Os planos chineses para os próximos cinco anos

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Xi Jinping, Li Keqiang, Li Zhanshu, Wang Yang, Wang Huning, Zhao Leji e Han Zheng participaram da quinta sessão plenária do 19º Comitê Central do PCC em Pequim, China (Foto: Xinhua via CGTN).

Na revisão de seu Plano Quinquenal, a China reforça a liderança de Xi Jinping, mostra que o Partido Comunista Chinês continua forte e mais uma vez demonstra que o país possui planos para executar suas estratégias. A dúvida que resta é se os seus adversários também têm planos para competir à altura.


O Partido Comunista Chinês acaba de reunir seu Comitê Central em sessão plenária. Os principais objetivos foram avaliar os resultados alcançados ao término do período abrangido pelo 13º Plano Quinquenal (2016-2020) e discutir as propostas que constarão do 14º plano, para o período de 2021 a 2025, além de metas para um prazo mais longo, até 2035.

A análise do que foi divulgado até aqui (comunicado oficial) oferece uma boa pista de como os dirigentes do país asiático planejam suas ações para os próximos anos, além de indicar quais são suas expectativas em relação ao contexto internacional no qual a China estará inserida. Mais do que isso, a leitura atenta das entrelinhas do plano permite uma compreensão ainda melhor acerca do atual momento do regime comunista chinês.

A reunião mais uma vez ratificou o controle total que o presidente Xi Jinping exerce sobre o partido e, consequentemente, sobre todo o governo chinês, sem qualquer margem para dissenso. Referências às suas estratégias, liderança, doutrina e política estão espalhadas por todo o documento, extravasando sua onipresença na vida política chinesa. Assim, parece que seu caminho para um terceiro mandato a partir de 2022 está praticamente assegurado.

Como era de se esperar, o comitê reconhece os avanços que ocorreram durante a vigência do 13º Plano. O país teria atingido o objetivo para 2020 de tornar-se “uma sociedade moderadamente próspera”. Espera-se que o país atinja, ao final deste ano, um PIB de 100 trilhões de yuans, o equivalente a 14,3 trilhões de dólares, um valor consideravelmente acima do previsto inicialmente. De acordo com os dados oficiais do país, 55,75 milhões de pessoas teriam sido retiradas da pobreza, e 60 milhões de empregos urbanos teriam sido criados.

Mas o país – como todo o mundo – vive um momento desafiador. Em 2020, a economia chinesa deverá crescer por volta de 2%. Apesar de estar no azul, diferentemente da grande maioria dos países no ano da pandemia, é um crescimento bem menor do que o previsto, que estava na casa dos 6%.

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E essa situação é reconhecida no documento, que atribui ao momento atual “profundas e complexas mudanças […] em um ambiente internacional complexo, onde a instabilidade e a incerteza aumentaram significativamente”.

Para fazer face a essa conjuntura, o plano sugere algumas medidas que protejam o país de instabilidades externas, tais como o fortalecimento do mercado interno, ancorado pela previsão do aumento da classe média de 400 milhões de pessoas para cerca de 700 milhões em 2025. Ao mesmo tempo, enfatiza a necessidade de que o desenvolvimento do país se dê com base na inovação tecnológica autóctone, garantindo-se que o país seja autossuficiente em tecnologias-chave, como nas áreas de inteligência artificial, informação quântica, circuitos integrados e semicondutores, por exemplo, onde o gap tecnológico em relação aos EUA ainda não foi superado.

Mas o documento não indica que a China se voltará para si mesma. Pelo contrário, insiste na ideia de uma ampla abertura para o mundo exterior, com um modelo de cooperação em que todos os parceiros saiam ganhando, com ênfase na iniciativa One Belt, One Road.

No campo militar, o documento é incisivo na decisão de se acelerar o desenvolvimento de sistemas e materiais de emprego militar modernos e de tecnologia avançada. Prevê, para os próximos cinco anos, o início da operação do primeiro bombardeiro estratégico de longo alcance com tecnologia furtiva (stealth), que o torna invisíveis aos radares, e do terceiro porta-aviões de fabricação própria, o primeiro com o moderno sistema de catapultas eletromagnéticas. A mecanização e modernização do exército é outro ponto destacado no plano, que lembra que em 2027 o Exército de Libertação Popular completará 100 anos, data que deverá ser comemorada com o atingimento dos objetivos traçados para o centenário, quais sejam, os de ter a capacidade de defender a soberania chinesa no próprio território e no Pacífico ocidental, bem como defender os interesses crescentes do país no exterior. A reunificação total do território chinês e a estabilidade de Macau e Hong Kong, aspectos bastante sensíveis, também são objetivos a serem perseguidos no futuro demarcado pelo plano quinquenal.

É evidente que este tipo de documento deve ser lido com todas as cautelas, se o objetivo é uma análise isenta. Mas não há dúvidas de que ele delineia, tanto pelo que está escrito, quanto por suas omissões, a mensagem que o Comitê Central do PCC deseja passar para o público interno do país e para os observadores externos. E a mensagem é a de uma liderança centralizada e unificada no Comitê Central, tendo Xi Jinping como figura central, firmemente decidida a implementar suas políticas e perseguir seus objetivos. É possível que, em um futuro não muito distante, os objetivos chineses colidam de maneira irreconciliável com os de vizinhos ou de outras potências. Isso se dará em espaços geográficos claramente definidos, como o Mar do Sul da China, Hong Kong ou Taiwan, ou em disputas comerciais e tecnológicas, como é o caso que envolve a tecnologia de internet 5G. O lado chinês da disputa, como se vê, já tem uma estratégia claramente definida para enfrentar o futuro que o aguarda. Resta saber se os possíveis adversários ou concorrentes já traçaram as suas.


*Paulo Roberto da Silva Gomes Filho é Coronel de Cavalaria do Exército Brasileiro. Foi declarado aspirante a oficial pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) em 1990. É especialista em Direito Internacional dos Conflitos Armados pela Escola Superior de Guerra (ESG) e em História Militar pela Universidade do Sul de Santa Catarina; possui mestrados em Ciências Militares pela Escola de Comando e Estado Maior do Exército (ECEME) e em Defesa e Estratégia pela Universidade Nacional de Defesa, em Pequim, China. Foi instrutor da AMAN, da EsAO e da ECEME. Comandou o 11º RC Mec sediado em Ponta Porã/MS. É autor de diversos artigos sobre defesa e geopolítica e atualmente exerce a função de assistente do Comandante de Operações Terrestres, além de ser o gerente do Projeto Combatente Brasileiro (COBRA). E-mail: paulofilho.gomes@eb.mil.br.

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6 comentários

  1. Análise equilibrada do panorama político e econômico chinês, sem fazer torcida ou simpatia! Destaque para os pontos de fortalecimento da classe média (que é de fato quem consome e move a economia), tecnologia autóctone (ou seja, criada e desenvolvida no próprio país) e reunificação total de seu território (leia-se Formosa e antigas possessões europeias). Forte abraço!

  2. Temos que ter muitas ressalvas mesmo. O setor imobiliário chines está próximo de uma crise. Ja foram encontrados ouro falso em reservas bancárias da china. Muitos países podem boicotar a china devido as suas políticas externas. Como diz a expressão chinesa, o tigre era de papel.

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