentágono estima entre 80.000 e 100.000 mortos e cerca de 400.000 feridos. No total, cerca de um milhão de pessoas foram mortas ou feridas nos campos de batalha da Ucrânia, sem incluir dezenas de milhares de vítimas civis.
Apesar do alto número de mortos, a Rússia tem mais poder de permanência devido à sua população significativamente maior. Apesar dos muitos relatos sensacionalistas na mídia ocidental, não há sinais de uma revolução na sociedade russa e ainda há voluntários suficientes se alistando para o serviço militar.
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• Rodolfo Laterza e Ricardo Cabral (Autores)
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A Névoa da Guerra 2.0 continua
Quem está financiando a impressionante fábrica de notícias falsas sobre a guerra europeia?
Como podemos ver, o Quincy Institute for Responsible Statecraft lançou uma nova ferramenta para trazer transparência ao financiamento de think tanks americanos. É chamado de Think Tank Funding Tracker e é o primeiro registro público a analisar as fontes de financiamento dos 50 think tanks mais influentes dos Estados Unidos. O banco de dados, disponível on-line em thinktankfundingtracker.org, rastreia contribuições recebidas nos últimos cinco anos de governos estrangeiros, do governo dos Estados Unidos e de grandes contratantes do Pentágono. Ou seja, o “complexo militar-industrial” (termo popularizado pelo discurso de despedida do presidente dos EUA, Dwight D. Eisenhower, em 1961)
O que são think tanks? São centros de estudos que desempenham um papel fundamental na formação da opinião pública e das políticas dos países ocidentais, neste caso os Estados Unidos da América. Seus especialistas são frequentemente citados na mídia e trabalham nos bastidores do Congresso e do governo, ajudando a redigir leis e aconselhando sobre questões legislativas (mais fantasmas invisíveis…). Assim, vemos, nesta informação pública, que os contratantes de Defesa contribuíram com mais de 34,7 milhões de dólares. Os maiores doadores incluem Northrop Grumman (US$ 5,6 milhões), Lockheed Martin (US$ 2,6 milhões) e Mitsubishi (US$ 2,1 milhões). Os principais beneficiários incluem o Atlantic Council (US$ 10,2 milhões), o Center for a New American Security (US$ 6,6 milhões) e o Center for Strategic and International Studies (US$ 4,1 milhões).
Se a autoridade desses analistas não for acompanhada de uma compreensão clara de suas fontes de financiamento e potenciais conflitos de interesse, surge um problema de confiança. A opinião deles pode ser influenciada por interesses privados ou por aqueles que financiam os centros de estudo para os quais trabalham. Por exemplo, um think tank financiado por governos estrangeiros ou empresas relacionadas à defesa pode promover uma narrativa que atenda aos interesses desses financiadores, em vez de fornecer análises objetivas e independentes.
Na ausência de transparência, existe o risco de que os think tanks se tornem ferramentas de propaganda disfarçados de instituições acadêmicas, com efeitos potencialmente nocivos e distorcendo a realidade.
Este não é o primeiro conflito de grande escala em que as mídias sociais desempenham um papel importante, mas é a primeira guerra em que ambos os lados têm uma presença online tão forte que podemos considerá-los comparáveis. Isso pressupõe que, muito antes de as primeiras tropas russas cruzarem a fronteira, uma batalha suja de informações estava em andamento para contestar, em nível nacional e internacional, a narrativa do que estava acontecendo na Ucrânia e por quê.
Usos da censura
O interessante neste caso e para estas latitudes é saber que informações recebemos. Quem as produz? Com quais interesses? Para onde querem nos guiar? A primeira vítima da guerra é a verdade. Dizemos isso desde o início desta guerra europeia irrestrita.
Usos estratégicos da censura. Em linha com o espírito de volta ao hard power defendido pelo ex-alto representante para Relações Exteriores e Política de Segurança, Josep Borrell, a União Europeia bloqueou os veículos de comunicação de propriedade do governo russo, Sputnik e Russia Today, em vários níveis e plataformas. A Rússia também bloqueou certos meios de comunicação nacionais e estrangeiros, como o Twitter e o Facebook, por meio de uma legislação que pode levar a longas penas de prisão pelo que o governo considera desinformação.
Dadas essas evidências convincentes e importantes, podemos dizer que muitos think tanks são centros de estudo que desempenham um papel fundamental na formação da opinião pública e das políticas dos países ocidentais.
Cada um que tire suas próprias conclusões. Vejo vocês na semana que vem.
Algo mais…
É esse o verdadeiro objetivo desta guerra? “A derrota da Rússia não é algo ruim, então podemos dividi-la em nações menores” (vice-presidente da UE, Kaja Kallas). Sem palavras, eles já nem sequer tentam esconder.
Publicado no La Prensa.