O general mais perigoso de Hitler

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fa Por Robinson Farinazzo*

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Erich von Manstein com Hitler, 1942. Manstein foi um dos poucos oficiais que ousavam falar com o Führer.

“Desequilibrar uma batalha já dada como perdida, revertendo o resultado à seu favor, é um tipo esplêndido de perícia que extrapola a competência comum e adentra o terreno da genialidade”

(Robinson Farinazzo)


O texto que Vocês irão ler a seguir não visa enaltecer os feitos militares da Alemanha na Segunda Guerra Mundial nem tampouco justificar alguns fatos que se revelaram reprováveis da conduta do marechal Erich von Manstein. O objetivo do artigo é mostrar as lições táticas que este inegavelmente brilhante militar deixou para a História, expondo em paralelo suas tragédias pessoais e sua responsabilidade por ação ou omissão em crimes de guerra que, em certo sentido, se mesclam às desventuras de todas as pessoas que se submeteram á sedução do Nacional Socialismo.

Se na primavera de 1943 fosse perguntado a qualquer oficial do Alto Comando da União Soviética qual era o militar alemão que eles mais temiam, a resposta oficial seria: NENHUM – mas isto seria uma deslavada mentira. Pois estava bem nítido na cabeça (e nos pesadelos) dos generais e marechais de Stalin que Erich Von Manstein era o mais ágil, competente e ameaçador comandante militar que os alemães possuíam, por várias razões:

  • Tático excepcional, naquele mesmo ano, apenas alguns dias depois do desastre alemão em Stalingrado, ele recuperou Kharkov das mãos dos russos num ataque brilhante, onde destruiu três exércitos vermelhos e fez outros três baterem em retirada;
  • No ano anterior, ele havia capturado o importante porto de Sebastopol, na Criméia (talvez o sucesso mais estratégico dos alemães em toda a Campanha da Rússia) e
  • Como se não fosse o bastante, ainda estava fresco na memória de todos a maestria com que o cérebro militar de Manstein arquitetara o decisivo plano que levara à queda da França em 1940.
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Capa da Revista Time, 1944

Analisando sua história em flashback, constatamos que Manstein, cujo nome de batismo era Fritz Erich Georg Eduard von Lewinski, nascera em 1887. Adotado por um tio, o general Georg von Manstein, o jovem Erich usaria o sobrenome de seu segundo pai por toda a vida. Lutou na Primeira Guerra Mundial (1914-18) como capitão, e muito provavelmente boa parte de sua competência militar se forjou nas experiências de combate que adquiriu tanto na Frente Ocidental quanto na Oriental (onde foi ferido).

Acabada a guerra (1919), ele estava entre os escassos 4.000 oficiais que a Alemanha fora permitida a manter pelo Tratado de Versalhes. Limitado em suas possibilidades de carreira, não é difícil supor que ele não tenha ficado triste com a ascensão de Hitler ao poder em 1933, dado o fato que este último rearmou o país e expandiu o Exército, descortinando novas oportunidades aos militares alemães.

LIVRO RECOMENDADO:

Lost Victories: The War Memoirs of Hitler’s Most Brilliant General

  • Erich Von Manstein (Autor)
  • Em inglês
  • Versões em Capa Comum e Capa Dura

Manstein logo foi promovido a general, e o gênio saiu da garrafa. Hitler precisava de bons planos militares, de armas capazes de materializá-los e de homens qualificados para implantá-los, e Manstein encarnava todos os três requisitos simultaneamente:

Ele desenhou as operações militares que levariam à derrota da França: conhecido popularmente como “Plano Manstein”, sua concepção previa um “golpe de foice” alemão através da floresta das Ardenas, envolvendo os fracos efetivos franceses que a defendiam. Graças à isto, os alemães conseguiram fazer em poucas semanas todo o trabalho que seus pais não conseguiram realizar em quatro anos durante a Primeira Guerra no sentido de derrotar franceses e britânicos;

Ele ajudou a conceber uma dos melhores canhões de assalto que os alemães construíram em toda a Segunda Guerra, o StuG (Sturmgeschütz III). Desenhado para apoio a infantaria, este veículo possuía baixa silhueta (o que o tornava um alvo difícil de ser atingido), era muito manobrável (por ser tracionado por esteiras) e possuía uma das melhores relações custo/benefício da guerra, combinando preço relativamente barato com grande eficácia em batalha.


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StuG – Sturmgeschütz III, Museu Militar de Belgrado (Foto: Slaven Radovic)

Como comandante operacional, Manstein tinha uma rara habilidade em ler o campo de batalha, encontrar brechas decisivas no dispositivo inimigo e tirar o melhor que suas tropas poderiam dar, tudo simultaneamente. É muito difícil obter oficiais que reúnam todas estas características, mas elas não foram suficientes para evitar sua demissão por Hitler em 1944. Discordando das decisões do Führer, Manstein foi exonerado do comando de tropas em março daquele ano. Ele nunca mais comandaria um exército pelo resto de sua vida.

Poucos meses depois de seu afastamento, os soviéticos lançaram uma vitoriosa série de operações que acabariam por levá-los até as portas de Berlim e á ocupação da Alemanha. Temendo cair em mãos dos russos (que certamente teriam muito o que conversar com ele), acabou preso pelos britânicos em agosto de 1945. A pressão do governo soviético no sentido dos britânicos extraditarem Manstein para que ele fosse julgado por crimes de guerra acabou vingando – parcialmente – em 1949, quando se decidiu processa-lo na Alemanha.

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Havia muitas razões que explicavam estes últimos fatos: Manstein sabia o tempo todo durante a guerra que atrocidades estavam sendo cometidas dentro da área de sua responsabilidade militar na Frente Oriental e nada fez para impedir, e não é de se duvidar que seu 11º Exército tenha fornecido meios logísticos para as unidades da SS perpetrarem massacres. Assim, ele foi acusado de dezessete crimes e considerado culpado em nove, os quais lhe renderam condenação a dezoito anos de prisão.

Mas as injunções políticas de seus defensores acabariam por prevalecer e ele foi libertado em 1953. Dois anos depois, seria chamado como consultor para ajudar a montar o renascente exército da Alemanha Ocidental. Mestre da batalha, ele conseguiu dar a volta por cima no outono da vida.

Manstein faleceu na Bavária em 9 de junho de 1973.

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Os Generais de Hitler

  • Corelli Barnett (Autor)
  • Em português
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Conclusões

A história e a vida de Manstein são de uma diametral controvérsia. Se por um lado ele foi um dos mais capazes generais alemães no quesito “virar o jogo”, foi igualmente um dos mais negligentes no aspecto de coibir abusos contra civis (em especial, judeus russos) nas áreas de atuação das unidades militares que comandou.

Sua absolvição e posterior regeneração não podem de maneira alguma ser consideradas como abono a sua inocência, mas sim frutos da conjunção de dois fatores:

  1. Eram os anos da Guerra Fria, e havia um enorme temor de uma invasão soviética à Europa Ocidental, razão pela qual ficou estabelecido que a melhor política seria uma oportuna reconciliação com a Alemanha – e Manstein entrou no pacote, em virtude de ter se tornado um ícone para os alemães e serem muito apreciadas naquele momento as suas conhecidas habilidades de organizador militar e
  2. As vítimas de sua negligência eram em sua maioria cidadãos pobres da Rússia, Ucrânia e Polônia, países que agora eram o inimigo. Foi um raciocínio perverso do Ocidente, onde cinicamente não se levou em conta que, comunistas ou não, aquelas pessoas poderiam estar vivas se o poderoso marechal alemão não tivesse sido conivente com a política de extermínio de Hitler. Tivessem estas vítimas a nacionalidade britânica ou norte-americana, Manstein provavelmente teria acabado na forca.

Essa foi a trajetória de Erich von Manstein, soldado cujo próprio brilhantismo o cegou para a fogueira da guerra que destruiu a Alemanha, levando no processo a vida do seu filho genro, morto aos 20 anos de idade na Frente Russa em 1942.

Fogueira que ele mesmo ajudou a acender.


*Robinson Farinazzo é Capitão de Fragata (FN) RM1, expert em tecnologia aeronáutica e articulista de Defesa. Com mais de trinta anos de carreira militar, extensa experiência de campo e formação superior em Administração de Empresas, é Editor do Canal Arte da Guerra. E-mail: robinsonfarinazzo@gmail.com


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9 comentários

  1. “Fogueira que ele mesmo ajudou a acender”. E ponha fogo nisso!

    Perfeita a colocação do Comandante: “O objetivo do artigo é mostrar as lições táticas que este inegavelmente brilhante militar deixou para a História”. Objetivo alcançado, como não poderia deixar de ser.

    Forte abraço!

  2. Parabéns pela excelente matéria.

    Gostaria de sugerir uma matéria, o que teria acontecido se o projeto da V 2 tivesse sido orientado para uma arma de defesa ao invés de uma de ataque, tipo um SA 2 por exemplo, se os alemães tivessem feito um esforço para a criação de uma defesa antiaérea ao invés de um míssil balístico.

    E se isso seria possível naquela época?

  3. Brilhante general, porém omisso e consequentemente culpado. E como se não bastasse a conveniência “política” fazendo reinar a impunidade.

  4. Brilhante general!
    Porém omisso e consequentemente culpado.
    E como se não bastasse a conveniência “política” fazendo reinar a impunidade.

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