Legitimidade, Estabilidade e Legalidade, nessa ordem

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Gen-Rocha-Paiva.png Por Luiz Eduardo Rocha Paiva*

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Enfrentar o atraso e os antivalores requer sabedoria, visão estratégica, equilíbrio e inteligência emocional, bem como dar exemplos de temperança e cidadania. Na crise atual, desprezar a manobra indireta e bater de frente contra adversários poderosos é dar munição para as lideranças carcomidas da velha política e seus aliados, expondo a autoridade do cargo a contestações e colocando em risco a unidade política e a paz social.


Legitimidade, Estabilidade e Legalidade. Esses três conceitos foram repetidos, como um mantra, pelo General Villas Bôas quando comandou o Exército Brasileiro (2015-2018) e exerceu uma liderança positiva e de alto nível na política nacional.

Eram anos de muita tensão e pressões vindas de várias origens, umas instando pela intervenção militar e outras por temerem, tanto essa possibilidade, quanto uma escalada da crise política por iniciativa da esquerda radical, então encastelada em altos escalões do governo.

À primeira vista, o mantra parecia ter como destinatários os intervencionistas. Ledo engano, pois ele também se destinava a tranquilizar a imensa maioria de brasileiros genuinamente democratas e a alertar à esquerda radical de que não seria admitida qualquer iniciativa contra as três cláusulas pétreas com que o Exército garantiria, de fato e de forma sutil, que o processo político em desenvolvimento transcorresse de forma pacífica e ordeira.

Hoje, o Brasil vive um novo embate político, mesclado com a crise sanitária provocada pela pandemia do COVID-19. Nele, é visível a manipulação da lei em prol de interesses políticos, deslegitimando a legalidade e escalando as crises política e sanitária para um conflito entre os Poderes da União. Esse quadro compromete o equilíbrio e a harmonia dos três pilares do regime republicano democrático.

Assim, o país está caminhando para a instabilidade político-social, com risco de ruptura institucional e convulsão social, ou para a submissão a uma espécie de ditadura da toga. Essa iminente possibilidade é comentada e deplorada por autoridades, inclusive do meio jurídico. Ora, membros da Alta Corte não são eleitos pelo povo para legislar e governar – essas não são suas atribuições. Além disso, os atuais ministros não contam com a confiança da nação, haja vista seguidas e questionáveis atitudes e decisões por vários deles cometidas ou tomadas.

Interpretar e usar a lei com propósitos políticos para desestabilizar e, eventualmente, alijar do poder o atual governo, aliando-se a interesses inconfessáveis da liderança patrimonialista fisiológica, é tornar ilegítimo o instrumento legal, ou seja, deslegitimar a lei e ameaçar a estabilidade.

Para enfrentar essa aliança do atraso e dos antivalores é preciso agir com sabedoria, ouvir assessores não radicais, com visão estratégica, equilíbrio e inteligência emocional, bem como dar exemplos de temperança e cidadania. Nas crises atuais, desprezar a manobra indireta e bater de frente contra adversários poderosos é dar munição para as lideranças carcomidas da velha política e seus aliados, expondo a autoridade do cargo a contestações e colocando em risco a unidade política e a paz social.

O Brasil vive um momento de risco para a legalidade, a legitimidade e a estabilidade.

O agravamento dessa complexa e grave situação imporá decisões patrióticas de caráter moral, passíveis de questionamentos quanto à legalidade, mas imprescindíveis para neutralizar a cleptocracia instalada nos altos escalões do poder. São decisões imperiosas para evitar um mal maior, se a omissão e a covardia moral resultarem em danos inaceitáveis ao cidadão e à nação. O Brasil não pode continuar refém dessa gente!

Diante de uma eventual escalada do conflito entre os Poderes da União, que possa levar o país à anomia, à ruptura institucional e a uma grave convulsão social, só as FA têm poder de fato, mas não legal (não há lei que as autorize a tomar a iniciativa), para impor uma solução legítima que preserve a lei e a ordem, em consequência, a estabilidade. Um conflito dessa natureza ameaça a unidade política e a segurança nacional, portanto diz respeito à Defesa da Pátria, missão que as FA cumprirão, igualmente, contra ameaças internas. E não seria para implantar um novo regime militar, mas sim para restaurar os Poderes Constitucionais, vitimados pela evidente falência de sua autoridade, resultante de um conflito de tamanha magnitude. Daí a ordem de valor legitimidade, estabilidade e legalidade.

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Quando a lei positiva é usada para respaldar desígnios ilegítimos, cai por terra a justiça, esta sim cláusula pétrea. Se as leis também o fossem, o Brasil ainda seria colônia, não seria república e Jango, Brizola e o Partido Comunista Brasileiro teriam implantado uma República Comuno-Sindicalista no Brasil em 1964.

Quando os interesses vitais da nação estão e jogo, como disse e diria de novo Camões: “Cesse tudo o que a musa antiga canta, que outro valor mais alto se alevanta!” (Os Lusíadas).


*Luiz Eduardo Rocha Paiva, general-de-brigada reformado, é Diretor de Geopolítica e Conflitos do Instituto Sagres. Foi aspirante a oficial pela AMAN em 1973 e promovido a general-de-brigada 2003. Entre seus muitos altos estudos, possui doutorado, mestrado e pós-graduação pela ECEME, ESAO e FGV. Estagiou na 101ª Air Assault Division, do Exército dos EUA, foi Observador Militar da ONU em El Salvador e fez o Curso de Estado-Maior na Escola Superior de Guerra do Exército Argentino. Comandou o 5º Batalhão de Infantaria Leve (Regimento Itororó), em Lorena/SP, quando cumpriu missão de pacificação em conflito entre o MST e fazendeiros no sul do Pará, em 1998. Foi Chefe da Assessoria Especial do Gabinete do Comandante do Exército, comandou a ECEME e foi Secretário-Geral do Exército. É Professor Emérito da ECEME, membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil e colaborador do Centro de Estudos Estratégicos do Exército. Recebeu diversas condecorações e medalhas nacionais e estrangeiras e publica artigos sobre temas políticos e estratégicos em jornais e revistas nacionais e estrangeiras.


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4 comentários

  1. Precisa dizer da relevância do tema no atual contexto da vida política nacional? Com um excelente artigo, como o presente, que acabo de ler (e compartilhar com todos os meus contatos do whatsapp) não é necessário mais nada. De uma clareza de mil sois, de uma redação impecável somente resta agradecer pelo artigo. Parabéns.

  2. Não podemos ficar tranquilos e nem calados quando vemos juízes de um Tribunal Superior mandar soltar bandidos e corruptos já julgados e presos e, ao mesmo tempo, ficarem “mudos” e “inertes” com a prisão de cidadãos honestos e indefesos sentados em praça pública, nadando no mar ou simplesmente querendo trabalhar. Logo em seguida usam as “autoridades” de suas “togas pretas” para prender e calar pessoas que simplesmente criticam suas atitudes amorais e julgamentos suspeitos: prenderam até comediantes! Não lembro do Jô Soares, do Chico Anísio, do Ronald Golias ou da Derci Gonçalves serem “calados”, muito menos presos, por fazerem piadas com os “generais”, ministros de estado e até dos presidentes da república durante os governos militares!

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