Síria, gás e geopolítica: o gasoduto que poderia remodelar o Oriente Médio

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Imagem gerada por inteligência artificial.

Por Giuseppe Gagliano*

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É sempre pelo dinheiro: o gasoduto sírio é um “sonho” improvável a curto prazo, mas poderia remodelar o equilíbrio energético global.


Entre as muitas razões que levaram Vladimir Putin e o Irã a apoiar o regime de Bashar al-Assad durante a guerra civil síria, uma das menos discutidas, mas mais estrategicamente relevante, é a questão energética. O interesse de Moscou em preservar o poder de Assad não se limitou à tradicional aliança geopolítica com Damasco ou à possibilidade de projetar poder no Mediterrâneo através de bases militares sírias. Uma questão crucial continua a ser a do gás natural e do controle das rotas de fornecimento de energia à Europa.

Um gasoduto que nunca viu a luz do dia

Um dos cenários que aterrorizou o Kremlin, e que desempenhou um papel significativo na guerra civil síria, foi a possibilidade de o gás natural do Catar, ou o petróleo e gás dos Emirados Árabes Unidos e da Arábia Saudita, poderem chegar à Europa através de um gasoduto passando pela Síria. Esta rota não só teria sido economicamente mais vantajosa, como também teria oferecido à Europa uma alternativa concreta à sua dependência do gás russo fornecido pela Gazprom e pelos gasodutos Nord Stream.

Do ponto de vista de Putin, garantir a dependência energética da Europa em relação à Rússia tem sido durante anos um dos principais objetivos da sua política externa. A Síria de Assad, neste contexto, representou uma barreira fundamental contra a construção de tais infraestruturas energéticas. Não é por acaso que em 2009 o regime de Damasco recusou um projeto de gasoduto apoiado pelo Catar que teria atravessado a Síria para se ligar à rede turca e, a partir daí, à Europa. Uma decisão que levou o pequeno mas rico emirado a apoiar as forças rebeldes contra Assad durante a guerra civil.

Um Oriente Médio desestabilizado mas crucial para a energia

Quando a queda do regime de Assad se tornou uma possibilidade cada vez mais real, a questão energética voltou ao centro das atenções. A estabilização da Síria (um objetivo ainda distante) poderia permitir a construção de gasodutos que atravessassem o país e se ligassem à rede turca, garantindo à Europa novas fontes de abastecimento. Uma perspectiva que interessa não só ao Catar, mas também à Arábia Saudita e aos Emirados, ansiosos por diversificar suas exportações de energia e reduzir sua dependência das vulneráveis ​​rotas marítimas do Golfo Pérsico.

Neste contexto, a Turquia desempenha um papel fundamental. Ancara tem um duplo interesse em ver Assad removido: acesso direto aos recursos energéticos do Oriente Médio e cobrança de lucrativos impostos de trânsito provenientes da passagem de gasodutos através do seu território. Este projeto, além de reforçar a posição econômica da Turquia, consolidaria ainda mais seu papel como plataforma energética entre o Oriente Médio, a Europa e a Ásia.

O papel dos Estados Unidos e a alternativa ao GNL

Os Estados Unidos não são um espectador passivo neste jogo. Há muito que Washington promove a exportação do seu gás natural liquefeito (GNL) para a Europa, uma opção que é, no entanto, significativamente mais cara do que a dos gasodutos do Oriente Médio. O controle da Síria e a gestão das rotas energéticas que dele poderão resultar representam, para os Estados Unidos, um duplo desafio: conter a influência russa no setor energético e manter a Europa em uma posição de dependência controlada pelos aliados ocidentais.


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Detalhes técnicos do “sonho do gasoduto” através da Síria

A ideia de um gasoduto através da Síria faz parte de uma complexa rede de projetos e interesses energéticos ligados aos recursos naturais no Oriente Médio.

1. As principais opções de gasodutos

Dois projetos dominaram o debate geopolítico sobre a Síria nos últimos anos:

“Gasoduto Catar-Turquia” (proposto pelo Catar): este projeto visava transportar gás natural do Campo Norte (que o Catar compartilha com o Irã) através da Arábia Saudita, Jordânia, Síria e finalmente Turquia, para chegar à Europa. O gasoduto teria aproximadamente 5.000 km de extensão. Esta rota evitaria os elevados custos do transporte de GNL e as vulnerabilidades do Estreito de Ormuz.

“Gasoduto Irã-Iraque-Síria” (proposto pelo Irã): também chamado de “Gasoduto Islâmico”, teria ligado os campos de gás iranianos de South Pars (também compartilhados com o Catar) através do Iraque e da Síria, terminando em portos sírios no Mediterrâneo. A partir daí, o gás teria sido transportado para a Europa por navio ou através de ligações com a rede turca. Este projeto teria medido aproximadamente 1.500 km.

2. Desafios técnicos

Um gasoduto que atravessa a Síria apresenta vários desafios:

Terreno e clima: a Síria tem uma mistura de terreno montanhoso (especialmente na fronteira turca) e desértico, o que torna a instalação de tubulações complexa. O projeto exigiria tecnologias avançadas para superar esses obstáculos naturais.

Segurança de infraestrutura: após anos de guerra civil, o território sírio está repleto de minas, infraestruturas destruídas e áreas instáveis. Qualquer projeto exigiria investimentos maciços para garantir operações seguras.

Capacidade de transporte: os dois projetos propostos teriam capacidade estimada entre 30 e 40 bilhões de metros cúbicos de gás por ano, parte significativa da necessidade europeia, que rondava os 400 bilhões de metros cúbicos em 2022.

O impacto geopolítico do gasoduto

Um gasoduto através da Síria teria enormes repercussões:

• Reduziria a dependência europeia do gás russo;

• Alimentaria uma competição entre o Catar e o Irã;

• Reforçaria o papel estratégico da Turquia como centro energético;

• Enfrentaria a oposição dos EUA, uma vez que ameaçaria seu domínio sobre as exportações de GNL.

* * *

O gasoduto sírio continua a ser um “sonho” improvável a curto prazo, mas poderá, a médio e longo prazo, remodelar o equilíbrio energético global. No entanto, a Europa deverá se concentrar nas energias renováveis ​​e reduzir sua dependência de fontes instáveis, integrando também soluções nucleares.


Publicado no Le Diplomate.Media.

*Giuseppe Gagliano é presidente do Centro Studi Strategici Carlo de Cristoforis, em Como, Itália. É membro do comitê internacional de assessores científicos do Centre Français de Recherche sur le Renseignement (Cf2R).

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