O Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército

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Por Reis Friede*

Na segunda metade da década de 1980, durante o processo de reestruturação da carreira dos militares do Exército Brasileiro (EB), verificou-se a existência de um hiato na evolução da excelência do aprendizado do oficialato do EB, decorrente de largo período transcorrido entre a conclusão dos Cursos de Altos Estudos Militares (CAEM) e a assunção dos cargos nos altos escalões da Força Terrestre. A formulação de políticas e o planejamento estratégico exigiam maiores conhecimentos da realidade econômica, política, social, tecnológica e militar, ao mesmo tempo em que demandavam o domínio de técnicas e habilidades para visualizar cenários onde as estratégias seriam implementadas.

Nesse contexto, o Alto Comando do Exército (ACE) decidiu dividir os cursos da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) – Escola Marechal Castello Branco em dois patamares: um direcionado para as atividades de Comando e Estado-Maior, o CAEM; e outro, de graduação mais elevada, o Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército (CPEAEx).

Destacadas fontes de inspiração foram, dentre outras: o Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), ministrado na Escola Superior de Guerra (ESG); o Curso de Política e Estratégia Marítimas (CPEM), ministrado na Escola de Guerra Naval (EGN); o Curso de Política e Estratégia Aeroespaciais (CPEA), ministrado na Escola de Comando e Estado-Maior da Aeronáutica (ECEMAR); e cursos congêneres de outros países.

À guisa de registro histórico, é válido ser mencionado o Curso de Alto Comando (CAC). Este programa, criado em 28 de abril de 1939, funcionou na ECEME, que, à época, ocupava o aquartelamento do atual 1º Batalhão de Polícia do Exército e era comandada pelo General Milton de Freitas Almeida. O curso teve uma única turma, diplomada em 23 de dezembro de 1939. Os seus estudos centravam-se no papel e na atuação do chefe militar e em sua capacitação para a tomada de decisões. Com a eclosão da 2ª Guerra Mundial, o CAC, entretanto, foi extinto, deixando de ser ministrado nos anos posteriores. Numa justa referência, a associação recreativa que hoje congrega os alunos do CPEAEx chama-se “Grêmio General Milton de Freitas Almeida”.

Em dezembro de 1986, o Presidente José Sarney, atendendo a proposta do Ministro do Exército, General de Exército Leônidas Pires Gonçalves, sancionou a legislação que estabeleceu o CPEAEx. Conforme previsto no dispositivo legal, o novo curso seria destinado à atualização e ampliação de conhecimentos sobre Política, Estratégia e Alta Administração para oficiais já possuidores de CAEM; e habilitação para o exercício dos cargos e funções previstos para Generais de Brigada não possuidores de CAEM.

O curso duraria um ano, funcionaria a partir de 1988 (mais precisamente no dia 29 de fevereiro, data da matrícula da primeira turma), teria um processo de seleção rigoroso, em que seriam considerados o interesse do EB e o perfil e o currículo dos candidatos, e se equipararia aos cursos da ESG e das escolas congêneres das demais Forças Singulares.

Como registro histórico, valorosos oficiais e professores civis se dedicaram com entusiasmo à missão de implantar o CPEAEx. Os militares do CPEAEx eram, à época, os Coronéis Conforto, Synésio, Imbuzeiro, Souza, Câmara Senna, Schmidt e Algayer, os quais, num justo reconhecimento pelos seus esforços, foram agraciados em 1997 com a diplomação honorária e autorizados a ostentar em seus uniformes o distintivo do curso (que conserva traços da insígnia do CAC de 1939). Dentre os civis, destacam-se os professores Diogo de Figueiredo, Terezinha de Castro, Nely Alleoti Maia, Hélio Jaguaribe, Ney Prado, Ives Gandra e Arnaldo Niskier.

Em 1992, o EB passou a disponibilizar vagas anuais para a Marinha do Brasil e para a Aeronáutica. Em contrapartida, oficiais do EB passaram a ser matriculados – anualmente – nos cursos de política e estratégia congêneres na EGN e na ECEMAR.

Um notável salto de qualidade foi a introdução, em 1999, no contexto da disciplina Administração, de um curso de “Master in Business Administration” (MBA), aplicado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Trata-se de “um curso dentro do curso”, ministrado por profissionais da mais elevada qualificação e extremamente atualizado no tocante aos temas abordados. É concedido aos concluintes um diploma de pós-graduação lato sensu em Administração, habilitando-os como executivos “seniores” do Exército Brasileiro. A presente turma do CPEAEx (de 2019) é a 20ª que o frequenta, e os resultados têm sido excelentes. Os conhecimentos auferidos são utilizados seja no primeiro horizonte como assessor, seja, mais adiante, como chefe militar de alto escalão.

A relevância do MBA no CPEAEx é caracterizada pelo seguinte objetivo específico: capacitar os Coronéis ao exercício da gestão de sistemas sofisticados e de projetos, negociação, política e estratégia e planejamento estratégico em contextos organizacionais complexos, sujeitos a processos de mudanças contínuas, tudo isso aplicado à problemática da Defesa Nacional.

Nos anos de 2010 e 2011, o CPEAEx alcançou o Comando da Força, pois, naqueles dois anos o Comandante do EB, General de Exército Enzo Martins Peri, foi à ECEME, para assistir à apresentação do Projeto Interdisciplinar (PI) do CPEAEx.

Coerente com o constante aprimoramento do processo ensino-aprendizagem, o Estado-Maior do Exército (EME), a partir de 2013, passou a conduzir o PI do CPEAEx. Desde então, anualmente e no mês de outubro, a turma do CPEAEx passou a apresentar, ao ACE, suas conclusões sobre um tema apresentado pelo Estado-Maior do Exército (EME).

A partir de 2013, o CPEAEx passou a frequentar o Curso Superior de Defesa (CSD) da Escola Superior de Guerra (ESG), que foi criado para preparar civis e militares para o exercício de funções de alto nível que envolvam assuntos de defesa, promovendo a interação entre os integrantes dos Cursos de Altos Estudos (CAEPE, CPEM e CPEAEx), na discussão de assuntos comuns, inseridos nas áreas do conhecimento de Política, Defesa, Estratégia e Relações Internacionais, conforme o preconizado na Estratégia Nacional de Defesa e na Política de Ensino de Defesa.

Em 2017, por ocasião das atividades comemorativas ao 30º aniversário do CPEAEx, o prédio que o abriga recebeu a denominação de “Edifício General Leônidas”, uma justa homenagem ao Chefe Militar responsável pela criação do Curso.

Em consequência de sua evolução constante e ininterrupta, na atualidade, o CPEAEx tem por objetivos:

  • atualizar e ampliar os conhecimentos sobre política, estratégia e alta administração, para militares e civis designados a realizar o curso;
  • habilitar militares para ocupação de cargos e desempenho de funções de assessor da alta administração do Exército e habilitar à promoção a oficial-general até o posto de general de divisão, para os cargos onde não é exigida a qualificação do Quadro de Estado-Maior da Ativa (QEMA), conforme dispuser a legislação específica; e
  • preparar oficiais para assessoramento de alto nível aos altos escalões do Exército, Ministério da Defesa e Poder Executivo.

O leque de assuntos ministrados abrange amplo espectro de temas, todos centrados na preparação de assessores e de chefes para os altos escalões. Listam-se as atuais disciplinas Política, Estratégia, Planejamento Estratégico, Relações Internacionais e Defesa. Dentre as atividades de complementação do ensino, o CPEAEx realiza quatro Viagens de Estudos Estratégicos (VEE), uma das quais para o exterior.

O processo ensino-aprendizagem do CPEAEx utiliza vários métodos, sendo o principal o do trabalho em grupo. As técnicas empregadas são palestras, painéis, simpósios e seminários. Visitas a diversas instituições completam o quadro. Muito debate de elevadíssimo nível e um turbilhão de ideias se adicionam como ferramentas fundamentais para o exercício do cérebro. Redação de textos e uso de instrumentos de informática são imprescindíveis, bem como a leitura de uma variada quantidade de livros sugeridos e do estímulo constante à prática da expressão oral.

Para se ter ideia da dimensão do número de concluintes do CPEAEx, a ECEME, diplomou até o presente ano, 1.108 militares e um civil, conforme quadro a seguir:


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*Na 17ª Turma (em 2004), foi matriculado um diplomata do Ministério das Relações Exteriores

A rápida evolução da tecnologia e das ciências militares tem exigido cada vez mais capacitação dos oficiais, principalmente nos mais elevados escalões.

Igualmente, as transformações políticas, econômicas e sociais verificadas no Brasil têm acarretado permanente atenção e a consequente correção nos rumos seguidos pelo EB.

Políticas, estratégias, diretrizes e planos carecem de constantes atualizações, por vezes até com vultosas modificações.

Os recursos financeiros disponíveis, – sempre aquém das necessidades – , ditam minuciosos estudos e muita cautela para a sua judiciosa aplicação, objetivando sempre a otimização no seu emprego.

O processo decisório é cada vez mais dinâmico, rápido e efetivo.

Exatamente por esta razão, a necessidade de assessores e chefes com o mais alto padrão de preparo intelectual; ou seja, profissionais dotados de conhecimentos amplos e atualizados, possuidores de experiência acumulada, e tendo suas mentes permanentemente sintonizadas com as conjunturas nacional e internacional.

Para tanto, o EB conta com oficiais habilitados e qualificados pelo CPEAEx, os quais – em um futuro não muito distante – conduzirão os destinos do EB e do Brasil, razão primaz da reconhecida importância do mencionado programa de excelência conduzido pela ECEME.


*Reis Friede é Desembargador Federal; Presidente do TRF-2; Professor Emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) e Professor Honoris Causa da Escola de Comando e Estado-Maior da Aeronáutica (ECEMAR). E-mail: reisfriede@hotmail.com Site: https://reisfriede.wordpress.com/


*Imagem de capa: A ECEME – Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, na Urca, Rio de Janeiro, RJ, Brasil (Foto: Wikimedia Commons/Carlos Luis M. C. da Cruz)


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