Crise em Gaza: uma história complicada (Parte 1)

Compartilhe:
O campo Tamar atende 70% das necessidades de Israel na geração de energia (Marc Israel Sellem/AP/CNN).

O campo Tamar atende 70% das necessidades de geração de energia de Israel (Marc Israel Sellem/AP/CNN).

Para além dos problemas políticos e religiosos que tradicionalmente afetam a questão palestino-israelense, algumas análises indicam que talvez haja mais uma razão para o atual conflito na região.


Com exceção do Irã, há muito conhecido como apoiador do eixo de resistência na região, desta vez a Rússia e o Qatar também foram mencionados por dar apoio ao Hamas. Qual é o denominador comum entre estes países, ou seja, Rússia, Qatar e Irã? Gás! Além deles, um quarto surgiu na questão do apoio ao Hamas: a Turquia. A Turquia, que também é exportadora de gás, vende agora para quatro países da região. Este fator teria desempenhado algum papel no ataque do Hamas a Israel?

A Rússia, o Irã e o Qatar são, respectivamente, os maiores detentores de reservas de gás natural no mundo. Alguns analistas acreditam que o Irã alcançou o primeiro lugar nas reservas de gás do planeta, levando em conta as enormes reservas encontradas recentemente às margens do Mar Cáspio. Diz-se que a Rússia discordou da extração de gás ali, apesar de estarem em solo e águas territoriais do Irã. Isso causou silêncio na mídia iraniana sobre essa valiosa descoberta. De qualquer forma, estes três países são os maiores detentores de reservas de gás natural, enquanto o Qatar é o primeiro exportador mundial de gás.

Será possível que a questão do gás tenha desempenhado um papel na recente crise em Gaza?

Gás em Gaza

A mídia mundial havia anunciado a descoberta de enormes reservas de gás na costa da Faixa de Gaza há meses atrás, uma informação importante que não recebeu atenção em meio ao ruído das notícias mundiais. Isto apesar do fato de a questão principal ter sido abordada há anos e de os meios de comunicação não terem dado a devida atenção a ela. Na verdade, a British Gas e seus parceiros descobriram um campo de gás 36 km a oeste da Cidade de Gaza nos últimos anos da década de 1990. Mais tarde, a empresa perfurou dois poços lá, Gaza Marine 1 e Gaza Marine 2, e estimou as reservas potenciais em cerca de 1,4 trilhão de pés cúbicos.

As autoridades palestinas afirmaram naquele momento que essa quantidade de gás forneceria energia suficiente para a Faixa de Gaza e a Cisjordânia durante 15 anos, mesmo que parte dela fosse exportada.

Embora o Egito e Israel produzam gás no Mediterrâneo oriental há anos e Israel exporte gás para a Jordânia e o Egito, o campo offshore de Gaza permaneceu subdesenvolvido devido a diferenças políticas e conflitos com Israel, bem como a fatores econômicos. Eventualmente, negociações sobre a questão entre o Egito, a Autoridade Palestina (AP) e Israel foram realizadas sob supervisão dos Estados Unidos.

De acordo com o direito internacional e uma série de acordos entre Israel e os palestinos em 1999, o campo pertence à AP, mas não pode ser desenvolvido sem aprovação israelense. Este campo de gás não foi desenvolvido por mais de 20 anos, talvez porque não era tão grande para que os maiores países quisessem investir nele, nem era suficientemente seguro para que as empresas ousassem entrar nele. Desde 2007, quando o Hamas assumiu o controle de Gaza, Israel também não queria que as receitas provenientes desse campo fossem para o Hamas, impedindo assim um maior desenvolvimento da questão.

Mas novas negociações foram iniciadas há mais de um ano através do Egito, e finalmente alguns progressos foram alcançados.

Embora o controle da Faixa de Gaza estivesse nas mãos do Hamas e o governo da AP governasse apenas a Cisjordânia, o Hamas não foi convidado oficialmente para as reuniões. A razão pela qual a AP esteve presente nestas negociações foi por ser a única entidade palestina reconhecida internacionalmente e assim poderia as receber receitas do gás offshore de Gaza. É por isso que Israel também decidiu permitir o desenvolvimento da AP no mar em favor do desenvolvimento da situação em Gaza.

Entretanto, o Hamas tinha uma opinião diferente. Como disse Ismail Rizwan, funcionário do Hamas baseado em Gaza autorizado a falar com a mídia: “O gás de Gaza pertence a todos os palestinos em Gaza e só eles têm o direito de investir nele. A ocupação israelense não pode impor limites às nossas capacidades e recursos naturais”.


LIVRO RECOMENDADO:

Uma história concisa do Oriente Médio

• Arthur Goldschmidt Jr. e Ibrahim Al-Marashi (Autores)
• Em português
• Kindle ou Capa comum


A mídia israelense disse que a nova decisão israelense foi tomada após intensas e complexas negociações entre Israel, o Egito e a Autoridade Palestina. Alegou-se que Israel tinha recebido garantias de que o Hamas não utilizaria sua parte das receitas do gás para desenvolver armas. Uma fonte próxima ao Hamas disse: “Israel anunciou sua decisão quando recebeu garantias reais do Egito de que o Hamas está pronto para assinar um cessar-fogo de longo prazo com Israel.”

O Canal 13 de Israel informou que esta aprovação era preliminar e que a implementação do projeto exigia “coordenação entre agências de segurança e diálogo direto com o Egito em coordenação com a Autoridade Palestina, a fim de desenvolver a economia palestina e manter a estabilidade e segurança na região”.

Segundo este canal israelense, o Hamas não poderia se beneficiar de vantagens econômicas até à resolução da questão dos quatro prisioneiros israelenses em Gaza desde 2014.

Uma conclusão aparentemente correta!

Até aqui encaramos dois fatos:

  • Primeiro, todos os principais apoiadores do Hamas têm um fator comum: o gás;
  • Em segundo lugar, Israel é exportador de gás e as exportações israelenses afetam o mercado de gás na região. Este efeito é muito evidente nas receitas russas, das quais a Rússia precisa na guerra de atrito com a Ucrânia.

Alguns analistas, referindo-se a estes dois fatos, alegam que os apoiadores do Hamas organizaram este cenário para impedir a exportação de gás por Israel e, como resultado, manter sua maior participação no mercado.

Esses analistas dizem que esta deveria ser considerada a guerra dos Titãs do Gás. A descoberta de grandes campos de gás, Katlan, Tamar e Leviathan em Israel, e a provável intenção dos israelenses no negócio de vender gás à Europa durante o período do conflito europeu com a Rússia, pode ter custado caro aos governantes israelenses.

Esta análise considera que os russos sabem que a presença de um vendedor situado na orla da costa do Mediterrâneo poderia reduzir os negócios de Putin e mudar a maré da guerra na Ucrânia. É por isso que a Rússia teria arregaçado as mangas, dando luz verde ao Hamas e fornecendo-lhe dados para o ataque.

Além disso, o Qatar, como patrocinador especializado de grupos proxy na região, está insatisfeito por ter encontrado um rival na questão do gás e não deixou que faltasse logística ao Hamas.

Na segunda e última parte deste artigo, eu gostaria de acrescentar mais um fato: que, a partir do terceiro dia do ataque do Hamas a Israel, a produção de gás dos campos israelenses também foi afetada. Portanto, uma evidência que está de acordo com esta avaliação. Mas até que ponto você acha que esta análise se baseia na realidade?

Compartilhe:

Facebook
Twitter
Pinterest
LinkedIn

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

____________________________________________________________________________________________________________
____________________________________
________________________________________________________________________

Veja também