Estamos assistindo as partes beligerantes desta “guerra mundial por partes” investirem maciçamente em tecnologias não tripuladas; e por aqui, como estamos?
As operações na Ucrânia, Palestina, Síria, etc. nos mostram que a guerra atual não é muito diferente de todas as que a precederam e que certamente se seguirão. O que muda, por estar ligado ao tempo e à época, é a técnica, ou seja, as ferramentas e sistemas utilizados para combatê-la. Dissemos anteriormente que “neste sentido, referir-se à Segunda Guerra Mundial como termo de comparação para um grande conflito regular e simétrico é inevitável, mas enganoso. Na verdade, esse mundo desapareceu em grande parte com Hiroshima e a era da eletrônica e da cibernética contribuiu para enterrá-lo, expandindo o campo de batalha para espaços inimagináveis”.
A guerra atual, “Guerra Irrestrita” é, como mencionado, uma hiperextensão do campo de batalha. Já se foram os tempos de Austerlitz, das Ardenas e até de Stalingrado, onde o barulho dos canhões e a poeira marcavam o local do confronto.
Hoje isto se expandiu, em primeiro lugar, para a dimensão imaterial do ciberespaço que agora envolve todo o planeta e onde flutua todo o Ocidente industrializado e avançado, não sem algum perigo.
O segundo ambiente operacional é o espaço sideral. Acima dos 100 km de altitude, onde não é possível nenhum voo apoiado na aerodinâmica terrestre, abre-se um território completamente novo.
É inegável que, com a chegada da era digital e sua expansão para as redes de dados e a interligação global, o ciberespaço, este domínio imaterial se transformou em um campo de batalha concreto. Na verdade, os danos que uma ação hostil causaria à rede global de dados são absolutamente concretos e nada imateriais.
Na realidade, os mercados financeiros, as redes de energia, o controle do tráfego marítimo e aéreo e os sistemas administrativos de Estados inteiros dependem da capacidade, agora tida como certa, de trocar uma enorme quantidade de dados em um espaço de tempo muito curto. Interromper ou de alguma forma degradar esta capacidade vital é, por si só, um objetivo que vale a pena para qualquer potência em guerra com outra.
Temos observado que se desenvolve uma série de medidas hostis e extremamente prejudiciais que, no entanto, não conduzem a ações cinéticas reais. O novo ambiente operacional, denominado ciberespaço por simplicidade, exige que todos adotem medidas, estabeleçam unidades especializadas e desenvolvam doutrinas de utilização precisa, expressamente dedicada a combater esta ameaça imaterial, mas sempre iminente.
O quinto domínio operacional merece uma discussão separada: o espaço extra-atmosférico. Este é o ambiente dos satélites. Existem de todos os tipos e em quantidades muito grandes: desde satélites meteorológicos até satélites de telecomunicações, de satélites de medição terrestres até, obviamente, satélites militares. Trata-se, em grande parte, de sistemas de vigilância de grandes áreas, dedicados à função de inteligência.
Na prática, o número e a sofisticação destes dispositivos privaram quase completamente qualquer pessoa da capacidade de manter qualquer coisa verdadeiramente secreta. Poderíamos dizer que isto dificulta o princípio da surpresa e, portanto, uma série de possibilidades estão sendo desenvolvidas para cegar a rede de satélites do oponente em benefício da própria.
Sem dúvida que esta continua sendo uma possibilidade nas mãos de algumas potências tecnologicamente muito avançadas, mas nada exclui que no futuro possamos assistir a uma certa “democratização” das armas também neste setor.
Engenhos militares
Dissemos em nosso artigo: Ucrânia, “Engenhosidade militar” e dinheiro, 16 de julho de 2023: “O conflito em desenvolvimento na Ucrânia fornece dados valiosos sobre a eficácia (e eficiência) dos vários sistemas de armas utilizados. Vários ‘dispositivos militares’ de ambos os lados entraram progressivamente no campo de batalha: desde o MLRS (Sistema de lançamento múltiplo de foguetes) M-142 HIMARS até as munições ‘ociosas’ Switchblade, bem como os mísseis de defesa aérea IRIS-T, os obuseiros autopropulsados Pzh-2000 e vários tipos de UAV (veículos aéreos não tripulados) e UCAV (veículos aéreos de combate não tripulados).”
Novas armas também estão sendo testadas pelo lado russo: a estreia do míssil de cruzeiro hipersônico Kh-47M2 Kinzhal, que tem sido usado com vários outros instrumentos de guerra como o Su-57, o Uran-6 UGV (veículo terrestre não tripulado), o UCAV Orion e o veículo de combate blindado e BMPT-72 “Ramka”, também conhecido como “Terminator”.
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Pela primeira vez, as armas da OTAN estão sendo utilizadas em grande escala contra as forças armadas russas, fornecendo a ambos os lados informações valiosas sobre o desempenho do seu equipamento. Atenção, para que se tenha em conta: a ascensão dos drones baratos (para tomar nota para a nossa própria defesa nacional).
Por que isso é importante? Estes “engenhos militares” são desenvolvidos com materiais acessíveis e baratos e, como vemos, estão subvertendo décadas de planejamento, gastos e domínio militar.
“A ameaça é complexa, generalizada e está verdadeiramente transformando a face do campo de batalha”, disse o subsecretário do Exército dos EUA, Gabe Camarillo.
Como exemplos podemos destacar (segundo um artigo publicado no Axios): “Na Ucrânia, os céus estão cheios de sistemas aéreos não tripulados que podem guiar bombardeios ou atuar como bombas. As forças ucranianas supostamente retiraram os tanques M1A1 Abrams fornecidos pelos EUA das linhas de frente devido à ameaça. A série de drones Shahed do Irã esteve no centro do bombardeio contra Israel em abril. Mais de 300 drones e mísseis foram usados no ataque. Drones norte-coreanos cruzaram a fronteira e ameaçaram a capital sul-coreana. Seul comprometeu-se a reforçar as contramedidas e estabeleceu um comando centralizado de drones. Os rebeldes Houthi estão lançando drones carregados de explosivos para expandir seu alcance às águas ao largo do Iêmen, onde os Estados Unidos e seus aliados estão respondendo com munições muito mais caras. Drones fornecidos pelo exterior, incluindo o Mohajer, estão alimentando a sangrenta guerra civil do Sudão.”
Nos últimos dois anos, houve um rápido desenvolvimento na área de drones voadores. Mas devemos também perguntar: qual é o desenvolvimento dos veículos terrestres não tripulados? E se drones terrestres desempenharem um papel na guerra na Ucrânia? Podemos ver que seu papel está aumentando constantemente. São especialmente adequados como elemento de apoio à exploração e reconhecimento. Se uma área for identificada como pouco defendida ou menos fortificada, mediante o uso de um robô terrestre não tripulado, é possível adicionar sistemas tripulados. Se houver uma reação defensiva maciça, apenas o robô será perdido, mas não os soldados.
Uma conclusão
Os sistemas não tripulados podem variar desde aqueles semelhantes a brinquedos e produzidos em massa até os que são caros e de alta tecnologia. Eles podem ser usados para monitorar, transmitir informações, enganar e atacar, ao mesmo tempo em que mantêm seu usuário fora de perigo.
Os drones com visão em primeira pessoa (FPV), populares na Europa Oriental, podem custar apenas US$ 500. Eles são equipados com componentes baratos e podem destruir alvos muito maiores, como tanques.
O Irã está armando grupos próximos e combatentes russos distantes com drones, que um especialista comparou a um “míssil de cruzeiro de pobre”. O bombardeio constante paralisa a movimentação terrestre e esgota as defesas aéreas.
O uso comercial de drones “amadureceu” na Guerra Civil Síria, disse Samuel Bendett, analista do Centro para uma Nova Segurança Americana e do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. Sua aplicabilidade foi ainda sublinhada pelos combates em Nagorno-Karabakh (dissemos isso no La Prensa).
Competição entre grandes
“Os militares dos EUA têm uma vantagem tecnológica sem precedentes. Mas outros países estão avançando muito rapidamente em termos de adoção de capacidades táticas, e estão agora muito à frente de qualquer coisa que a OTAN ou mesmo os Estados Unidos tenham”, disse Bendett, acrescentando: “Os russos afirmam oficialmente que eles e os ucranianos estão à frente do mundo inteiro no que diz respeito ao uso de drones táticos, FPV e quadricópteros.”
O que estamos assistindo: as partes beligerantes desta guerra mundial por partes estão investindo dinheiro em tecnologias não tripuladas. E em casa, como estamos?
De 2020 até agora, e durante os próximos 20 anos, avançaremos em direção a um mundo de drones inteligentes e acessíveis. Se acordar a tempo, a Argentina (nota da tradução: podemos incluir o Brasil nesta observação) conseguirá fazer jus a isso, temos a inteligência e a capacidade. Teremos vontade de fazê-lo?
Publicado no La Prensa.